quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Crítica: As Herdeiras



As Herdeiras
por Joba Tridente

Verdade seja dita, no Brasil o grande público sabe muito mais do cinema argentino, mexicano, cubano, uruguaio, do que do paraguaio. Mas, toda via da vizinhança latina, no entanto, pode ser que esta falha comece a ser corrigida com a estreia do premiadíssimo (em Berlim e em Gramado) drama As Herdeiras (Las Herederas, 2018), escrito e dirigido com notável competência por Marcelo Martinessi. O filme intimista e de uma elegância rara, fruto de ampla parceria (Paraguai, Alemanha, Uruguai, Noruega, Brasil, França), tem elementos do universo homoafetivo feminino suficientes para fazer sucesso aqui (e no mundo) junto ao público adulto, não necessariamente da terceira idade, como suas protagonistas...



Em sua trama bem urdida, As Herdeiras, com seu fascinante estudo de personagem, enreda o espectador à recente e desconfortável rotina de Chela (Ana Brun) e Chiquitita (Margarita Irún), duas mulheres outrora abastadas (na faixa dos 60 anos) que, passando por dificuldades financeiras e sem alternativa de renda, se veem obrigadas a vender seus preciosos bens. Aos poucos o casarão onde residem, em Assunção, capital do Paraguai, começa a esvaziar e este vazio a corroer a discreta relação homoafetiva que mantém há 30 anos. Neste ínterim Chiquitita é presa, por sonegação de impostos, e a vida de Chela, que até então, envergonhada da sua decadência econômica, evitava qualquer tipo de exposição social, toma um inesperado rumo, ao servir de motorista particular para idosas ricas e conhecer a sedutora e independente Angy (Ana Ivanova), uma mulher jovial em busca do prazer e da felicidade.


O diretor paraguaio Martinessi não tem pressa de abrir frestas que desvelem a personalidade de sua ensimesmada protagonista, tão cheia de receios sobre a própria intimidade e ou dúvidas sobre a exposição dos seus latentes desejos ao julgamento moral da sociedade hipócrita ao seu redor. Em sua excelente crônica de costumes (sociais e sexuais), tão familiar (e penosa) aos nossos olhos latino-americanos, não há sobras ou rebarbas a serem cortadas e muito menos alinhavos a serem feitos na envolvente narrativa que se arredonda e surpreende a cada minucioso parágrafo visual, com suas nuances na introspectiva fala do olhar de Chela, e ou no alvoroço alheio de Chiquitita na prisão feminina. A mim, os planos fechados, principalmente no rosto de Chela, na ânsia de desvelar a sua alma e sentimentos, através do seu expressivo olhar (que diz mais que qualquer diálogo), aproximam As Herdeiras dos mais fascinantes dramas psicológicos bergmanianos, como, por exemplo, a obra-prima Gritos e Sussurros (1972).


As Herdeiras é um filme tão belo quanto melancólico. Ainda que transite entre a fantasmagórica penumbra que se espalha pelo casarão (que aos poucos perde a identidade, esvaziado da memória de seus pertences) e a luz exterior que vagarosamente sinaliza os novos rumos de Chela pela cidade, na sugestiva fotografia naturalista de Luis Armando Arteaga, que foca o que é essencial e desfoca o que é detalhe descartável, como os meros coadjuvantes (quase figurantes) masculinos, numa trama libertária majoritariamente feminina (ou feminista!). Quanto à “trilha sonora”, felizmente ela só marca presença se minimamente necessária..., ou seja, a emoção é genuína e não conduzida por musiquinhas chorosas ao irritante estilo hollywoodiano. Ah, e por falar em Hollywood, não será surpresa se os norte-americanos decidirem refilmar esta história, do ponto de vista piegas lá deles, só para não ser preciso legendar...

Enfim, As Herdeiras, com seu irretocável elenco, é um filme de sutilezas femininas que vai agradar também aos homens..., sutis ou não em seus desejos mais íntimos!


