Os Guardiões
por Joba
Tridente
Super-Herói é coisa séria, mas só de brincadeira. Ou
quase..., já que alguns foram criados com “más” intenções lá pras bandas da
Terra do Tio Sam, onde a maioria vive dividida em dois territórios, Marvel e
DC, e em constante pé de guerra. No entanto, o que não querem que você, um
aficionado por hqs, saiba é que uma minoria de super-heróis, praticamente
desconhecida do grande público leitor, vive espalhada pela Europa, Ásia, América
Latina, onde foi criada, e nem sempre suas hqs conseguem cruzar as fronteiras.
Cada país tem a sua “liga” de justiceiros, mas dificilmente vão fazer frente ao
imperialismo da matriz norte-americana.
Teoria da Conspiração, é? Ora, um balãozinho de
repetidos “K” pra você. Teoria da Conspiração! Então me explica como é que até
alguns meses atrás, pessoa alguma, fora (ou dentro!) do império russo, jamais tinha
ouvido falar da secretíssima equipe Os
Guardiões, forjada na quentura da Guerra Fria e, como ficou meio tostada,
foi deixada de lado e agora, devidamente customizada, está chegando para enviar
os vilões para o lixão? Explica!
As ironias (chistes) acima são apenas para você saber
que, se for assistir ao aguardadíssimo Os
Guardiões, e decidir vestir um traje DC, social e sisudo, em vez de um traje
Marvel, esportivo e divertido, vai quebrar a cara, porque este é um daqueles
filmes de ação que (involuntariamente?) nascem com predisposição para o trash. A começar pela cópia, com a estranha
dublagem (sem sincronia e fora do tom) e duvidosa tradução norte-americanas.
Mas, se é o que temos, manda pra escanteio e dá-lhe pau, que a diversão na
montanha russa dos genéricos vai começar!
Os Guardiões
(Zashchitniki, 2017), dirigido pelo esforçado
e bem intencionado russo-armênio Sarik
Andreasyan, baseado no roteiro pra lá de trivial de Andrey Gavrilov, na atual
conjuntura narrativa e digital estadunidenses, é daqueles filmes que você ama de paixão e ou odeia com razão. Depende do seu humor e
vivência com o nicho trash no cinema
e nas hqs. Pelo mundo afora, raros foram os críticos que descobriram, logo no
primeiro ato, que não levar a sério um filme de super-herói russo que se leva a
sério seria muito mais divertido do que o contrário. Muito menos estressante. Portanto,
fique atento, você pode chorar de rir (que é o melhor a se fazer) ou chorar de
raiva (perda de tempo que não vai trazer o valor do ingresso de volta).
Então, chega de blá! blá! blá! e vamos logo pro ká! ká!
ká! Conta-se que em plena Guerra Fria (EUA x URSS - 1947-1991), o cientista
russo Avgust Kuratov (Stanislav Shirin), à frente do programa
de segurança nacional Patriot, fazendo
uso da manipulação genética em voluntários (?) de algumas das nações que
formavam a União Soviética, criou uma geração de mutantes com superpoderes. Com
o passar do tempo, sem qualquer ação prática (já que cada um dos impérios ficou
se coçando no seu lado), o projeto foi encerrado e as aberrações humanas foram “dispensadas”
do serviço (que nunca prestaram).
Nos dias de hoje, o desiquilibrado Avgust, vítima maligna do próprio
experimento, reapareceu para se vingar da Mãe Rússia, se apossando do país. Com
as forças armadas desfalcadas, a única saída é convocar os autoexilados mutantes
do bem para combater o mutante do mal..., desde que se saiba onde encontrá-los,
na desunião soviética. É hora da Major
Elena Larina (Valeriya Shkirando)
e seu um dedicado grupo de internautas mostrarem serviço: Lernik (Sebestien Sisak),
capaz de controlar pedras para usar como armas e ou exoesqueleto, medita na
Armênia; Khan (Sanzhar Madiyev), com sua velocidade extrema e cimitarras afiadas, presta
serviços no Cazaquistão; Ursus (Anton Pampushnyy), que se transforma
parcial ou totalmente em urso, se
esconde na Sibéria; Xenia (Alina Lanina), que domina a água e a invisibilidade,
trabalha num circo em Moscou. Ah, esses criadores russos e suas analogias.
Se você não quiser estragar a diversão, não queira
saber muito mais das habilidades e das ações (em grupo ou individualmente) destes
super-heróis que só farão jus à identidade de Guardiões quando trabalharem juntos e (desnecessariamente)
uniformizados pela primeira vez. Graficamente, as imagens de Khan e suas cimitarras é o que melhor se
enquadra na telona, mas o mais divertido e o meu favorito é o Ursus, principalmente quando totalmente
transformado (e equipado!!!). Animal!
