quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Crítica: Ariaferma

 

ARIAFERMA

por Joba Tridente 

Quando se fala em filme policial ou mesmo de ação, centrado em cadeia ou presídios, sempre se imagina uma trama de muita violência e praticamente nenhuma humanidade na relação entre policiais e prisioneiros e muito menos entre os prisioneiros..., um clichê que sempre funciona, mas que pode cansar com o passar do tempo e ou dos filmes. Seja prisão masculina ou feminina, há sempre um mesmo padrão recorrente: dominador e dominados e, conforme o país, sujeira pra todo lado. 


Toda via que leva cidadãos marginais e inocentes para detrás das grandes e dos muros altos, onde tudo pode acontecer, também pode levar grandes responsabilidades que, no cumprimento da ordem militar, não necessariamente necessita de violência física ou tortura psicológica. É óbvio que, embora o diálogo seja importante, nem sempre é possível uma conversação saudável e ou sequer civilizada entre criminosos e policiais. Entre a segurança e os conflitos da prisão real e da ficção, o diretor italiano Leonardo di Costanzo sugere, em Ariaferma (2021), um novo olhar sobre a relação (possível?) entre policiais e prisioneiros. O filme será exibido, online e gratuitamente, no 16º Festival de Cinema Italiano (05/11/2021 a 05/12/2021). 


Escrito por Leonardo di Costanzo, Bruno Oliviero e Valia Santella, este conto de boas intenções, que beira o melodrama, se passa numa antiga prisão, em lugar indefinido na Itália, que será desativada e os presos transferidos. No entanto, devido a questões burocráticas, doze presos serão obrigados a permanecer no local, junto com a velha guarda, que já comemorava o retorno para casa, até que uma nova prisão seja providenciada. Enquanto aguardam os trâmites, os presos ocupam celas centrais, próximas à administração, e um clima de tensão se instala e se agrava quando os prisioneiros passam a rejeitar as quentinhas (comida industrializada) já que a cozinha também foi desativada. Para evitar que o caos se instale, o Capitão Gaetano Gargiulo (Toni Servillo) acaba cedendo a uma reivindicação dos prisioneiros e autoriza o mafioso Carmine Lagioia (Silvio Orlando) cozinhar para eles, para desgosto do policial linha dura Franco Coletti  (Fabrizio Ferracane). Há ainda um misto de apreensão solidariedade no ar, com a chegada do jovem assaltante Fantaccini (Pietro Giuliano), à espera da pena definitiva. 


O drama Ariaferma é uma obra de ficção, livre das amarras da realidade, em busca de alternativas humanitárias para a vida na prisão. Alternativas que talvez funcionem num universo prisional micro (de crimes menores), como a sequência do jantar coletivo, por exemplo, mas, num macro, me parece impossível tamanha empatia. O que não quer dizer que sejam descartáveis. Talvez seja apenas uma questão administrativa ou de se encontrar uma fórmula para realizar a fantasia. 

Diz-se que todo carcereiro é tão prisioneiro quanto os criminosos que encarcera. Gaetano refuta tal ideia, uma vez que está ali a trabalho e não por algum crime hediondo que tenha cometido. Ainda que certas cenas incomodem, não é um filme cruel e tampouco espetaculariza a violência (apenas a sugere)..., embora mantenha um (bem resolvido) clima de suspense por toda a narrativa, que remete a cenários de filme de terror. 


Enfim, Ariaferma é um filme diferente na sua maneira de expor tensão, raiva, solidariedade, fragilidade, insegurança de homens em lados opostos da lei e da ordem, mas também comovente sobre uma utópica vida prisional, ótimo elenco, encabeçado por Toni Servillo e Silvio Orlando, excelente direção Leonardo di Costanzo, fotografia intimista de Luca Bigazzi e cenografia arrepiante de Luca Servino. 

Trailer: aqui

 

NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha. 

Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


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