domingo, 30 de julho de 2017

Crítica: De Canção em Canção


De Canção em Canção
por Joba Tridente

Tem filme novo de Terrence Malick nos cinemas: De Canção em Canção (Song to Song, 2017). Mas será realmente um filme novo?

Exibindo como pano de fundo um festival de música em Austin, no Texas, De Canção em Canção apresenta uma variação da mesma penitência religiosa proposta (qual uma oração-reflexo) em Amor Pleno (2013) e Cavaleiro de Copas (2015): homens monossilábicos (caricatura masculina!), sem saber (ou ter) o quê dizer sobre a vida e o amor para suas companheiras, namoradas, amantes..., e mulheres psicóticas, desequilibradas, bipolares, amando e odiando (em pensamento) seus companheiros, namorados, amantes. Ambos incapazes (?) de se manifestarem verbalmente. Enquanto homens andam a esmo e casais se olham (desejosos ou não), se relam, se roçam, insinuam sexo e mulheres possam nuas e ou seminuas, os/as protagonistas pensam (em off) o quê gostariam de falar (mas não dizem!) sobre o amor, o ódio, a vida, a dor, a religião e deus (não necessariamente nessa ordem cristã), uns aos outros, não tivessem tão ensimesmados lambendo as próprias feridas, como se as maiores do mundo.


Através de cortes (com a introdução de belas imagens), recortes (com a introdução de belas imagens) e picotes (com a introdução de belas imagens) no dia a dia de trabalho ou de badalação de cada personagem, a narrativa tenta dar prumo (ou sentido!) às relações ambíguas entre os artistas da área musical Faye (Rooney Mara), BV (Ryan Gosling), Cook (Michael Fassbender), Rhonda (Natalie Portman)..., que vão se enredando profissional, social e afetivamente tal qual numa balada romântica e caótica de amor e dor (“Te amo! Você é o amor da minha vida! Te amarei para sempre! Te amei!”). Não faltam angústia, melancolia, vazio existencial, a busca por deus, triângulos amorosos e angustiosos, imagens imersivas e contemplativas (sempre em movimento: haja travelling!): paisagens bucólicas com mato, grama, capim, árvore, folhas, pássaros, montanhas, rios, mares, praias, piscina, nascer e por de sol, estradas, viadutos, pontes, carros, aviões..., e o que mais se desejar e imaginar do fascinante arquivo de imagens (salvatela de computador) das quatro estações de Emmanuel Lubezki. A cor do figurino também varia conforme o humor dos personagens. O elo está no conjunto ou num mero detalhe!


Se você não assistiu aos reflexivos Amor Pleno/To the Wonder (2013) e Cavaleiro de Copas/Knight of Cups (2015), este drama light and heavy pode até lhe parecer original e tocante. Porém, pelas vias abstratas (ou seria herméticas?) do mestre tão off das badalações quanto as narrativas em off dos seus últimos trabalhos cinematográficos, praticamente sem diálogos (o que deve gerar uma boa economia em som direto), De Canção em Canção, que deixa muito espectador atônito (!), está mais para um “adendo” a tangenciar sistematicamente os dois filmes anteriores.

Quem não assistiu ao seu belíssimo e inquietante A Árvore da Vida (2011), também pode demorar um pouco para amarrar as pontas do script metafísico. Já o cinéfilo que tem acompanhado os recentes devaneios do messiânico roteirista e diretor, onde seus personagens estão sempre à deriva (revirando os olhos), em busca de um deus cristão que lhes dê respostas e algum significado para suas vidas vazias e ou praticando atos de solidariedade em hospitais e periferias, vai sentir que De Canção em Canção é um dos galhos frágeis e com frutos muito menos suculentos da árvore citada. O argumento de que a salvação do homem se dará através da prática sincera do amor humano é nobre, mas o roteiro para a redenção é pobre.


