segunda-feira, 4 de abril de 2022

Crítica: Mar de Dentro

M A R   DE   D E N T R O

por Joba Tridente 

Na vida até o cinema é cíclico. Tanto que, de tempos em tempos um assunto em comum, “coincidentemente”, toma vulto em várias partes do mundo cinematográfico..., como se todos os realizadores quisessem se provar capazes de (também) realizar algo relacionado ao tema da moda. Basta a indústria do entretenimento “especular” um foco (principalmente em resposta a algum protesto étnico, social, de gênero) ou um filme com temática simples (envolvendo família nas mais diversas situações e/ou discussões), independente, fora da cartilha, fazer sucesso para despertar interesses de meio mundo. Claro que existe coincidências e “coincidências” e que a qualidade da trama (em comum: família) varia e muito dependendo dos envolvidos. 

No momento (?), o que tem chamado a atenção é a quantidade de filmes e séries se (re)desdobrando sobre os percalços e/ou dissabores da maternidade e o rescaldo da paternidade no processo de criação dos filhos (sobretudo) na ausência (ou falta) da mãe. Recentemente destacaram-se nos cinemas e streaming: Mães Paralelas (2021) (Almodóvar), Mães de Verdade (2020), de Naomi Kawase, Proibido Nascer no Paraíso (2020), de Joana Nin; Ma'Ohi Nui (2018), de Annick Ghijzelings, Tully (2018), de Jason Reitman, A Filha Perdida (2021), de Maggie Gyllenhaal, Willow (2019), de Milcho Manchevski..., entre outros de excelente conteúdo. 

A grande maioria das obras que abordam a questão da maternidade, sob o ponto de vista das mulheres (personagens, roteiristas, diretoras) e com “palpite” dos homens..., personagens sempre na coadjuvação do querer ou não o filho esperado pela mulher que não tem certeza se quer ou não o filho a certa altura da vida e/ou da carreira..., dizem bem mais às mulheres que aos homens. Porque não é (?) de fácil compreensão masculina a aflição feminina da descoberta da gravidez ao pós-parto e do apego e/ou o desapego de uma mãe ao filho que, para muitas, é um estorvo. Por mais que se desenhe. E tem nada a ver com empatia. 


A propósito do assunto, está chegando aos cinemas o filme brasileiro Mar de Dentro (2020), dirigido por Dainara Toffoli, que desenvolveu o roteiro sobre maternidade (fora de hora) em parceria com Elaine Teixeira. A narrativa acompanha a mudança na rotina e no humor de Manuela (Monica Iozzi), uma mulher na faixa dos 30 anos, ao constatar que está grávida. O estresse nem é tanto pelo pai do bebê, o namorado Beto (Rafael Losso), um colega de trabalho, mas pela provável interrupção na carreira profissional de sucesso na agência publicitária. Assim, no contorno do empoderamento feminino, a gravidez inesperada, a insegurança maternal e uma fatalidade, acaba fazendo Manu perder o chão e questionar o seu futuro como mãe e profissional. Será que uma mulher viciada em trabalho será capaz de abrir mão da carreira e se dedicar totalmente ao filho..., ao menos nos primeiros meses? 

Mar de Dentro tem bom ritmo e vai direto ao assunto para falar de mãe de primeira viagem, trauma pós-parto, dupla jornada, babás-mães. O porém é que o discurso soa vago, sem novidades e ou sem sequer polemizar tais questões, que parecem estar na trama só para constar. Nem sempre um breve diálogo ou cena é o suficiente para esclarecer e/ou criticar certas situações impostas (sistematicamente) às mulheres. Da descoberta da gravidez (e as dúvidas de levá-la adiante ou não) aos cuidados com o bebê, todos os problemas de Manu acabam sendo solucionados facilmente, quase que num piscar de olhos e sem muito drama, tipo tempestade em copo d’água. Me parece que na vida real (que não imita a arte) as aflições maternais são bem mais complexas (com as mães padecendo ou não no paraíso)..., principalmente para aquelas que estão bem abaixo da classe média e têm tanta jornada que até pararam de contar. 


Enfim, possivelmente por já ter assistido a tanta variação de enredo (adoção, barriga de aluguel, troca de bebê, sequestro de bebê, bebê autista, natimorto) em dramas intensos e até perturbadores, a trama sem novos atrativos e/ou novas abordagens de Mar de Dentro não me arrebatou e/ou me fez demonstrar algum interesse pelo destino dos personagens um tanto quanto insossos. O que não quer dizer que a narrativa linear e sem embaraços, num clima de especial televisivo, não vá encontrar eco no publico (preferencialmente) feminino.

Trailer: Aqui

 

NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha. 

Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


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