quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Crítica: Django Livre



Não fosse a sazonalidade, o cinema seria uma chatice sem fim. Com a magia das estações, no entanto, mexe e vira e mexe: ploft!..., das cinzas surge uma Fênix que voa conforme a intensidade da luz e do som, deixando brasas que (re)arderão quando sopradas. A beleza, graça e vitalidade da nova Fênix dependem da força do soprador que tanto pode (apenas) espalhar cinzas quanto produzir um retumbante fogaréu. Desde que “trocou” a vida de balconista da Video Archives pela de roteirista e diretor em Hollywood, Quentin Tarantino só faz botar lenha na sua fogueira. Para alguns espectadores é fogo que pela, para os detratores é fogo morto, só porque ele realiza primeiro o que sequer pensaram.

Segundo Tarantino, a criação de Django Livre surgiu há mais de 10 anos: A gênese inicial de toda a ideia foi a de um escravo que se torna um caçador de recompensas e sai atrás de feitores que se escondem em fazendas agrícolas. Eu comecei a escrever e o Django se apresentou a mim. No início, ele era apenas quem ele era - o sexto numa fileira de sete escravos acorrentados. Mas ele foi se revelando para mim, cada vez mais, à medida que eu ia escrevendo. Eu sempre quis fazer um faroeste. Eu gosto de todos os faroestes, mas como os spaghetti westerns sempre foram os meus favoritos, eu pensei que, no dia em que eu fizesse um, seria naquele universo do Sergio Corbucci. Ao adequar a história de um homem que se infiltra numa fazenda escravagista norte-americana, a fim de resgatar a sua esposa, ressaltou: Não pode ser mais angustiante do que era na vida real. Não pode ser mais surrealista do que era na vida real. Não pode ser mais ultrajante do que era na vida real. É inimaginável se pensar na dor e no sofrimento que ocorreram neste país. A realidade se encaixa no panorama colossal de um faroeste spaghetti que se poderia imaginar para esta história.


O título Django Livre é uma clara homenagem ao Django (1966), clássico faroeste spaghetti dirigido por Sergio Corbucci e estrelado por Franco Nero, que faz uma participação especial e divertida, para quem conhece o personagem original. O drama de amor e vingança, é ambientado no sul dos Estados Unidos, dois anos antes da Guerra Civil. A sua trama gira em torno de um caçador de recompensas alemão, o dr. King Schultz (Christoph Waltz) que, no encalço dos assassinos irmãos Brittle, descobre que o único jeito de encontra-los é contando com a ajuda do escravo Django (Jamie Foxx) que, por sua vez, vai precisar dos serviços do alemão para resgatar a sua mulher, Broomhilda (Kerry Washington), comprada pelo perverso Calvin Candie (Leonardo DiCaprio), que tem a seu serviço o repulsivo escravo doméstico Stephen (Samuel L. Jackson).

Django Livre (Django Unchained, EUA, 2012), assim como as obras anteriores do diretor, provoca diversas sensações (e reações) no espectador..., e não só pelo grau de violência (física e psicológica) e ou quantidade de sangue. Seus diálogos estranhos e cenas de puro humor negro (ôps!) tanto garantem riso, quanto convidam à reflexão, como a hilária sequência do ataque da abominável pré-ku klux klan, que pode ser confundida com paródia. Sabendo dosar e ou narrar, uma denúncia (ou crítica) feita com humor é muito mais eficiente.


Evitando as facilidades da computação gráfica, Tarantino optou por filmar o seu primeiro western (faroeste spaghetti ou bang bang) em locações no Wyoming, Louisiana e Califórnia, por serem regiões que remetem aos inimagináveis horrores da escravidão e para dar maior veracidade aos seus personagens, sujeitando atores e equipe técnica às intempéries. Não é um filme para indiferentes e ou apenas para fãs. A preocupação com detalhes técnicos, variedade musical e performances impecáveis de todo elenco são notáveis. É impossível destacar Waltz sem se lembrar de DiCaprio ou de L. Jackson..., todos em momentos inspiradíssimos.

Dramático e impactante, Django Livre vem despertando polêmica desde a sua estreia. Há quem o ache racista, preconceituoso e quem o considere um libelo contra a opressão, um grito de liberdade que precisa ser ouvido. Para o ator Dennis Christopher (Moguy): A escravatura não foi apenas uma pequena nódoa na História. É algo que serviu de alicerce à construção deste país e a crueldade que ela personifica é algo que precisamos analisar. Eu pesquisei muito antes de viajar até aqui, e uma das coisas que aprendi é o pouco que eu tinha aprendido sobre isso na escola. E você nunca sabe até onde pode ir a maldade humana a menos que discuta isso, a menos que você comece a falar disso, a menos que exemplifique isso.

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