Uma
Família Feliz
por Joba Tridente
Uma vez que as animações que estreiam por aqui são
dubladas em português (até por celebridades), poucos são os espectadores que se
dão ao trabalho de saber a origem delas..., possivelmente imaginando que, por conta
do título e trilha sonora em inglês, só podem ser made in USA. Outra contribuição ao equívoco é que, diferente das
animações asiáticas, principalmente a japonesa, não é fácil para a criançada
(público alvo) ou mesmo adulto distinguir alguma originalidade nos traços e
conteúdos das produções europeias e latinas que, por questão de mercado,
procuram se aproximar cada vez mais da “matriz”. Como, por exemplo, o curioso
desenho animado alemão Uma Família Feliz
(Happy Family, 2017), baseado no
best-seller homônimo do premiado escritor e roteirista David Safier.
O enredo de Uma
Família Feliz, dirigido por Holger
Tappe, a partir da levíssima adaptação da novela, feita pelo próprio Safier
e Catharina Junk, gira ao redor da disfuncional família Wishbones (Wünschmann, no
original), formada por Emma, que tem
uma livraria dispendiosa, Frank, escriturário que
cumpre horas extras, Fay,
a filha adolescente rebelde sem causa, e Max,
o caçula nerd. Certa de que os Wishbones precisam urgentemente discutir
a relação, Emma decide levar a estressada
família a uma festa à fantasia. Porém, por conta de um apaixonado e galanteador
Drácula, a família dá de cara com a
bruxa Baba Yaga e cada um deles é
transformado no personagem que veste: Emma
em Vampira, Frank em Frankenstein, Fay em Múmia e Max em Lobinho. Daí, na caçada à bruxa, para reverter o feitiço,
cada um enfrentará, em situações hilárias, seus próprios demônios: crise de
identidade, medo, agressividade, relacionamentos, bullying, assédio, estudo...,
no que chamamos de jornada do herói.
A mistura bem humorada de mitos europeus de Contos de
Fadas (Baba Yaga) e de Contos Góticos
(Vampiros, Lobisomem, Múmias, Frankenstein) dá a Uma Família Feliz ingredientes sólidos para o desenvolvimento de uma
paródia repleta de ação e aventura e romance numa trama (terrir) que diverte
educando a criançada e alertando os adultos sobre a possessividade nos
relacionamentos amorosos e familiares. O que vai fazer muito espectador repensar
seus conceitos é a motivação do “vilão” Drácula
para o seu grande “ato de vingança” contra a humanidade. É algo até banal, entre
homens e mulheres, mas doentio e na medida para sessão de psicanálise.
Com notáveis referências ao seriado americano Os Monstros (1964-1966) - onde Lily, a matriarca, é Vampira, o seu marido Herman é Frankenstein e o filho Eddie
é Lobinho - e (inclusive nos traços) aos
ótimos Hotel
Transilvânia 1 (2012) e Hotel
Transilvânia 2 (2015), o roteiro alterna assuntos adultos e infantojuvenis,
em linguagem simples e de fácil compreensão para qualquer espectador. Apesar do
tema “lúgubre”, Uma Família Feliz é engraçado,
as gags são legais, e a edição é muito boa. Por falar em humor, nem todo mundo
vai gostar da piada escatológica (ao gosto dos americanos), mas muita gente vai
rir de uma cena pastelão inspirada na briga entre um mal-humorado super-herói
verde e um egocêntrico vilão espacial, no filme Os Vingadores (2012).
Embora reconhecíveis de outras produções (ou por isso),
os velhos personagens que desfilam jovialidade na saga de Uma Família Feliz, podem ser visto como se (atores) estivessem
representando um novo texto, numa história contemporânea. Entre as figuras mais
interessantes estão a impagável Múmia do
Faraó Imhotep (que rouba todas as
cenas), as adoráveis Baba Yaga e hippie Cheyenn e
o charmoso “vilão” Drácula. Aliás, as sequências das Múmias (Imhotep e Fay) no deserto são antológicas.
A direção de arte é bastante observadora na paleta de
cores. Indo na contramão dos coloridíssimos filmes infantis, opta por tons mais
naturais e que variam conforme o segmento vivido pelos personagens na cidade,
no deserto e ou no fantástico castelo futurista do sedutor Drácula. Afinal, é um filme de monstros disfuncionais e não de
graciosos duendes.
Enfim..., ressaltando a ironia do título Uma Família Feliz, já que, na verdade, o
que salta aos olhos é o cotidiano de uma família infeliz precisando desesperadamente
encontrar a felicidade..., ainda que o seu alvo seja o entretenimento juvenil, esta
é uma daquelas animações que podem surpreender o público adulto por causa do conteúdo
familiar bem intencionado e, por vezes, ousado subtexto, ao tratar de relações
conjugais. O seu estilo pode até não ser dos mais originais (ao apostar nas referências televisivas e cinematográficas), mas apresenta uma excepcional
qualidade gráfica e um convincente 3D de profundidade e de avanço sobre a plateia.
Um espetáculo com belas metáforas para toda a família refletir sobre seus
próprios percalços.
*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de
idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo),
em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista
e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
Saudações submissas!
ResponderExcluirAdorei vir aqui e ler esta crítica ótima. Muito bom ter uma página que instrua aos leitores nos assuntos da sétima arte. De minha parte, agradeço a tudo que me traga conhecimento. Por isso, gostaria muito de colocar na nossa página "Artes" um selo do "Claque ou Claquete" e divulgar seu blog.
Abraço e sucesso sempre!
{W_[amar yasmine]}
..., olá, {W_[amar yasmine]}, grato pela visita e considerações. ..., fique à vontade para colocar um link do Claque ou Claquete no seu site de "Arte". ..., na lateral estão três links para os meus blogs Falas ao Acaso (literatura), Lixo Que Vira Arte (Arte Sustentável) e Afetos Culturais (Oficinas Culturais) e em qualquer um deles você encontra um link do Claque ou Claquete. ..., grande abraço e seja sempre bem-vinda!!!
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