quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Crítica: As Aventuras de Tintim: O Segredo do Licorne



Quando Hollywood volta seus cobiçosos olhos para o mundo dos quadrinhos, em busca de inspiração, os fãs de HQs tremem na base, porque sabem que a Meca do Cinema pouco (ou quase) nada se importa com a fidelidade às fontes inspiradoras. Com o tempo eles até aprenderam que uma coisa (HQ) é uma coisa e outra coisa (Hollywood) é outra coisa. Não que isso satisfaça, mas é uma boa desculpa para não enfartar. No entanto, a simples menção de uma possível “releitura” de Akira (de carne e osso) causa arrepios em muita gente (inclusive em mim). Mas, e o que dizer de As Aventuras de Tintim, de Georges Remi, o Hergé (1907 - 1983), segundo Steven Spielbeg (direção) e Peter Jackson (produção)? Ah, com certeza vai dividir opiniões.


As Aventuras de Tintim: O Segredo do Licorne (The Adventures of Tintin, EUA, Nova Zelândia, 2011) de Spielberg, que a meu ver se sai melhor em filmes de aventura e ação, do que em melodramas piegas, já começou 2012 ganhando o Globo de Ouro, de melhor animação.  Se em cinema nem sempre um currículo conta pontos, aqui ele faz a diferença. Tendo por base três curiosas histórias de Hergé: O Segredo do Licorne (1943), O Caranguejo das Tenazes de Ouro (1941) e O Tesouro de Rackham, o Terrível (1944), a responsabilidade do excelente roteiro não poderia estar em melhores mãos: Steven Moffat (escritor de Doctor Who), Edgar Wright (diretor de Todo Mundo Quase Morto e Scott Pilgrim Contra o Mundo) e Joe Cornish (diretor de Attack the Block). Um escocês e dois ingleses que sabem muito bem como falar com o público infantojuvenil, principalmente com aquele adolescente que odeia mesmice.


Esta primeira animação (de três), que procura ser fiel aos quadrinhos (adaptando e não recriando), serve como um cartão de visitas, apresentando (principalmente para o público americano que não conhece Tintim) personagens importantes no universo do herói. Tudo começa numa bela manhã quando, em uma Feira de Artes e Antiguidades, logo após posar para um artista (Hergé), Tintim (Jamie Bell) compra uma bela maquete do navio Licorne e descobre que um sujeito estranho e o sinistro Sakharine (Daniel Craig) estão interessados na mesma peça. Tentando descobrir a razão de tanto interesse por um objeto relativamente barato, ele e o seu fiel fox terrier Milu acabam “embarcando” numa fascinante viagem, repleta de perigos, onde conhecem o beberrão e quase sempre ranzinza Capitão Archibald Haddock (Andy Serkis), que vai lhe fazer companhia em muitas outras aventuras, e a cantora de ópera Bianca Castafiore (Kim Stengel), que também vai dar o ar da graça futuramente. A única certeza que o corajoso jornalista tem é a de que, se (realmente) precisar e não tiver muita pressa, pode recorrer aos serviços dos desastrados agentes policiais Dupond (Simon Pegg) e Dupont (Nick Frost), os seus eternos coadjuvantes.


O Segredo do Licorne é uma animação belíssima, divertida, e com aquele ritmo de ação e aventura característico de Spielberg (correria e pancadaria com muito humor) em seus filmes meio família. Muita gente vai se lembrar do intrépido Indiana Jones, mas é bom que se diga: Tintim já era intrépido muito antes do Indiana. As características dos personagens de Hergé foram mantidas. Talvez haja algum exagero na bebedeira de Haddock, mas é dela e das trapalhadas de Dupond e Dupont que saem as melhores gags. A fantástica abertura do filme em 2D já diz a que veio. Ou quase. O deslumbramento visual da história que a segue, então, do primeiro ao último quadro, é indescritível.  É difícil saber se o que envolve o espectador é a excelência da narrativa de mistério ou os cativantes Tintim, Milu (espontâneos) e Haddock (dramático).


Segundo Hergé: “Sou eu, sob todas as formas! Tintim, quando quero ser heróico, perfeito; os Dupondt, quando sou estúpido; Haddock, sou eu quando tenho vontade de me exteriorizar.” O jornalista perspicaz, com cara de adolescente e audácia de gente grande, que ganhou a Bélgica em 10 de Janeiro de 1929, é um personagem que evoluiu à medida que o seu autor adquiria conhecimento real da geografia, da história, do comportamento sócio-político dos povos em todo o mundo. Alguns críticos e estudiosos ainda se debruçam sobre as publicações, analisando histórias como Tintim no País dos Sovietes, Tintim no Congo, Tintim na América, por se acreditar que elas caracterizam uma ideologia fascista, colonialista, racista. Bem, não deve ser fácil analisar obras de ontem com os olhos de hoje, num contexto completamente diferente.


