Drive (Drive, EUA,
2011), de Nicolas Winding Refn, é um
dos filmes mais econômicos (em verba e verbo) da temporada. Pelo menos na
primeira parte, já que na segunda, as imagens de violência são mais gritantes
que qualquer diálogo de ocasião. O thriller, baseado no livro homônimo de James
Sallis e com roteiro de Hossein Amini, tem intrigantes planos longos e
silêncios perturbadores, bela e discreta trilha sonora (ou algum ruído musical),
características do jovem diretor dinamarquês, que não abre mão da (gratuita) violência
explícita, explorada de forma radical no estranhíssimo (e Dogmático!) Valhalla Rising (2009), cujo
protagonista é mudo e os coadjuvantes mal abrem a boca. Outra curiosidade é que
há uma inversão de ação e reação entre os dois, a sanguinolência que principia
em um, conclui (parecida: dilacerações, cabeça arrebentada, vísceras expostas) no outro. Valhalla termina
metafísico, e Drive começa
introspectivo.
2011 foi
um ano de homenagens ao cinema mudo e de protagonistas monossilábicos, feito o driver (Ryan Gosling) de Drive. Ele,
no melhor estilo James Dean, não tem passado (que se saiba), seu presente é
quase de total ausência e seu futuro uma corrida de surpresa. Pode se dizer que
o sujeito (que entra em cena praticamente mudo e sai calado) é um “motorista de
horas vagas”. Ou melhor, que ele é mecânico, mas também motorista-dublê de
filmes de ação e motorista-cúmplice de marginais que cometerem os seus crimes
em 5 minutos. Hábil no volante e nos disfarces, no entanto, ao se envolver cordialmente
com a garçonete Irene (Carey Mulligan) e seu filho Benício (Kaden Leos) e com Standard
Gabriel (Oscar Isaac), o marido
dela, a sua vida, pautada pela discrição, começa a borbulhar mais que água no
radiador. Seja por instinto paternal e ou necessidade familiar (algum trauma?),
o driver se vê obrigado a deixar de ser uma sombra esquiva (um dublê na vida e
na arte), quebrar as suas próprias regras e afrontar quem quer ferrar o seu
parachoque amigo.
Drive é um filme que começa muito bem e muito bonito. Seu drama
minimalista e envolvente, em tudo (diálogo, fotografia, enquadramentos, trilha,
personagens), lembra o bom cinema europeu. As interpretações são magníficas. São
muitas a leituras possíveis sobre a solidão, a espera, a amizade, a inocência, as
escolhas, as máscaras de cada um. Mas, de repente, Refn parece acordar de um ótimo
sonho para reconhecer (?) que a trama é “romântica” demais, não é desastrosa,
não é americana, não vai atingir o seu público fiel, e, então, trata logo de furar
o carburador narrativo. Ai, a excelência vaza fluidos por todos os buracos, até
terminar numa sequência (premonitória?) popularizada pelas recentes produções
do Sherlock Holmes. Assim como nas
aventuras do famoso detetive inglês, o futuro de driver torna-se previsível. O melhor seria que não!
Drive acontece conforme a expectativa e o envolvimento do
espectador com a história simples (mas contundente) e ou com seus dramáticos personagens
fora de compasso, quase vegetativos. Os que gostam do bom cinema vão preferir a
primeira parte. O mais chegados na gratuidade da ação-clichê vão se extasiar
com o motor envenenado da segunda. A injeção de adrenalina aqui não tem a ver
com a correria automobilística costumeira do cinema norte-americano. Pois, mesmo
se tratando de um vingativo driver (que
ironia!), a violência é, digamos, mais privada (... é melhor viver dez anos a mil, do que mil anos a dez/decadence avec
elegance, já dizia o Lobão). Nicolas Refn é tão talentoso que tropeça...,
mas não cai.
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