Os títulos em português brasileiro para obras (principalmente)
cinematográficas é matéria para as mais diversas teorias (da conspiração?) na internet.
Eu mesmo já comentei em outras ocasiões sobre esta ignóbil mania (estraga
prazeres) que estupidifica o espectador com seu spoiler e ou por ter nada a ver com o assunto..., como é o caso do Perdido em Marte, versão livre de The Martian (O Marciano), do romance escrito por Andy Weir e que inspirou o sci-fi homônimo de Ridley Scott. Pra
começo, meio e fim de conversa, o astronauta Mark Watney, de Matt Damon, não está “Perdido em Marte”, se muito, foi “Deixado em Marte”. O título
original não é mero capricho e ou achismo do autor, está muito bem inserido e
justificado, com ironia, na história.
Perdido em Marte (The Martian, 2015) gira ao
redor do astronauta e botânico norte-americano Mark Watney (Matt Damon)
que, durante uma tempestade de areia, ao ser atingido por detritos e perder a
consciência, é dado como morto e deixado em Marte, pela tripulação da Nave Hermes.
Ao recobrar a consciência, ferido e a milhões de quilômetros de qualquer outro
ser humano, mais que se lamentar, ele decide que vai viver pelo maior tempo
possível. Usando sem moderação (e modéstia) o seu conhecimento de botânica e de
matemática, no consumo balanceado do alimento disponível no Laboratório Hab, ele calcula que terá
uma sobrevida de uns dois anos. E mais, certo de que, mesmo que a Agência
Espacial descubra que está vivo, não haverá tempo hábil para um resgate, se põe
a gravar um diário, registrando em vídeo o seu progresso (Nem sei quem vai ler isto. Acho que alguém
vai acabar encontrando. Talvez daqui a cem anos. Que fique registrado: não
morri em Sol 6. O restante da tripulação certamente achou que eu tivesse
morrido, e não posso culpá-los. Talvez decretem um dia de luto nacional em
minha homenagem e minha página na Wikipédia vá dizer: “Mark Watney foi o único
ser humano que morreu em Marte.” E, provavelmente, isso estará correto. Porque,
sem dúvida, vou morrer aqui. Só que não em Sol 6, como todo mundo está achando.,
tradução de Marcelo Lino para a edição
brasileira da Arqueiro)..., até que
acaba encontrando uma forma de se comunicar com a Terra, causando surpresa e suspense
na NASA.
Assim uma
fantástica corrida contra o tempo se inicia. Enquanto em Marte, o botânico faz
valer a sua formação acadêmica, usando a ciência (real) para resolver questões
relacionadas à sua sobrevivência (produção de água e de alimento), na Terra os
cientistas da NASA esmiúçam a física para encontrar uma forma de resgatá-lo com
vida.
Dirigido com
vigor por Ridley Scott, que há muito
devia um entretenimento de excelência ao seu público, Perdido em Marte é uma ficção científica literalmente engenhosa (ou
seria literalmente científica?), principalmente por conta de seu simpático
protagonista Mark Watney (“Se
o oxigenador quebrar, vou sufocar. Se o reaproveitador de água quebrar, vou
morrer de sede. Se o Hab se romper, vou explodir. Se nada disso acontecer, vou
ficar sem alimento e acabar morrendo de fome. Então, é isso mesmo. Estou
ferrado.”), num show arrebatador de Matt Damon.
O roteiro de
Drew Goddard é cativante, divertido e plausível na sua “decupagem” nerd, meio que uma
longa e bem-humorada palestra sobre os percalços (?) da fascinante exploração
espacial que nos aguarda num futuro próximo. Fiel à linha da elogiada
pesquisa científica que norteou romance homônimo de Weir, passa ao largo da
pretensiosa (e inócua) especulação metafísica de Interestelar
(2014) de Christopher Nolan, onde Damon fazia o papel (sem pé nem cabeça) de Mann, um astronauta psicopata “à espera
de resgate” num planeta gelado e inóspito (ou seja, do gelo inconsistente para
a caldeirinha consciente).
A trama, que
acaba se dividindo em três núcleos distintos de ação (Marte, NASA, Nave Hermes),
não está interessada na ciência especulativa, mas na ciência prática que (sem
pieguice e ou lição de moral) pode resolver questões cruciais para o
desenvolvimento e sobrevivência da humanidade (na Terra ou no Céu). Mas, fique
tranquilo(a), a gente absorve facilmente as razoáveis explicações científicas e
fica até tentado a dar sugestões..., ou estudar com mais afinco a matéria.
O grande trunfo
de Perdido em Marte, cujo argumento
pode até soar banal (a história de um resgate), está na condução da narrativa que
começa como drama leve (?) da persona esperançosa (mas conformada) do engraçado
astronauta Mark, vai ganhando corpo e
emoção e quando menos se espera, envolve o espectador num suspense inquietante
que o deixa antenado até a última cena. É impossível não torcer pelo simpático e
solitário botânico, com suas ironias e reflexões (diante de um crucifixo de
madeira, por exemplo) a milhas e milhas e milhas do Planeta Azul. Ou ficar
indiferente às decisões burocráticas e técnicas dos cientistas da NASA a milhas
e milhas e milhas do Planeta Vermelho.
Perdido em Marte é um filme sublime. Inspirador! O seu elenco, de ótima safra (Chiwetel Ejiofor, Jeff
Daniels, Jessica Chastain, Donald Glover, Sean Bean, Kristin
Wiig, Benedict Wong, Sebastian Stan, Kate Mara, Michael Peña), capitaneado pelo irretocável Matt Damon, dá o seu
melhor..., até mesmos os menos coadjuvantes se destacam nas performances. Sequências
impressionantes, bons diálogos (ou monólogos comoventes!), efeitos especiais de
qualidade, montagem caprichada, trilha “disco music” para os nostálgicos, com
direito ao bônus da contagiante glam rock Starman,
de David Bowie..., fecham o belo pacote. Imperdível!!!
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