AMÉRICA ARMADA
por Joba Tridente
A busca pela justiça
e o resgate da cidadania é o foco de dois pertinentes documentários que
serão lançados brevemente: América Armada (em plataformas de streaming: 11.03.2021
no NOW, Vivo Play, Oi Play e, em 25.04.2021, na Globo News) e ProibidoNascer no Paraíso (ainda sem data nos cinemas).
No documentário América
Armada, dirigido e roteirizado por Alice Lanari e Pedro Asbeg (Democracia
em Preto e Branco e Geraldinos), o espectador segue os aflitivos
passos de três destemidos ativistas sociais no enfrentamento da violência
armada em busca de justiça, cidadania e dignidade. São eles: o brasileiro Raull
Santiago; a colombiana Teresita Gaviria e o mexicano Heriberto
Paredes. Raull nasceu e cresceu no Complexo do Alemão e é membro do Coletivo
Papo Reto. Determinado em divulgar os abusos da polícia na sua comunidade,
o jovem, munido de celular, registra e transmite em lives as abomináveis
ações e armações policiais. Teresita, que carrega no corpo e na alma a dor da
perda do filho assassinado há dezoito anos, é a militante com a voz mais grave
do grupo Madres de La Candelária e, além de campanhas contra a
violência, promove o encontro de mulheres com os assassinos presos de seus
filhos e filhas. O jornalista Heriberto, mesmo ameaçado de morte, não deixa de
acompanhar e divulgar a luta insana de grupos de autodefesa compostos por
indígenas, que se viram obrigados a se armar para defender seus territórios e
suas vidas contra o narcotráfico.
Na crueza arrepiante de
seus registros, Pátria Armada, com fotografia e câmera de Pablo
Baião, não é mais um documentário alertando sobre as desordens governamentais,
pois destas já estamos vesgos de tanto ver o raio cair sempre nos mesmos quintais...,
mas um filme-denúncia em busca de um eco maior para a sua crítica e ou grito
aos inertes. O tema não é inédito, já o vimos em telejornais, matérias especiais
e até em filmes de ficção. Aqui, o que faz a diferença é o olhar de quem está
dentro da guerra, de quem não é imune, mas (ainda?) está conseguindo sair ileso
da constante rajada de raios ameaçadores, a se somar a outros olhares imprescindíveis
sobre a destruição e a destituição de seus quintais. No corpo a corpo, no cara
a cara com a truculência, uma fileira de “por que?” dirigida aos
genocidas e seus correligionários de milícia. Por mais que pareçam perguntas ao
vento, são questionamentos que precisam ser feitos..., até que a sociedade,
mais organizada que o crime organizado (e institucionalizado), se dê conta de
que é muito mais forte do que o estado ausente e a justiça claudicante a fazem
crer e reaja.
As feridas abertas da
América Latina sangram, gangrenam e estão longe de serem cicatrizadas, mas nem
por isso devem ser dispensados os tratamentos de conscientização. O diretor Pedro
Asbeg disse que, enquanto filmava, percebeu que “A situação do Brasil tem
uma série de semelhanças com países e povos com quem, infelizmente, troca e
aprende muito menos do que poderia e deveria. Acredito que a principal
descoberta tenha sido a confirmação de que a violência é um fenômeno regional,
que afeta todos os países da América Latina, em particular os três em que
filmamos: Brasil, Colômbia e México.” Para Alice Lanari: “As diferenças
históricas e culturais de cada país estão presentes, mas os processos sociais
são vistos como peças de um mesmo jogo, que se repete em distintos tabuleiros. Foi
assustador perceber que aquilo que estava acontecendo no Brasil durante as
filmagens, e que só se aprofundou depois disso, tinha e tem muitas semelhanças
com o que já aconteceu - com resultados trágicos - em outros países
latino-americanos”.
A Comisión Mexicana de
Defensa y Promoción de los Derechos Humanos escreveu, em seu site, que o
documentário América Armada “retrata o caminho de três pessoas com
lutas que parecem distintas, mas que, no fundo, clamam pelo mesmo: justiça,
liberdade, verdade e reparação.” E como ressaltou Heriberto Paredes, que
também não recua com as ameaças nada veladas de policiais, milicianos e
traficantes: “Existe uma nova fase dentro do capitalismo que se vive na
América Latina. Eu chamaria de capitalismo criminoso. Em que a
violência também já é um grande negócio. Não significa que antes já
não fosse. Mas de uns vinte anos para cá se consolidou como um grande negócio. O
grande negócio na América Latina é a reprodução da violência.”
NOTA: As considerações acima são pessoais
e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de
carteirinha.
Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema)
aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro
curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer
crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se
compara à "traumatizante" e divertida experiência de
cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do
norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003),
de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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