Polêmicas à parte, a verdade é que, em pouco tempo, Tintim ganhou a Europa e, bem antes de chegar a Steven Spielberg e Peter Jackson, a suas aventuras investigativas ganharam o cinema e a televisão. Em 1947, Claude Misonne dirigiu a animação belga, feita com marionetes, de O caranguejo das tenazes de ouro. Nos anos 1960 foi a vez de duas adaptações com atores: Tintim e o mistério do Tosão de Ouro, dirigida por Jean-Jacques Vierne (1961), e Tintim e as laranjas azuis, por Philippe Condroyer (1964). Na virada da década o jornalista aventureiro voltou ao mundo animado com Tintim e os prisioneiros do sol, longa dirigido por José Dutillieu (1969), e Tintim e o lago dos tubarões, por Raymond Leblanc (1972). A televisão popularizou ainda mais o personagem. Entre 1958 e 1963 a Belvision produziu 104 episódios animados de As Aventuras de Tintim, por Hergé e, em 1991, a Ellipse Programmé (França) e a Nelvana (Canadá) lançaram As Aventuras de Tintim, uma série em 39 capítulos que fez a alegria da criançada. Esta última série passou pela TV Cultura e (re)estreia nesta sexta (20) no Canal Futura.


Em produções desse porte é até redundante falar de tecnologia (de cair o queixo) na captura digital de movimento, que tem em Andy Serkis (King Kong, Gollum, Cesar) um dos mestres na interpretação com "motion capture", técnica usada anteriormente (com eficiência) em animações como: O Expresso Polar (2004) e A Lenda de Beowulf (2007), de Robert Zemeckis; A Casa Monstro (2006), de Gil Kenan; Marte Precisa de Mães (2011), de Simon Wells. E ou destacar o bom uso da plataforma gráfica (e cenográfica) com um dos melhores aproveitamentos do 3D. Resta saber se a animação que tem tudo para agradar os fãs das HQs e seriados televisivos, continuará com a mesma qualidade na próxima aventura com direção Peter Jackson. Enquanto isso não acontece é sentar e curtir o ótimo passatempo (se possível em 3D).

6 comentários:

  1. Você estava nos meus arquivos e eu nos seus, re re. Bem, nos anos 70/80 eu ainda era um menino/adolescente andando descalço na beira do pantanal, então minhas vivências políticas são mais escassas que as suas. Mas me considero de esquerda, embora sem filiações partidárias. Simpatizo com pessoas ("quadros", como se diz nos partidos), por exemplo o Brizola Neto. Me considero mais que tudo um utopista. Acredito na necessidade, cada vez mais urgente, de superação do capitalismo e dos padrões de vida modernos em geral, como condição de sobrevivência da espécie. E por aí afora. Mas não acredito mais em transformações abruptas e forçadas, que se sobreponham à consciência das pessoas. Acho que um de meus próximos posts, sobre o Tio Patinhas, indica melhor esses "posicionamentos".
    Aliás, é minha deixa pra dizer que, apesar de não ser propriamente fã do Spielberg, estou ansioso pra ver Tintim, e acho que vou gostar, embora (ou justamente porque) não tenha gostado da única história que li dele. Pois é, entre os produtos da cultura de massa de que não posso deixar de gostar, os quadrinhos e a música estão em primeiro lugar, na frente até do cinema...
    Abração e até a próxima!

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  2. A única semente, se num solo fértil, capaz de transformar
    o homem é o cooperativismo.

    Tintim, segundo Spielberg/Jackson é muito bacana,
    acompanhava a série (repetitiva) da TV Cultura.

    Gosto muito de HQs, já escrevi e desenhei algumas e também já fui cartunista. Há poucos anos me desfiz de uma boa Gibiteca.
    Ainda estou me desfazendo de alguns volumes que reservei.

    Abs.

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  3. Legal, hem? Queria ser cartunista quando pequeno, mas quando pedi o curso do IUB a apostila que veio foi de desenho técnico. Que gibis você tem à venda? Aliás, me diga isso por e-mail...
    Abração e até mais ler!

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    Respostas
    1. Eu aprendi desenhando, por conta.
      No primário estava sempre ilustrando
      os meus cadernos,principalmente, de História.

      Hora dessas lhe passo a lista.

      Abs.

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  4. Pois é, eu tenha certo talento, mas precisava de algum estudo pra aprender detalhes: perspectiva, profundidade, sombreamento, essas coisas. Mas ainda gosto de rabiscar até hoje. Dia destes posto minha """obra-prima""", a caricatura do Pe. Benito, então diretor da escola em que eu estudava, num jornalizinho que quase me valeu a expulsão. E você, veja se posta as suas em algum lugar. Visitei seus outros blogs, vi os desenhos (em paint?) do Falas ao Acaso (gostei, e também dos poemas), mas nenhuma caricatura a tinta. Vc, pelo visto, poderia tranquilamente escrever uma boa autobiografia. (Não estou te chamando de velho, re re.)
    Abração!

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  5. Bem, já fiz ilustrações para diversas publicações (jornais e livros),
    trabalhando com nankim e também com colagem.

    As ilustrações de Falas ao Acaso variam.
    Gosto de misturar técnicas(desenho, colagem, foto)
    e de trabalhar alguns efeitos no photoshop.

    Estou para criar um quarto blog para postar
    o meu trabalho de artista plástico e ilustrador.

    Obrigado por visitar os meu blogs.

    Abração.

    T+

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