segunda-feira, 25 de março de 2019

Crítica: Duas Rainhas


Duas Rainhas
por Joba Tridente

Inglaterra, Grã-Bretanha e Reino (des)Unido..., terra(s) de muitas histórias e cenário ideal para as tragédias e comédias shakespearianas. Um palco onde não falta (?) espaço para embates psicológicos, patológicos, físicos e variações de blefes sentimentais. Tampouco bastidores ardentes com fofocas sobre as maquiavelices de favoritas e favoritos enquanto prestadores de serviços (também sexuais) a seus (suas) monarcas. Pelo menos é o que nos faz crer as especulativas obras dos mais recentes contadores de histórias de cinema, com suas tramas libertinas mais inspiradas que baseadas em fatos (confiáveis).


A mais nova adaptação cinematográfica, envolvendo a monarquia europeia, que chega com atraso ao Brasil, é o drama, com boas doses de luxúria, Duas Rainhas (Mary Queen of Scots, 2018), com roteiro de Beau Willimon e direção de Josie Rourke. Baseado no livro Queen of Scots: The True Life of Mary Stuart, do historiador e biógrafo John Guy, a trama que, em tempos modernos de cotas raciais, compõe a corte inglesa do século XVI com negros e asiáticos, busca foco na intrincada disputa político-religiosa pelo trono inglês, entre as “primas-irmãs” Elizabeth I (Margot Robbie), a rainha protestante da Inglaterra, e Mary (Saoirse Ronan), a rainha católica da Escócia..., com uma delas literalmente perdendo a cabeça, já que “uma rainha não tem irmãs, mas um país”. Quanto a perda de cabeça de uma delas, não é spoiler é prólogo! Ou melhor, é fato consumado!


O curioso nesse imbróglio histórico, onde as religiões (temerosas da perda de poder e do alto “dízimo”) mostram seus tentáculos venenosos, é o modus operandi do mercado de fidalgos (ainda que as aparências enganam) para rainhas carentes que, dependendo da “compra” do nobre ideal, pode mover o fiel da balança, digo, da coroa. Diante da relevante aposta casada “poder + sexo + poder”, em meio a guerra de egos soberanos, é impossível ao espectador ficar indiferente à habilidade de persuadir e à versatilidade sexual dos nobres cortesãos em Duas Rainhas e em A Favorita. Não (?) que seja o assunto central do enredo, mas, nas preliminares, digo, “paralelas”, o homossexualismo é o que chama a atenção, já que tais relacionamentos teriam desencadeado grandes tormentas na vida das carentes e obcecadas rainhas..., segundo as versões cinematográficas.


Não creio ser preciso conhecer a conturbada e sanguinária história inglesa (satirizada na série britânica Deu a Louca na História) para apreciar (ou não!) ao Duas Rainhas, que traz excelentes intepretações de Margot Robbie e Saoirse Ronan. Embora menos exuberante e irônico que A Favorita, conta com excelente produção, bela fotografia e boa direção. O seu roteiro, que despertou a ira de estudiosos, pode ser discutível (por causa das liberdades poéticas), mas funciona como bom entretenimento cinematográfico, com seus punhados de drama, de tragédia, de sexo, de romance e algum respingo de sangue. É um filme meio raso, sem nenhum toque de humor e até um pouco confuso, é verdade..., mas quem tiver interesse em se aprofundar na história alheia, corre atrás da veracidade (se disponível). Afinal em cinema, assim como alguns personagens, nem tudo é o que parece ser..., nem mesmo em documentário.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


quinta-feira, 14 de março de 2019

Crítica: O Parque dos Sonhos


O Parque dos Sonhos
por Joba Tridente

Dar asas à imaginação..., para que ela voe livre e encontre espaços vagos na memória, onde possa criar mundos infinitos ou diversões únicas! Será que nos dias de hoje, com o advento da internet e do celular, até mesmo quem é filho do interior se dá ao luxo de inventar e reinventar e reciclar brinquedos e ou material descartado sonhando mundos outros? Ou, massificado, fica mesmo com o que está pronto e quando este quebrar joga no lixo? Questiono porque sei, por experiência própria, que não é fácil trabalhar atividades lúdicas com crianças viciadas em jogos eletrônicos (games).