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

segunda-feira, 27 de agosto de 2018

Crítica: Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas



Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas
por Joba Tridente

Confesso que jamais vira os tais Jovens Titãs até assistir à hilária animação juvenil Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas (Teen Titans Go! To the Movie, 2018). A princípio, por conta, principalmente da arte bem comum do cartaz, pensei em não ver o tal desenho animado oriundo de uma série (homônima) de tv, acreditando ser mais uma bobagem infantiloide. Mas, ouvindo uma informação aqui e outra acolá sobre os personagens e ignorando totalmente a sinopse, decidi arriscar..., e gostei do filme que vi. Bem, só o fato de ser apaixonado por animação, acho que valeu meia metragem corrida. Quanto ao traço simplório (em 2D), rotineiro em preguiçosos desenhos animados televisivos, acabou não interferindo no meu conceito..., talvez porque, em meio à narrativa mirabolante e muito ágil, acabei me encantando com a interferência (em flashback) de uma graciosa animação (bem infantil!) feita de recortes, sobre a vida de Robin.


Para quem não é fã da série de tv, assim como eu, e sequer ouviu falar dos personagens e tampouco assistiu aos trailers, saiba que a divertida história gira ao redor do egocêntrico Robin (aquele “parceiro” do Batman) e seu grupo de jovens aspirantes a super-heróis, formado por Ravena (feiticeira), Ciborgue (meio humano e meio robô), Estelar (extraterrestre) e Mutano (metamorfo), que andam ressentidos porque a Warner Bros ainda não demonstrou nenhum interesse em realizar um filme sobre eles. Robin, que é o mais vaidoso e obstinado do quinteto, fará de tudo para ter um filme próprio, pois, no seu ponto de vista, dará notoriedade e profissionalismo ao grupo de heróis considerado amador e ou, ao menos, a ele. Para tanto, leva a sua Liga de Titãs para Hollywood e tenta convencer a maior diretora de filmes de super-heróis de todos os tempos, Jade Wilson, a lhes dar uma chance cinematográfica. A resposta de Jade é curta e grossa: Um filme dos Titãs só no dia em que deixarem de ser uma piada, enfrentando e vencendo um vilão real! 

Toda via da boa peleja, porém, eis que, para felicidade geral do quinteto da DC Comics, a sorte (ou o azar) vai colocá-lo frente a frente com Slade (aquele que parece, mas não é o Deadpool, da concorrente Marvel), um novo vilão que decide aterrorizar Jump City..., uma cidade mais segura que GothamMas, será que, por um simples capricho, Robin estará disposto a um grande sacrifício, já que a fama tem o seu preço! E os Jovens Titãs, será que vão enfrentar o malvado Slade, para salvar a cidade e o mundo da sua demência ou apenas para aparecer em um filme? Saber mais do que isto, vai estragar o carrossel de surpresas..., e é uma atrás da outra, envolvendo super-heróis notórios e super-heróis obscuros em situações de perigo e ou (na maioria) ridículas, em Hollywood!


Pela irreverência e o tom jocoso das melhores paródias de super-heróis, com suas meta-gags impagáveis, a animação Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas, dirigida por Aaron Horvath e Peter Rida Michail,  vem sendo considerada uma versão infantil do sarcástico Deadpool..., que, aliás, é assunto de muitas piadas relacionadas ao Slade. Uma comparação nada descartável, já que o filme, além de não se levar a sério, aproveita a (meta)linguagem  ou o gênero cartoon/pastelão para ironizar os icônicos super-heróis dos universos DC e Marvel, com seus sucessos (como Guardiões da Galáxia, Liga da Justiça, Deadpool e Deadpool 2) e ou fiascos (como Lanterna Verde e Batman vs Superman - A Origem da Justiça). A mim, ele se aproxima mais da pérola LEGO Batman - O Filme (2017).


