Quando Hollywood
volta seus cobiçosos olhos para o mundo dos quadrinhos, em busca de inspiração,
os fãs de HQs tremem na base, porque sabem que a Meca do Cinema pouco (ou
quase) nada se importa com a fidelidade às fontes inspiradoras. Com o tempo eles
até aprenderam que uma coisa (HQ) é uma coisa e outra coisa (Hollywood) é outra
coisa. Não que isso satisfaça, mas é uma boa desculpa para não enfartar. No
entanto, a simples menção de uma possível “releitura” de Akira (de carne e
osso) causa arrepios em muita gente (inclusive em mim). Mas, e o que dizer de As Aventuras de Tintim, de Georges
Remi, o Hergé (1907 - 1983), segundo
Steven Spielbeg (direção) e Peter Jackson (produção)? Ah, com
certeza vai dividir opiniões.
As Aventuras de Tintim: O Segredo do
Licorne (The Adventures of Tintin, EUA, Nova
Zelândia, 2011) de Spielberg, que a meu ver se sai melhor em filmes de aventura
e ação, do que em melodramas piegas, já começou 2012 ganhando o Globo de Ouro, de melhor animação. Se em cinema nem sempre um currículo conta
pontos, aqui ele faz a diferença. Tendo por base três curiosas histórias de
Hergé: O Segredo do Licorne (1943), O Caranguejo das Tenazes de Ouro (1941)
e O Tesouro de Rackham, o Terrível
(1944), a responsabilidade do excelente roteiro não poderia estar em melhores
mãos: Steven Moffat (escritor de Doctor Who), Edgar Wright (diretor de Todo
Mundo Quase Morto e Scott Pilgrim
Contra o Mundo) e Joe Cornish
(diretor de Attack the Block). Um
escocês e dois ingleses que sabem muito bem como falar com o público
infantojuvenil, principalmente com aquele adolescente que odeia mesmice.
Esta
primeira animação (de três), que procura ser fiel aos quadrinhos (adaptando e
não recriando), serve como um cartão de visitas, apresentando (principalmente
para o público americano que não conhece Tintim)
personagens importantes no universo do herói. Tudo começa numa bela manhã
quando, em uma Feira de Artes e Antiguidades, logo após posar para um artista
(Hergé), Tintim (Jamie Bell) compra uma bela maquete do navio Licorne e descobre que
um sujeito estranho e o sinistro Sakharine
(Daniel Craig) estão interessados na
mesma peça. Tentando descobrir a razão de tanto interesse por um objeto
relativamente barato, ele e o seu fiel fox terrier Milu acabam “embarcando” numa fascinante viagem, repleta de
perigos, onde conhecem o beberrão e quase sempre ranzinza Capitão Archibald Haddock (Andy
Serkis), que vai lhe fazer companhia em muitas outras aventuras, e a
cantora de ópera Bianca Castafiore (Kim Stengel), que também vai dar o ar
da graça futuramente. A única certeza que o corajoso jornalista tem é a de que,
se (realmente) precisar e não tiver muita pressa, pode recorrer aos serviços dos
desastrados agentes policiais Dupond
(Simon Pegg) e Dupont (Nick Frost), os
seus eternos coadjuvantes.
O Segredo do Licorne é uma animação belíssima, divertida, e com
aquele ritmo de ação e aventura característico de Spielberg (correria e
pancadaria com muito humor) em seus filmes meio família. Muita gente vai se
lembrar do intrépido Indiana Jones, mas
é bom que se diga: Tintim já era
intrépido muito antes do Indiana. As
características dos personagens de Hergé foram mantidas. Talvez haja algum
exagero na bebedeira de Haddock, mas
é dela e das trapalhadas de Dupond e Dupont que saem as melhores gags. A fantástica
abertura do filme em 2D já diz a que veio. Ou quase. O deslumbramento visual da
história que a segue, então, do primeiro ao último quadro, é indescritível. É difícil saber se o que envolve o espectador
é a excelência da narrativa de mistério ou os cativantes Tintim, Milu (espontâneos)
e Haddock (dramático).
Segundo
Hergé: “Sou eu, sob todas as formas!
Tintim, quando quero ser heróico, perfeito; os Dupondt, quando sou estúpido;
Haddock, sou eu quando tenho vontade de me exteriorizar.” O jornalista
perspicaz, com cara de adolescente e audácia de gente grande, que ganhou a
Bélgica em 10 de Janeiro de 1929, é um personagem que evoluiu à medida que o
seu autor adquiria conhecimento real da geografia, da história, do comportamento
sócio-político dos povos em todo o mundo. Alguns críticos e estudiosos ainda se
debruçam sobre as publicações, analisando histórias como Tintim no País dos Sovietes, Tintim
no Congo, Tintim na América, por
se acreditar que elas caracterizam uma ideologia fascista, colonialista, racista.
Bem, não deve ser fácil analisar obras de ontem com os olhos de hoje, num
contexto completamente diferente.