O parágrafo acima pode ser um razoável argumento para a ótima animação O Parque dos Sonhos, cuja trama acompanha as aventuras da criativa jovem June, de 12 anos, pelo mundo da imaginação. Desde a tenra infância June leva uma vida feliz na companhia dos participativos pais, dividindo momentos encantadores, especialmente com a mãe, na construção de um impressionante parque de diversões em miniatura que é cuidado por um chimpanzé (Peanut), uma javali (Greta), dois castores (Gus e Cooper), um porco espinho (Steve) e um urso (Boomer). Porém, quando sua mãe precisa se ausentar para um longo tratamento de saúde, a garota, em fase de crescimento, vai perdendo o ânimo em continuar sozinha com a inventiva brincadeira..., sem saber que a sua decisão pode causar a maior confusão num Parque dos Sonhos (semelhante ao seu) que existe em algum lugar paralelo da sua imaginação...


Embora traga algum resquício da melancolia e do caos presentes em Divertida Mente (2015) e História Sem Fim (1984), já que também trata da insegurança de uma criança que, diante de fatos que não compreende (como a doença da mãe) e temendo pelo pior, não consegue reagir à tristeza e à raiva, para continuar sozinha um jogo tão divertido (a dois)..., a animação O Parque dos Sonhos (Wonder Park, 2019), dirigida por David Feiss e roteirizada por Josh Appelbaum e André Nemec, tem história e dinâmica próprias. A começar pela bela cenografia que, com excelente 3D de profundidade, convida o espectador a mergulhar num universo maravilhoso e acompanhar (em linguagem acessível a qualquer público) os percalços de June para botar ordem nos seus dois mundos, o físico e o da imaginação, e ainda resolver a carência do afeto materno.


O que mais chama a atenção em O Parque dos Sonhos é que não há uma só criança do bairro de June conectada, feito um zumbi, a um computador e ou a um celular. A garotada é esperta, ativa e cria suas brincadeiras malucas (que deixam os pais de cabelo em pé!) como a maioria das crianças de antigamente criava, usando o que encontrasse jogado fora pelo caminho ou na vizinhança. Uma delícia! Espero que sirva de estímulo para a criançada do mundo real! Se ao menos ajudar a desconectá-la por um tempo, já terá valido o esforço.

No entanto, não creio que a maioria dos pais de hoje (cansados e sem imaginação) permitiriam que seus filhos (dependentes de brinquedos prontos) se “arriscassem” tanto nas brincadeiras de ruas e quintais, por um momento inesquecível de felicidade, como as que se vê (com algum desconto) na tela..., independente de não existirem mais quintais. Na trama de espírito juvenil, a construção da montanha russa artesanal, com seu hilário resultado cartum, é genial! Perigosa? Talvez! Mas é convidativa! E é o que importa nessa idealização retrô que pode despertar a curiosidade de qualquer jovem espectador inteligente para outras traquinagens infantojuvenis..., digamos, mais seguras (risos). Ou até provocar nele uma invejazinha das animadas crianças do “faz de conta”...


Muitos pontos se destacam na narrativa fluída, como a técnica irretocável (ainda que, desde o nascimento da animação digital (CGI),  a eterna vesguice dos personagens, que nunca entendi a razão, me incomode); as texturas e a harmonia das cores; o desenho e a personalidade de cada personagem humano ou animal. Toda via da viagem no tempo, porém, enquanto adulto saudoso, vale ressaltar a forma inteligente, muito bem arquitetada, que o enredo “encontrou” de convidar o espectador infantojuvenil sedentário a dar asas à imaginação (desde que seus pais sejam também parceiros de construção, é claro!), como eu fazia quando criança de interior e, evidentemente, sem me dar conta do futuro tecnológico à minha espera. Nota: não sou um zumbilular, já que não uso celular!


Enfim, com seu humor discreto; as boas gags; sem mensagens piegas e ou lição de moral; criança agindo como criança, sem medo de ser feliz e ou sem reprimir a tristeza e a angústia diante das adversidades (ainda desconhecidas) da vida; roteiro redondinho e perspicaz e, portanto, sem subestimar o público; sem musiquinha chatinha a cada cinco minutos..., O Parque dos Sonhos é uma ótima pedida de filme para toda a família. Ah, mas pra curtir para valer esta bonita e surpreendente animação, os adultos não devem esquecer, em algum canto da casa ou apartamento, a sua eterna criança...


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...