O bom de Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas é que, para um cinéfilo adulto embarcar na grande onda de ação desmedida e aventura (quase) nonsense (com boas doses de humor negro) da trama, não requer conhecimento prévio dos alucinados Jovens Titãs. O ruim é que o público muito jovem e sem referências da origem dos mais famosos super-heróis (DC ou Marvel)..., e conhecimento de filmes como O Rei Leão (1994) e De Volta Para o Futuro (1985), por exemplo, que ganharam releituras (estreladas por Robin, Batman, Superman, Mulher Maravilha, Aquaman) em sequências antológicas (engraçadíssimas)..., vai ter que se contentar com os números musicais também absurdos (Canção inspiradora sobre a vida, é o mais colorido e maluco deles), sem entender muito bem o contexto narrativo e o humor negro (do enredo). Aí, sobram as piadas bobas de peido e de cocô..., que as crianças apreciam muito mais (?) que os adultos.


Enfim, considerando a excelência do roteiro de Horvath e Michael Jelenic e a competente direção de Aaron Horvath e Peter Rida Michail; reconhecendo a coragem de praticamente transformar um filme de super-heróis em uma comédia musical, com clipes hilários e diálogos inteligentes; notando que os personagens dos Titãs são bem resolvidos e que me surpreendi com o egoísmo de Robin; vendo que sempre que a DC investe no humor (nonsense ou negro), rindo de si mesma, suas produções crescem em qualidade; ressaltando que a DC Comics saiu ilesa e, com certeza, ganhou muitos pontos dos espectadores (que não curtem muito o seu lado mais sombrio, que parece voltar na versão live-action da nova série dos Jovens Titãs) ao fazer um mea-culpa pesado (!!!) do Batman vs Superman e bem dosar o humor no saudável gracejo com a Marvel (convidando para a sátira o próprio Stan Lee (- Excelsior!), que recria a famosa cena do figurante varredor de rua em 007 Quantum of Solace)..., Os Jovens Titãs em Ação! Nos Cinemas é uma produção imperdível para quem ama desenho animado e paródia de super-heróis. Rindo até agora dessa deliciosa tolice, com suas meta-gags geniais...


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Crítica: Megatubarão


Megatubarão
por Joba Tridente

O primeiro Tubarão (1975), de Steven Spielberg, a gente não esquece. Assim como o primeiro Sharknado (2013), de Anthony C. Ferrante. Entre o assustador e a paródia (e lá se vão 38 anos!) apareceram trocentos Tubarões genéricos. Um mergulho no Google é você encontra a fera dentuça dos mares em filmes para todos os gostos. Principalmente para os fãs de trash não falta material.

Megatubarão (The Meg, EUA/China, 2018), com roteiro preguiçoso de Dean Georgaris, Jon Hoeber e Erich Hoeber, baseado no romance Meg (1997) de Steve Alten, e com direção de Jon Turteltaub, é um filme de ação tão linear quanto uma linha de pesca retesada. Ou seja: trama simplória, sem surpresas, personagens caricatos, diálogos curtos e toscos (ou moralista: Nós fizemos o que sempre fazemos: descobrir, para depois destruir.) e aquela manjada previsibilidade do “gênero”: tubarão atacando tudo que encontra pela frente e humanos buscando uma forma de eliminá-lo. Você tem dúvida de quem será o vencedor dessa grande peleja em alto mar e (de bônus) uma rapidinha pela praia repleta de turistas chineses?


Então, vamos lá: três oceanógrafos de uma estação de pesquisa submarina, ao se aventurar pelas profundezas do mar, onde nenhum homem jamais esteve, acabam esbarrando em um pesadelo gigantesco, um Megalodonte (dente enorme), o maior tubarão e ou predador pré-histórico de baleias de que já se ouviu falar. A boa notícia é que este é um achado de valor inestimável. A má notícia é que o (peixão) monstrengo está louco para variar o cardápio. E o tira-gosto, com os três apetitosos tripulantes, está encalhado bem ao alcance da sua bocarra. Será que vai ter sashimi para o almoço?