Decifrar a trama do emblemático De Canção em Canção não é um exercício fácil para o espectador de primeiro Malick, pois depende da intimidade com os seus filmes recentes, bem como da aceitação da sua linguagem (filosófica cristã) cada vez mais redundante, para mensurar o vazio existencial de seus personagens e as particularidades da “mensagem” ou “moral” religiosa nas entrelinhas do drama. Assim, é bem possível que (neste imbróglio transcendental) alguém se perca no labirinto das lamentações, cego pelos flashes de tantas lamúrias pessoais e totalmente alheio aos anseios de quem quer que seja.

A mim..., que após a sessão ainda não tinha opinião formada e chegando em casa assisti ao Cavaleiro de Copas, seguido de Amor Pleno..., confesso que a sensação é mais de frustração, por esta melancólica canção de Malick não ter me convencido totalmente, do que de decepção pela sua idiossincrasia visual. O vazio que me ficou é bem maior que o vazio de seus personagens no show business da vida. Um vazio que não consegui preencher nem com as belas imagens rurais e urbanas que pululam aleatoriamente na telona...


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários, em VHS, fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Crítica: Em Ritmo de Fuga

Em Ritmo de Fuga
por Joba Tridente*

A ideia para o filme de ação Em Ritmo de Fuga, a mais nova audácia cinematográfica do diretor e roteirista inglês Edgar Wright, teria entrado em ebulição lá nos idos de 1994 e testada, por ele mesmo, no interessante videoclipe Blue Song, da Mint Royale, em 2003. Deu tão certo que a sequência de abertura do filme, praticamente, reproduz os primeiros minutos do vídeo musical.

Na verdade, Em Ritmo de Fuga (Baby Driver, EUA, 2017), de Edgar Wright, pode ser visto como um longo videoclipe híbrido e ou um musical híbrido, já que toda a narrativa (incluindo diálogos) segue o compasso de alguma música (em medley pop, rock, funk, soul, blue) que está sendo ouvida (e raramente comentada ou compartilhada) por Baby (Ansel Elgort), o jovem motorista do CEO do Crime, Doc (Kevin Spacey). Embora pareça não fazer parte da Ordem Criminosa, o monossilábico Baby tem motivos para estar o tempo todo com fones de ouvidos e a serviço de Doc..., que o tem como um talismã da sorte, já que é um motorista excepcional.


O que não quer dizer que, com sua cara de bebê, o rapaz seja unanimidade entre os assaltantes profissionais..., por razões que você vai descobrir quando der de cara com os psicopatas homicidas Griff (Jon Bernthal), Bats (Jamie Foxx) e Buddy (Jon Hamm)..., contratados por Doc, conforme a especialidade do assalto. Baby sabe que, quando se estaciona na garagem do crime, tem que estar preparado para todo tipo de avaria (material, física, moral) no “veículo” próprio e ou alheio. No entanto, toda via de fuga congestionada, enquanto não consegue se desviar desta rotina marginal, ele cuida do velho pai adotivo Joseph (CJ Jones) e busca se envolver com a graciosa garçonete Debora (Lily James), que se lamenta de ter tão poucas músicas com o seu nome e sonha sair estrada afora sem destino e sem olhar para trás...

Com seus curiosos cortes elípticos e sequências dignas (ou típicas) de musicais, enquadramento inusitado e perseguição automobilística bem coreografada, Em Ritmo de Fuga, que deve cair nas graças principalmente do público adolescente, poderia até ser considerado um drama romântico leve, não fosse o crescendo (estilizado e ou explícito) da violência que explode incômoda no ato final. Embora o humor (nonsense) negro busque lapidar a ação pesada (inda que o roteiro insinue novas rotas e os personagens em trânsito tenham um quê caricatural dos personagens da Gang do Motor, que animavam os reclames do Lubrificantes Bardhal, nos anos 1960), a violência pode soar repetitivamente clichê (que faz parte do gênero policial) e até cansativa.


