quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Crítica: Fugitivo da Guilhotina

 

FUGITIVO DA GUILHOTINA

por Joba Tridente

links: textos em laranja 

Em cinema tudo é possível..., até mesmo a produção de um filme ser tão curiosa ou mirabolante quanto à trama apresentada. É o caso de Fugitivo da Guilhotina (The Man on the Eiffel Tower, 1949), que começou com direção de Irving Allen, “deposto” com a chantagem do Charles Laughton (deixar o elenco) a favor de Burgess Meredith, que assumiu a direção ao lado de Laughton (que dirigiu Meredith). Porém, como toda via das mágoas que corriam pelos estreitos da vingança desembocavam no entorno do produtor e diretor dispensado, Allen “não gostou” do resultado, comprou os direitos de distribuição da americana RKO Pictures e as cópias de Fugitivo da Guilhotina simplesmente sumiram nos labirintos de ninguém sabe e ninguém viu. Até que, magicamente, na década de 1980, o filme apareceu em VHS e duas cópias coloridas, em 35 mm e em péssimas condições, encontradas na propriedade de Meredith, serviram de base para a versão integral restaurada e lançada em DVD. Fugitivo da Guilhotina (primeiro filme americano rodado totalmente em cores em Paris, com o processo Ansco Color, para maximizar o impacto da fotografia e dar textura fiel às descritas na obra de Simenon) estreia dia 23/09/2021 no serviço de streaming Petra Belas Artes À LA CARTE, com mais quatro novos títulos*. 



Baseado no romance policial La Tête d'un homme (que já havia sido filmado em 1933, por Julien Duvivier), do escritor belga Georges Simenon,  o roteiro de Harry Brown, acompanha a quinta aventura do Inspetor Jules Maigret (Charles Laughton) às voltas com o nebuloso assassinato de duas mulheres. A sua investigação começa com a prisão de um suspeito (descartável) encontrado no local do crime: o amolador de facas míope Joseph Heurtin (Burgess Meredith). A seguir, com seu jeito relaxado (como se tivesse todo o tempo do mundo), o corpulento Maigret apura o faro em quatro prováveis suspeitos esvoaçando por Paris: Bill Kirby (Robert Hutton), sobrinho e herdeiro da Sra. Henderson, a idosa rica, morta ao lado da empregada; Helen (Patricia Roc), a mulher de Bill; a loira fatal Edna (Jean Wallace), amante de Bill; o ambíguo ex-estudante de medicina Johann Radek (Franchot Tone), um sujeito muito bem informado sobre os assassinatos e os demais suspeitos. Os quatro estão atrás de uma boa grana e uma vida mansa..., mas quem teria sangue frio para matar duas mulheres na calada da noite? Foi um crime encomendado, premeditado, ou casual? 

Eu estou te seguindo ou você está me seguindo?”. 


Pontuado por algumas cenas (rápidas: piscou, perdeu) de humor nonsense, como a do Café Aux 2 Magots, onde um filósofo, vestindo túnica greco-romana,  e seu séquito se levantam de onde estão e passam batido em frente à câmera (antecipando situações análogas nos filmes franceses, com suas indefectíveis discussões sociopolíticas acaloradas..., e civilizados triângulos amorosos), Fugitivo da Guilhotina, com atores americanos e ingleses, é um filme que, não dificulta a vida do espectador, desvela antes da metade da narrativa quem é o assassino. Bom, essa é a parte fácil, resta saber qual a sua ligação com outros personagens suspeitos e como provar a sua culpa..., já que ele é inteligente, manipulador e se move com ousadia, se aproximando do Inspetor e criando inúmeras situações que tanto o aproxima quanto o afasta da cena do crime. Acontece que, nesse astucioso jogo de gato e rato, entre a lei e a desordem, além de saber blefar, Jules Maigret também gosta de dar corda para criminoso se enforcar (ou, nesse caso, seria metal para guilhotinar?).   


A princípio é estranho ver um núcleo de personagem se comunicando apenas em inglês, em Paris (ainda que, segundo Hollywood, no universo inteiro se fala o inglês americano), mas, superado o espanto, Fugitivo da Guilhotina (coprodução USA/França) é um suspense que se vê com interesse e alguma aflição. Há um bom equilíbrio no andamento do enredo razoável e, embora padronizado, a composição dos personagens é aceitável. O elenco está em boa forma e o brilhante ator Burgess Meredith acaba dando conta do recado na sua primeira (de duas) direção. 

Enfim, o thriller Fugitivo da Guilhotina, às vezes classificado como film noir, inclui nos créditos de elenco na abertura, a cidade de Paris..., mas deveria incluir também a Torre Eifell, presente em momentos decisivos. Ambas registradas com maestria, pelo cinegrafista Stanley Cortez, em sequências espetaculares de perseguição por ruas, becos e telhados (!) de uma Paris sempre fotogênica. A sequência final na Torre Eifell, com edição notável, é de tirar o fôlego. De provocar vertigem. E pensar que o drone câmera não era nem ficção naquele tempo. 


NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha. 

Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


*estreias

Petra Belas Artes À LA CARTE 


GUERRA AO TERROR

(Hurt Locker)

EUA, 2008, Drama, 131 min, 14 anos

Direção: Kathryn Bigelow

Elenco: Jeremy Renner, Anthony Mackie, Brian Geraghty

Sinopse: JT Sanborn, Brian Geraghty e Matt Thompson integram o esquadrão antibombas do exército americano em missão no Iraque. Eles trabalham na destruição de um explosivo, para que seja detonado sem atingir alguém. Entretanto, um erro faz com que o artefato exploda e mate Thompson. Em seu lugar é enviado o sargento William James, que possui muito sangue-frio, o que incomoda Sanborn. Apesar disto, o trio segue na ativa, tendo consciência de que cada dia concluído de trabalho é um dia a mais de vida.

Curiosidades: Com este filme Kathryn Bigelow entrou para a história como a primeira mulher a conquistar o Oscar de Melhor Direção, na premiação em que seu ex-marido James Cameron também disputava na mesma categoria por Avatar. Com quase 200 horas de filmagem no total, o longa teve ainda várias câmeras super 16 mm para captar cenas em estilo documental. A diretora escalou os atores Jeremy Renner, Anthony Mackie e Brian Geraghty pelas suas excelentes atuações em Dahmer (2002), Half Nelson: Encurralados (2006) e Soldado Anônimo (2005), respectivamente.

 


Q & A, SEM LEI, SEM JUSTIÇA

(Q & A)

EUA, 1990, Crime, 132 min, 16 anos

Direção: Sidney Lumet

Elenco: Nick Nolte, Timothy Hutton, Armand Assante

Sinopse: Um jovem promotor público está tentando juntar provas para incriminar um detetive de polícia com indícios de corrupção. Para isso, ele terá de se aproximar da ex-amante do seu superior e seu novo companheiro - um grande chefe do crime organizado.

Curiosidades: Jenny Lumet, atriz que interpreta a personagem Nancy Bosch, é filha do diretor Sidney Lumet. No camarim do clube gay onde o personagem Bobby Texador (Armand Assante), sua esposa e guarda-costas se encontram com Roger Montalvo (Paul Calderon), aparece escrito "I Love Paul C." no quadro de mensagens logo atrás de Montalvo, uma referência carinhosa e bem-humorada ao ator porto-riquenho Paul Calderon. A filmagem, que durou apenas um mês, teve uma cena com Nick Nolte e Timothy Hutton num bar, que foi filmada no interior do lendário clube CBGB, em Nova York, embora não apareça o nome do lugar na antiga fachada.

 


REGRAS NÃO SE APLICAM

(Rules Don't Apply)

EUA, 2016, Comédia | Romance, 127 min, 14 anos

Direção: Warren Beatty

Elenco: Lily Collins, Haley Bennett, Taissa Farmiga, Warren Beatty

Sinopse: 1958. O longa acompanha a história de amor entre Marla Mabrey, uma jovem atriz religiosa, e seu motorista, Frank Forbes. Mas o relacionamento é proibido pelo chefe deles, o excêntrico aviador e produtor de cinema Howard Hughes.

Curiosidades: Regras Não se Aplicam é o quinto filme dirigido pelo consagrado ator Warren Beatty, realizador de O Céu Pode Esperar (1978), vencedor do Oscar de Melhor Direção de Arte, e Reds (1981), pelo qual ele levou o Oscar de Melhor Direção. Durante as filmagens, o ator nova-iorquino Matthew Broderick morou na casa de hóspedes do diretor Warren Beatty, na Califórnia. Na cena em que Marla (Lily Collins) e Lucy (Annette Bening) dividem o banco de trás de um carro, grande parte do diálogo é improvisado.

 


ANTONIO MENESES

CAMERA E O VIOLONCELO

Brasil, 2014, Documentário, 52min

Direção: Pedro Antônio Paes

Elenco: Antonio Meneses

Sinopse: O documentário segue a vida do violoncelista Antonio Meneses (célebre virtuose brasileiro) nos 10 dias que antecedem uma grande apresentação em Paris: o concerto Nº2 de Villa-Lobos, com a Orquestra de Radiodifusão Francesa. O filme passa por lugares simbólicos como: Rio de Janeiro, na casa da infância; Basel na Suíça, sua residência; Berna, local do Conservatório de Música onde é professor; Lausanne, casa do luthier; Genebra, local do seu escritório; e finalmente, Paris, e a apresentação.

Curiosidades: Documentário sobre Antônio Meneses, um dos maiores instrumentistas brasileiros de todos os tempos, que, aos 17 anos, ganhou o prêmio Tchaikovsky, o mais importante para seu instrumento, o violoncelo.

 

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