Se você for quadrinhófilo, com toda certeza, vai
ficar o tempo todo questionando: - Mas
este super-herói não lembra aquele super-herói norte-americano do território alegre e ou do
território triste? Claro que lembra! Assim como os heróis de uma editora
lembram o de outra! E mais, você verá a releitura constrangedora de uma das cenas
mais icônicas do Universo DC, que já foi até capa de hq e está presente no pior
filme do Batman de todos os tempos, o
abominável Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge
(2012)..., e se não rir, ao menos vai dizer: Uau! Até tu, Avgust?!
Quanto aos furos, não são muitos maiores e nem muito
menores do que os que pululam nos filmes da Marvel e ou da DC. Já quantos aos
efeitos especiais..., bem, verdade não seja escondida atrás da Cortina de
Ferro, as explosões e os ataques terroristas em Moscou e arredores, não são
exatamente espetaculares e tem outros detalhes curiosamente pontuados, na
capital russa, que é melhor você descobrir (ou se espantar) por conta própria. Nada
de spoiler aqui! Nesse mundo de
entretenimento ninguém é perfeito! E no outro?
Enfim, o quê esperar de um filme cujo título Os Guardiões aparece duas vezes na
telona? Ou que os atores atuam como se estivessem num drama teatral? O humor
involuntário e trash de tudo (enredo,
efeitos especiais, diálogos) vem exatamente dessa seriedade russa querendo drama
num script genérico que pende (o
tempo todo) para uma graciosa (e não assumida!!!) paródia ao heroico imperialismo
norte-americano. Quem abarcar, log0 de primeira, esse vento norte que sopra
contemporaneidades da Eurásia vai dar boas risadas e se lembrar também dos mockbusters da The Asylum. É capaz até
de se emocionar com o discurso clichê de um dos super-heróis: “Os pais não deveriam enterrar os seus filhos!”. Ou com o lamento do vilão: "Vocês não podem me destruir. Eu criei vocês!". Ó dor!
Os Guardiões
foi lançado pensando em rendosa franquia mundial. Material pra isso os
realizadores tinham, ao criar (do “nada”) personagens interessantes e “originais”,
típicos de histórias em quadrinhos estadunidenses (num país sem tradição de hq),
para exploração cinematográfica e de bonecos de ação (além de outros derivados).
Porém, vacilos no roteiro, direção, efeitos especiais precários, indefinição de
público (?) e mercado podem ter colocado tudo a perder. Uma vez que o retorno
da crítica e dos espectadores ficou aquém do esperado, não se tem certeza se a
parceria com os produtores chineses, para a parte dois (sugerida no
pós-créditos), realmente será concluída. Caso aconteça, acredito que muitos dos
problemas técnicos e equívocos serão superados.
Assim, se tiver interesse em conhecer este quarteto típico
(onde um dos heróis tem a força e a fúria do animal símbolo da Rússia: Ursus), tente esquecer o padrão (matriz)
norte-americano do gênero e embarque numa aventura que, embora genérica, tem alguns
bons momentos de ação (violenta ou moderada) e muito humor involuntário até na
telenotícia final (se é que ela não é uma armação dos tradutores americanos).
Não sei ate onde vai a liberdade de expressão na atual ditadura russa, mas se Andreasyan
tivesse um jogo de cintura melhor, um roteirista mais devorador de hqs (para entender
profundamente a psicologia dos vilões e dos mocinhos) e um elenco mais
espontâneo, arrebentava a boca do balão.
Em 2004, quando lançou o seu inesperado blockbuster
russo Guardiões da Noite, ganhando
fama internacional, Timur Bekmambetov falou da dificuldade em convencer atores
e atrizes a participarem do seu filme. O elenco também falava do desconforto em
atuar em uma obra fora dos padrões locais. Tive esta mesma sensação assistindo
ao Os Guardiões..., um filme que parece se
desenvolver pisando em ovos russos e em ovos americanos. Quais quebrarão primeiro? Por
mim, já teria feito uma boa omelete!!!
Nota: Após
as ironias sobre super-heróis russos, nos primeiros parágrafos, pesquisando
sobre histórias em quadrinhos na Rússia, descobri estas curiosidades: Quadrinhos
Russos e Festival de HQ Russa. No site Formiga
Elétrica além de material sobre a hq russa Major Grom encontrei o link do ótimo curta-metragem (28 min)
homônimo, no melhor estilo/humor Marvel, para apresentar o personagem Major Grom. Ansioso para assistir a versão em longa-metragem do herói!
*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de
idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo),
em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista
e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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