A história do bom sujeito que comete erros na juventude e busca a redenção não é novidade no cinema..., o que lhe dá “originalidade” e valoriza a argumentação é a linguagem narrativa. E o provocador Wright, que surpreendeu os cinéfilos com Todo mundo Quase morto/Shaun of the Dead (2004), Chumbo Grosso/Hot Fuzz (2007), Scott Pilgrim Contra o Mundo/Scott Pilgrim vs. the World (2010), O Fim do mundo/The World's End (2013) sabe muito bem como customizar uma velha história para que ela pareça novinha na tela. Tanto, que tem feito um bocado de críticos especular se há (ou não!) referências ao menos a dois ótimos filmes: Drive (2011), de Nicolas Winding Refn, e The Driver (1978), de Walter Hill, cujos scripts guardam alguma semelhança. Tem sobrado até para o recente musical La La Land: Cantando Estações (2016)..., provavelmente por conta do toque de fantasia que enreda o jovem casal sonhador em meio aos rá-tá-tá-tás das metralhadoras...

A trilha sonora que embala, do prólogo ao epílogo, Em Ritmo de Fuga (embora não tenha a grande maioria das letras traduzidas, como é comum no Brasil) é coprotagonista na trama. Ela é a sombra sonora compilada, a consciência sincopada que dá ao protagonista Baby o senso de direção no alucinado ballet automobilístico pelas avenidas de Atlanta, ou numa caminhada dançante pelas calçadas do bairro, ou num rodopio na companhia do velho pai e na troca de confidências com a garconete (de contos de fadas) Debora. Aliás, como disse lá em cima, tudo soa musica neste louco thriller melódico: tiroteio, corrida, batidas, copos de café, diálogos, mesas etc...


Enfim..., considerando que os diálogos são bem econômicos (inclusive no conteúdo: Nos conhecemos antes, certo? Eu não sei. Você ainda está vivo, certo? Sim. Então acho que nunca nos encontramos.); que o elenco é excelente e as performances (cartunescas) divertidas; que a fotografia (!) a edição (!) e a trilha (!) estão em perfeita e invejável sincronia; que o roteirista e diretor britânico Edgar Wright continua realizando entretenimento de qualidade e (ainda) nem aí pra “filme cabeça”; que o enredo é enxuto (os percalços de um jovem motorista a serviço de uma gangue de assaltantes) e que, violência à parte, tem um charme (e ingenuidade romântica) dos filmes policiais dos anos 1950..., quando sai da sessão especial tinha achado Em Ritmo de Fuga apenas bacaninha, mas quando comecei a me lembrar de detalhes, para escrever a crítica, me dei conta de que o filme de ação musicalizada é muito bom! Um filmaço!

*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Crítica: Homem-Aranha: De Volta ao Lar


Homem-Aranha: De Volta ao Lar
por Joba Tridente*

Esta mais recente versão cinematográfica do Spider-Man poderia, tranquilamente, ser chamada de Spider-Teen, pois traz o personagem (amigo da vizinhança) mais adolescente que nunca, aos 15 anos, querendo se firmar como herói (para qualquer serviço), depois do brevíssimo “estágio” com os Vingadores em Capitão América: Guerra Civil (2015). Mas Peter Parker (Tom Holland) sabe que não é tão fácil quando parece, já que está naquela complicada fase juvenil: nem criança e nem adulto..., cheio de “boas” intenções quem nem sempre combinam com imaturidade, timidez, paixão amorosa, deslumbramento, ambição. E como se não bastasse, seus atos de bravura e heroísmo estão sendo monitorados pelo chefão Tony Stark (Robert Downey Jr.), para saber se ele pode ou não integrar o grupo de super-heróis.


Homem-Aranha: De Volta ao Lar (Spider-Man: Homecoming, 2017), dirigido por Jon Watts, cujo título pode ser “referir” tanto à HQ de 1984, quanto à Marvel e ou ao lar da Tia May (Marisa Tomei), no Queens, em Nova York, após a impagável participação do aracnídeo em Guerra-Civil, é um filme em que os fãs adolescentes vão se reconhecer na jovialidade (e insegurança) do amado personagem.