Bem (como nem tudo está perdido quando resta uma esperança...), tudo vai depender da resposta de um mergulhador chamado Jonas Taylor (Jason Statham), especialista em salvamentos, mas que, traumatizado com o resultado do seu último trabalho de resgate, anda preferindo se embebedar com cerveja e ganhar uns trocos em águas mais mansas com seu pesqueiro velho, na Tailândia. Porém, como é norma criar uma expectativa de suspense (em filmes desse porte) e todo espectador de cadeirinha sabe que o quê um personagem (protagonista) fala não se escreve, (isso não é spoiler, é clichê) é óbvio que quando ele souber quem está para ser devorado pelo Megatubarão, vai se curar do alcoolismo (de cinco anos em cinco minutos), aceitar o caso e ainda ficar para o rescaldo..., já que nenhum tubarão que se preze, mesmo sendo um cabeça oca pré-histórico, vai deixar barato tamanha ousadia em seu território, podendo contra-atacar no território do inimigo. E também, se não for para salvar (ou adoçar) o dia, para que serve um herói (proscrito!) que emborca cerveja atrás de cerveja sem perder a admirável forma física?


Assim, na maresia dos acontecimentos, com a astúcia (humana) e a força bruta (animal) se digladiando ao sabor das ondas, o clima padrão da narrativa multirracial, com pegadas científicas (por vezes constrangedoras), envolvendo patrões e empregados, segue-se a lengalenga dos traumas e dramas familiares, inimizades e ofensas pessoais, atos de heroísmo e de covardia, salvamento e morte, rivalidade e romance..., em meio a cenas de ação mirabolantes que, além de não meter medo algum, remetem a um viés (de situação) trash ou comédia (à beira do humor negro), com perseguições típicas de cartoon.


Enfim, considerando a direção claudicante e o script batido, que acrescenta absolutamente nada à filmografia de tubarões (principalmente depois da esculhambação de Sharknado); lembrando de algumas gags legais, no mar e na praia, principalmente as protagonizadas pelo gigantesco e insaciável tubarão sádico, que ajudam a engolir o passatempo com excelentes efeitos especiais (em 3D IMAX); certo de que as sequências de ataque (por serem tolas) parecem mais divertidas que traumatizantes e salientando que o elenco multinacional, que inclui Winston Chao, Rainn Wilson, Bingbing Li, Cliff Curtis, apenas cumpre o dever de casa..., Megatubarão, que começa com prólogo (até) dramático de um resgate de tripulantes presos em um submarino e ganha mais leveza e bom humor (involuntário!), a partir do segundo ato, é um filme pipoca que tem isca suficiente para fisgar o espectador (pouco ou nada exigente). Um filme-família totalmente esquecível cinco minutos após a sessão.  


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Crítica: Mamma Mia! Lá Vamos Nós de Novo


Mamma Mia! La Vamos Nós de Novo
por Joba Tridente*

Em tempos de exploração gratuita de violência explícita, nos meios de comunicação e de entretenimento (incluindo animações), nada melhor que uma boa comédia musical romântica, como a irresistível Mamma Mia! La Vamos Nós de Novo, roteirizada e dirigida por Ol Parker, para levantar o astral, reequilibrar as energias e botar um sorriso sincero nos lábios do espectador (cansado dos horrores cotidianos). Escapismo? Talvez? Mas, atualmente, se a gente não escapar de vez em quando, por algumas poucas horas que seja, enlouquece!


