terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Crítica: Bolshoi

 

BOLSHOI

por Joba Tridente

O Teatro Bolshoi é o sonho da maioria dos milhares de candidatos às escolas de balé russas. Chegar lá e fazer acontecer em seu divino palco requer talento, obediência, perseverança e, é claro, algum jogo de cintura para lidar com a “inflexibilidade” dos professores e dirigentes, os desejos sexuais, as invejas e os preconceitos dos “colegas” do corpo de baile, os vícios e as necessidades básicas de vivência. Ao menos é o que se vê nas produções (fictícias e documentais) nacionais e ou estrangeiras que (baseados ou inspirados em fatos) retratam a ascensão de um(a) grande bailarino(a) na Academia de Balé Bolshoi e a consagração naquele cobiçado palco. O sucesso no balé russo tem o seu alto preço..., uma dose arrogância na autoafirmação, ameniza os custos, mas não alivia as perdas.

Se na ópera temos a Prima Donna e o Primo Uomo, no balé temos a Primeira Bailarina e o Primeiro Bailarino..., posições disputadíssimas (desde os primeiros passos) no vale tudo pelo estrelado. O talento e a perseverança levam à perfeição dos gestos, mas não necessariamente à consagração no Bolshoi. Assim é, se nos parece, nesse recorte da famosa companhia de balé russa coreografado em Bolshoi (Большой, 2016). E para conjugar o título com a trama de sapatilhas, basta acompanhar a saga (em flashback) da jovem Yulia Olshanskaya (Margarita Simonova), que divide o talento na academia com a amiga Karina Kurnikova (Anna Isaeva). Até onde vai a amizade entre um jovem de origem humilde (e bota humilde nisso!) e uma jovem de origem rica na disputa pela primazia do palco do Teatro Bolshoi?



Bolshoi, dirigido por Valery Todorovsky, é um Conto de Fadas contemporâneo, onde não faltam os elementos clássicos do gênero (pobre e rico, ciúme e inveja, ambição e obstáculos, humilhação e preconceito etc) que dão substância à Jornada do Herói (ou Heroína). Baseado no roteiro de Anastasiya Palchikova, a narrativa acompanha (de forma não-linear) a exaustiva rotina da insegura e atrevida jovem Yulia, que, ao ser aceita na escola de balé, “deixa para trás” um passado difícil, rumo a um futuro incerto. Nos oito anos de escola a garota enfrentará os percalços da vida de bailarina num ambiente onde confiança e traição dançam lado a lado e o valor da amizade, aliado ao valor da necessidade, pode ser avassalador, tanto para quem paga quanto para quem recebe por um momento de glória.

Ascensão (pelo talento), queda (pelo vício) e superação (pelo esforço) de um artista fazem parte do panorama..., a História da Arte está cheia de exemplos. Daí que, não importa se os prazeres e as aflições de Yulia (no balé e na vida) são originais e ou meros clichês já vistos e revistos em outros filmes, mas em como a história dela está sendo contada e o subtexto (nada discreto) enredado.



Enfim, considerando o cenário, cujo painel esboça estampas relacionadas à perda da virgindade, ao mal de Alzheimer, à delinquência juvenil, à adolescência interrompida, às ações por impulso, ao menosprezo, ao alcoolismo (como bebem esses russos, hein?), à corrupção, à vaidade, ao estrelato e ao ostracismo, aos sonhos e pesadelos, aos preconceitos numa escola dedicada ao balé..., com sua fotografia (de registro) discreta; bom elenco numa trama razoável e acessível ao público jovem (principalmente feminino), aspirantes e ou bailarinos, e que não deve aborrecer os adultos; e uma direção correta, ainda que apresente pouquíssimos números de balé, Bolshoi é um filme que ajuda a passar o tempo e, pode surpreender a quem nunca assistiu algo do gênero, e ou anseia por frequentar uma grande escola de balé...

Nota: O filme Bolshoi será exibido no 1º. FESTIVAL DE CINEMA RUSSO - Russian Film Festival (10 a 30 de dezembro de 2020), que acontece online e gratuitamente na plataforma de streaming Spcine Play.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


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