Escrito por um sexteto (Jonathan Goldstein, John Francis Daley, Jon Watts, Christopher Ford, Chris McKenna, Erik Sommers), o roteiro passa ao largo do surgimento do Homem-Aranha, da morte do Tio Ben e da “tumultuada” retomada da série em O Espetacular Homem Aranha (2012) e O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro (2014), de Marc Webb. Tudo por um (novo) recomeço mais adaptável à grade de eventos na expansão do universo marvelianos, onde o aracnídeo será um dos atrativos com seu bom-mocismo e humor involuntário.


Por enquanto, no compasso de espera para integrar a trupe dos Vingadores, o adolescente Peter Parker, segue com os estudos na multiétnica Midtown School of Science and Technology, onde é admirado pelo nerd Ned Leeds (Jacob Batalon), seu melhor amigo, por Liz Allan (Laura Harrier), seu interesse amoroso, pela ativista Michelle (Zendaya), e rechaçado pelo invejoso Flash Thompson (Toni Revolori).

Já o garoto Homem-Aranha, aprendendo a dominar um uniforme de última geração (fabricado pela TS), além de socorrer a vizinhança (deixando uma boa bagunça no caminho, com seus voos desastrados), tenta burlar a vigilância de Happy Hogan (Jon Favreau), motorista/guarda-costas de Tony Stark (Robert Downey Jr.), para investigar e coibir as estranhas atividades do comerciante de armas Adrian Toomes (Michael Keaton). Mas, o quê pode fazer o pequeno grande Homem-Aranha quando nem mesmo o Homem de Ferro (Downey Jr.) acredita no surgimento do ameaçador Abutre (Keaton)..., um vilão vingativo que (pode se dizer) é “cria” do ambicioso megaempresário armamentista Toni Stark? Ir à luta com as suas teias e coragem.


O roteiro de Homem-Aranha: De Volta ao Lar é simples (mas não simplório!) ao explorar a vida dupla de Parker num período complexo de formação da identidade, época em que o adolescente está buscando conciliar a rotina de estudante (enfrentando o bullying colegial) com o deslumbramento do chamado à responsabilidade, com os poderes recém-adquiridos e não totalmente domados. Além de um bocado de gags e piadas visuais (nem todas funcionam), em tempos de conturbação mundial, a história traz também, em seu subtexto, questionamentos interessantes (em diálogos ferinos!) e pertinentes sobre vilania e monopólio de armas. Indagações (subliminares) com a “leveza” de uma tonelada no dedão do pé e que, fora deste “contexto brincalhão” de aventura juvenil, realmente dá o que pensar...


Considerando a excelente atuação de Tom Holland (que não fica devendo nada ao Tobey Maguire) e a boa performance do elenco; levando em conta que artistas e ou espectadores não vão ter do que reclamar da cota de etnias na telona; vendo que a violência, comparada aos filmes do gênero, é moderadíssima em destruição; lembrando que há sequências divinas, envolvendo Peter e Tia May (a última é desbocadamente antológica), e de ação (como as do barco e do avião) muito bem resolvidas; reconhecendo que as breves participações do Capitão América (Chris Evans) são muito mais divertidas do que as do Homem de Ferro; salientando que o Abutre (de Keaton, ótimo) é um interessante vilão (com causa própria) e que Jon Watts tem poucos vacilos na direção; admitindo que os efeitos especiais são bem bacanas..., a começar pela abertura especial (em IMAX) ao som do clássico Spider-Man Television Theme; sentindo que o clima crush entre Peter e Liz não passa de paixonite estudantil; concordando que o filme prioriza as novas gerações (adolescentes), mas sem esquecer os velhos fãs, e pensando que a mistura de ação e aventura com comédia adolescente (a la John Hughes) funciona..., Homem-Aranha: De Volta ao Lar realmente me surpreendeu positivamente. Pode ter lá uma ou outra referência (à saga), mas ganha, e muito, em originalidade! Pelo menos até aqui, é um bom recomeço!


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

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