Mamma Mia! La Vamos Nós de Novo (Mamma Mia! Here We Go Again, 2018), continuação que faz jus ao inesquecível Mamma Mia de 2008, sempre no embalo dos compassos sonoros contagiantes do grupo sueco de musica pop ABBA (1972-1982 e anunciado retorno para 2019), conta duas boas histórias amorosas que se entrelaçam. Numa, em flashback, conhecemos as versões jovens da esfuziante Donna (Lily James), logo após a sua formatura em Oxford, em 1979, e o itinerário aventureiro e romântico que a levou à paradisíaca ilha grega Kalokairi; de suas maiores amigas Rosie (Alexa Davies) e Tanya (Jessica Keenan Wynn); e dos seus três complicados amores Harry (Hugh Skinner), Bill (Josh Dylan) e Sam (Jeremy Irvine), futuros candidatos a pai de Sophie (Amanda Seyfried). Noutra história, em 2005, enquanto o marido Sky (Dominic Cooper) estuda hotelaria em Nova York, a insegura Sophie prepara uma homenagem à sua mãe Donna (Meryl Streep), falecida há cinco anos, com a inauguração do Hotel Bella Donna, onde reencontraremos as versões bem mais velhas de seus três complicados pais Harry (Colin Firth), Bill (Stellan Skarsgård) e Sam (Pierce Brosnan) e das ansiosas amigas Rosie (Julie Walters) e Tanya (Christine Baranski). Ali, em Kalokairi, já não é surpresa ou spoiler, quem também chega para abrilhantar (mesmo!) a festa, é Cher, como Ruby, a avó ausente de Sophie, que fará um divertido dueto com Andy Garcia, o sedutor Señor Cienfuegos, na famosa Fernando. E, para arrematar tudo, numa sequência comovente, quem dá o ar da graça é a diva Meryl Streep...


É claro que a vida não é um musical onde tudo se resolve com uma canção ou uma dança, uma utopia ao alcance de qualquer um (até para quem não tem dotes de cantor ou de dançarino), mas bem que poderia ser (ou ter sido)..., não fosse o egoísmo, o egocentrismo, a ganância que submete a grande maioria do gênero humano ao capital que nos distingue como civilização (?) serviçal. Será por isso que muitos de nós inveja a liberdade dos animais não-humanos e dos silvícolas remanescentes e se apega tanto às fantasias de uma vida bucólica? Será que a tecnologia, em algum dia futuro, nos libertará do trabalho estafante que hoje nos aprisiona e nos devolverá uma vida de sonho onde a amizade vale mais que o dinheiro? Com o avanço da ciência, é uma antiga cogitação. Mas, o que fazer com os crédulos da Terra Plana?


Em Mamma Mia! La Vamos Nós de Novo, a vida é uma festa que não se deixa frustrar pela tempestade passageira que (sempre) traz a reboque a bonança. A receita é simples, beirando a ingenuidade, mas repleta de ingredientes clichês que poderia desandar facilmente em outras mãos. Não faltam as doces armadilhas dos amores jovens e as agridoces dos velhos amores que se atam e desatam nas tramas da vida que sempre podem deixar alguns fios soltos para os retardatários apaixonados, na visão generosa de Ol Parker, que também roteirizou os adoráveis O Exótico Hotel Marigold (2011) e O Exótico Hotel Marigold 2 (2015), com seus personagens idosos acertando contas amorosas com o passado e ou descobrindo novos amores.


É fácil gostar de Mamma Mia! La Vamos Nós de Novo, com suas duas boas histórias, sua trilha envolvente (ainda que por vezes alguma balada soe melancólica) com 18 canções do ABBA (I Have A Dream, com arranjo grego, ficou exuberante!), sua coreografia simplória e seus personagens bem escritos e admiravelmente interpretados por todo o elenco (sem exceção!). A comédia, de um romantismo gostoso (assim-assim meio piegas), tem direção segura e ágil de Parker, que demostra muita criatividade também nas excelentes transições de tempo e de cenários campestres, em sequências de bela plasticidade.


Assim, ainda que você não seja lá muito amante de musicais (porque do nada alguém começa a cantar e a dançar suas alegrias ou dores de amores), se, em vez de ficar se ocupando com a coerência ou a plausibilidade do roteiro (que não precisa ser original para ser bom, desde que bem escrito), se deixar levar pela narrativa totalmente descompromissada, feito os adoráveis personagens por seus sonhos, pode se surpreender se remexendo na cadeira, cantarolando alguma canção e decididamente apaixonado pelo filme...


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...