terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Crítica: O Coração do Mundo

 


O CORAÇÃO DO MUNDO

por Joba Tridente 

De vez em quando esbarro em algum filme difícil de classificar. O premiado russo O Coração do Mundo (Сердце мира, 2018), dirigido por Natalia Meshchaninova, é um deles. Fica entre o drama obscuro, o suspense e o terror realista. Na trama, acompanhamos a cansativa rotina do veterinário Egor (Stepan Devonin) numa fazenda legalizada de treinamento de cães de caça à raposa, à texugo, à cervo. Ele é um sujeito seco, inexpressivo, com sinais claros de psicopatia grave e que aparenta guardar um segredo terrível. Morando numa edícula, naquela fazenda esquecida no fim do mundo, onde parece apenas chover ou fazer frio, o solitário e monossilábico Egor cumpre à risca os mandos do patrão: alimenta e trata bem dos animais da fazenda e daqueles hospedados ali para o torturante treinamento de caça à raposa e ao texugo..., que é de uma crueldade absurda. Toda via da revolta, porém, ao descobrir a presença de ambientalistas bisbilhotando ao redor da fazenda, o veterinário (sempre na iminência de um ataque de fúria) vai demonstrar que, mais que um médico de animais, pode ser um verdadeiro cão de guarda do local...



O Coração do Mundo, que recebeu os prêmios Grand Prix, no Kinotavr Open Russian Film Festival 2018 e o de Melhor Ator Coadjuvante (Dmitriy Podnozov), no Russian Guild of Film Critics, é um filme que incomoda pela selvageria institucionalizada, diálogos crus, ações apavorantes (a que acontece num acampamento de ecologistas vai fazer os campistas terem pesadelos)..., aprisionamento físico e moral dos seus protagonistas perdidos em seus desejos interrompidos. Momentos de alegria ou de felicidade são tão parcos naquele lugar sombrio, onde moram também a mulher, a filha e o neto, do proprietário Nikolai Ivanovitch (Dmitriy Podnozov), que apenas quem assistir saberá se vale mencionar...

Enfim, O Coração do Mundo é um filme que pesa uma tonelada na cabeça do cinéfilo. Além da reflexão sobre a irracionalidade humana (evidentemente!), também busca foco ao questionar o alcoolismo (clichê indefectível nos filmes russos) e ao tangenciar os males das relações e das carências afetivas. A direção, elenco e a fotografia naturalista são excelentes. Não recomendo às pessoas com sensibilidade à flor da pele, ambientalista e defensores dos animas..., mas se quiserem se indignar com algumas sequências, fiquem à vontade.

Nota: O filme O Coração do Mundo será exibido no 1º. FESTIVAL DE CINEMA RUSSO - Russian Film Festival (10 a 30 de dezembro de 2020) que acontece online e gratuitamente na plataforma de streaming Spcine Play.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...