Polêmicas
à parte, a verdade é que, em pouco tempo, Tintim ganhou a Europa e, bem antes
de chegar a Steven Spielberg e Peter Jackson, a suas aventuras investigativas
ganharam o cinema e a televisão. Em 1947, Claude Misonne dirigiu a animação
belga, feita com marionetes, de O
caranguejo das tenazes de ouro. Nos anos 1960 foi a vez de duas adaptações
com atores: Tintim e o mistério do Tosão
de Ouro, dirigida por Jean-Jacques Vierne (1961), e Tintim e as laranjas azuis, por Philippe Condroyer (1964). Na
virada da década o jornalista aventureiro voltou ao mundo animado com Tintim e os prisioneiros do sol, longa
dirigido por José Dutillieu (1969), e Tintim
e o lago dos tubarões, por Raymond Leblanc (1972). A televisão popularizou
ainda mais o personagem. Entre 1958 e 1963 a Belvision produziu 104 episódios
animados de As Aventuras de Tintim, por
Hergé e, em 1991, a Ellipse Programmé (França) e a Nelvana (Canadá) lançaram
As Aventuras de Tintim, uma série em
39 capítulos que fez a alegria da criançada. Esta última série passou pela TV
Cultura e (re)estreia nesta sexta (20) no Canal Futura.
Em produções
desse porte é até redundante falar de tecnologia (de cair o queixo) na captura
digital de movimento, que tem em Andy Serkis (King Kong, Gollum, Cesar) um dos mestres na interpretação
com "motion capture", técnica
usada anteriormente (com eficiência) em animações como: O Expresso Polar (2004) e A
Lenda de Beowulf (2007), de Robert Zemeckis; A Casa Monstro (2006), de Gil Kenan; Marte Precisa de Mães (2011), de Simon Wells. E ou destacar o
bom uso da plataforma gráfica (e cenográfica) com um dos melhores
aproveitamentos do 3D. Resta saber se a animação que tem tudo para agradar os
fãs das HQs e seriados televisivos, continuará com a mesma qualidade na próxima
aventura com direção Peter Jackson. Enquanto isso não acontece é sentar e
curtir o ótimo passatempo (se possível em 3D).
Você estava nos meus arquivos e eu nos seus, re re. Bem, nos anos 70/80 eu ainda era um menino/adolescente andando descalço na beira do pantanal, então minhas vivências políticas são mais escassas que as suas. Mas me considero de esquerda, embora sem filiações partidárias. Simpatizo com pessoas ("quadros", como se diz nos partidos), por exemplo o Brizola Neto. Me considero mais que tudo um utopista. Acredito na necessidade, cada vez mais urgente, de superação do capitalismo e dos padrões de vida modernos em geral, como condição de sobrevivência da espécie. E por aí afora. Mas não acredito mais em transformações abruptas e forçadas, que se sobreponham à consciência das pessoas. Acho que um de meus próximos posts, sobre o Tio Patinhas, indica melhor esses "posicionamentos".
ResponderExcluirAliás, é minha deixa pra dizer que, apesar de não ser propriamente fã do Spielberg, estou ansioso pra ver Tintim, e acho que vou gostar, embora (ou justamente porque) não tenha gostado da única história que li dele. Pois é, entre os produtos da cultura de massa de que não posso deixar de gostar, os quadrinhos e a música estão em primeiro lugar, na frente até do cinema...
Abração e até a próxima!
A única semente, se num solo fértil, capaz de transformar
ResponderExcluiro homem é o cooperativismo.
Tintim, segundo Spielberg/Jackson é muito bacana,
acompanhava a série (repetitiva) da TV Cultura.
Gosto muito de HQs, já escrevi e desenhei algumas e também já fui cartunista. Há poucos anos me desfiz de uma boa Gibiteca.
Ainda estou me desfazendo de alguns volumes que reservei.
Abs.
Legal, hem? Queria ser cartunista quando pequeno, mas quando pedi o curso do IUB a apostila que veio foi de desenho técnico. Que gibis você tem à venda? Aliás, me diga isso por e-mail...
ResponderExcluirAbração e até mais ler!
Eu aprendi desenhando, por conta.
ExcluirNo primário estava sempre ilustrando
os meus cadernos,principalmente, de História.
Hora dessas lhe passo a lista.
Abs.
Pois é, eu tenha certo talento, mas precisava de algum estudo pra aprender detalhes: perspectiva, profundidade, sombreamento, essas coisas. Mas ainda gosto de rabiscar até hoje. Dia destes posto minha """obra-prima""", a caricatura do Pe. Benito, então diretor da escola em que eu estudava, num jornalizinho que quase me valeu a expulsão. E você, veja se posta as suas em algum lugar. Visitei seus outros blogs, vi os desenhos (em paint?) do Falas ao Acaso (gostei, e também dos poemas), mas nenhuma caricatura a tinta. Vc, pelo visto, poderia tranquilamente escrever uma boa autobiografia. (Não estou te chamando de velho, re re.)
ResponderExcluirAbração!
Bem, já fiz ilustrações para diversas publicações (jornais e livros),
ResponderExcluirtrabalhando com nankim e também com colagem.
As ilustrações de Falas ao Acaso variam.
Gosto de misturar técnicas(desenho, colagem, foto)
e de trabalhar alguns efeitos no photoshop.
Estou para criar um quarto blog para postar
o meu trabalho de artista plástico e ilustrador.
Obrigado por visitar os meu blogs.
Abração.
T+