VAMOS NOS
DIVORCIAR
por Joba
Tridente
Quem não gosta de uma boa
comédia de costumes? Em tempo de pandemia não anda fácil a gente dar umas boas
risadas. Toda via do humor, no entanto, confesso que ri um bocado com a hilária
comédia russa, com pitadas de humor negro e nonsense, Vamos Nos
Divorciar (2019), escrita e dirigida por Anna Parmas. O tema é até
clichê em Hollywood: um marido, Misha (Anton Filipenko), troca a
mulher, Masha (Anna Mikhalkova), médica ginecologista workaholic,
mãe de seus dois filhos, por Oksana (Anna Rytsareva), uma jovem personal
trainer.
O casal reside num
condomínio novo (típico de filmes americanos: casas iguais e vizinho estressado)
e Masha é tão focada em seu trabalho, que acaba se tornando uma mãe e mulher
ausente, sempre preocupada com as contas da casa. Misha, geofísico
desempregado, que se ocupa dos deveres de casa, inclusive das crianças, é um
cara gente boa que nas horas vagas frequenta uma academia de ginástica. Certa
noite de luz de geladeira para o casal, num toque de celular, a traição de Misha
com Oksana cai de sms nas mãos de Masha que, de tão tola,
não se dá conta do óbvio ululante no intenso sapp-vupt do marido com a
amante. Depois do leite derramado em casa alheia, indignada, descontrolada e se
sentindo a mulher mais humilhada da Russia, Masha vai fazer de tudo
(mesmo!) para ter Misha de volta. Porém, suas malucas e ridículas receitas
sobrenaturais (mandingas muito usadas por mulheres inseguras e com receio da
solidão também no Brasil) para reconquistar o amor perdido de Misha, não
saem exatamente como ela espera..., algumas são bem engraçadas e outras bem melancólicas.
Vamos Nos Divorciar é uma comédia leve e até
descompromissada. Porém, a trama narrativa e a personalidade de Masha
podem incomodar mulheres independentes, já que, a princípio, a médica é
apresentada como uma mulher chata, tonta, submissa, totalmente sem noção e
absurdamente tosca no relacionamento com os filhos e com o (ex)marido. Mas...,
ela não tem uma com boa formação educacional e cultural? É até ginecologista!
Sim, está no roteiro! Mas..., é bom que se diga, dependendo do ponto de vista, nem
tudo que está no roteiro (escrito por uma mulher), pode ser considerado
incongruência, deslize ou escorregão na casca de banana. O “equívoco” pode não
passar de evocação à Jornada da Heroína? Será? Bom..., quem assistir
decidirá!
Enfim, considerando o
roteiro simples e a direção correta de Anna Parmas, que critica, de maneira
nada velada, a falta de personalidade, de independência e, principalmente, de autoestima
das mulheres profissionais e ou tão somente donas de casa (bibelôs do lar); o bom
e correto uso de estereótipos da cinematografia internacional (muito comum nos
EUA); o tempo necessário para uma mulher invisível, como Masha (que só
faz trabalhar), reconquistar a visibilidade diante da família e de amigos; a
discutível questão (na Rússia?) de que a mulher é mais pudica que o homem em
relação às oportunidades sexuais; as reviravoltas surreais do geofísico Misha
(se é que todos os “pecadilhos” podem ser
perdoados na Terra e ou no Céu); dispensando
as indefectíveis cenas de corrupção (policial) e de bebedeira constrangedora (generalizada em filme russos) e um claudicante
tropeço na continuidade..., Vamos Nos Divorciar é um bom entretenimento:
leve, divertido, breve (92 min), reflexivo, charmoso e esquecível depois do relaxante
passatempo...
Nota: O filme Vamos Nos Divorciar será
exibido no 1º. FESTIVAL DE CINEMA RUSSO -
Russian Film Festival (10 a 30 de dezembro de 2020) que acontece online e
gratuitamente na plataforma de streaming Spcine Play.
Joba Tridente: O
primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros
videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm,
realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e
coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003),
de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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