segunda-feira, 5 de março de 2012

Crítica: Drive


Drive (Drive, EUA, 2011), de Nicolas Winding Refn, é um dos filmes mais econômicos (em verba e verbo) da temporada. Pelo menos na primeira parte, já que na segunda, as imagens de violência são mais gritantes que qualquer diálogo de ocasião. O thriller, baseado no livro homônimo de James Sallis  e com roteiro de Hossein Amini, tem intrigantes planos longos e silêncios perturbadores, bela e discreta trilha sonora (ou algum ruído musical), características do jovem diretor dinamarquês, que não abre mão da (gratuita) violência explícita, explorada de forma radical no estranhíssimo (e Dogmático!) Valhalla Rising (2009), cujo protagonista é mudo e os coadjuvantes mal abrem a boca. Outra curiosidade é que há uma inversão de ação e reação entre os dois, a sanguinolência que principia em um, conclui (parecida: dilacerações, cabeça arrebentada, vísceras expostas) no outro. Valhalla termina metafísico, e Drive começa introspectivo.

2011 foi um ano de homenagens ao cinema mudo e de protagonistas monossilábicos, feito o driver (Ryan Gosling) de Drive. Ele, no melhor estilo James Dean, não tem passado (que se saiba), seu presente é quase de total ausência e seu futuro uma corrida de surpresa. Pode se dizer que o sujeito (que entra em cena praticamente mudo e sai calado) é um “motorista de horas vagas”. Ou melhor, que ele é mecânico, mas também motorista-dublê de filmes de ação e motorista-cúmplice de marginais que cometerem os seus crimes em 5 minutos. Hábil no volante e nos disfarces, no entanto, ao se envolver cordialmente com a garçonete Irene (Carey Mulligan) e seu filho Benício (Kaden Leos) e com Standard Gabriel (Oscar Isaac), o marido dela, a sua vida, pautada pela discrição, começa a borbulhar mais que água no radiador. Seja por instinto paternal e ou necessidade familiar (algum trauma?), o driver se vê obrigado a deixar de ser uma sombra esquiva (um dublê na vida e na arte), quebrar as suas próprias regras e afrontar quem quer ferrar o seu parachoque amigo.


Drive é um filme que começa muito bem e muito bonito. Seu drama minimalista e envolvente, em tudo (diálogo, fotografia, enquadramentos, trilha, personagens), lembra o bom cinema europeu. As interpretações são magníficas. São muitas a leituras possíveis sobre a solidão, a espera, a amizade, a inocência, as escolhas, as máscaras de cada um. Mas, de repente, Refn parece acordar de um ótimo sonho para reconhecer (?) que a trama é “romântica” demais, não é desastrosa, não é americana, não vai atingir o seu público fiel, e, então, trata logo de furar o carburador narrativo. Ai, a excelência vaza fluidos por todos os buracos, até terminar numa sequência (premonitória?) popularizada pelas recentes produções do Sherlock Holmes. Assim como nas aventuras do famoso detetive inglês, o futuro de driver torna-se previsível. O melhor seria que não!

Drive acontece conforme a expectativa e o envolvimento do espectador com a história simples (mas contundente) e ou com seus dramáticos personagens fora de compasso, quase vegetativos. Os que gostam do bom cinema vão preferir a primeira parte. O mais chegados na gratuidade da ação-clichê vão se extasiar com o motor envenenado da segunda. A injeção de adrenalina aqui não tem a ver com a correria automobilística costumeira do cinema norte-americano. Pois, mesmo se tratando de um vingativo driver (que ironia!), a violência é, digamos, mais privada (... é melhor viver dez anos a mil, do que mil anos a dez/decadence avec elegance, já dizia o Lobão). Nicolas Refn é tão talentoso que tropeça..., mas não cai.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...