por Joba Tridente
Começo as minhas considerações ao documentário Nazinha, Olhai Por Nós,
citando informações dos seus créditos finais: Com 812.000 detentos, o Brasil
tem a terceira maior população carcerária do mundo. 40% dos detentos foram
presos antes do julgamento e ainda aguardam a sentença. Deste plural, o
filme foca na singularidade de quatro casos envolvendo detentos das prisões
masculina e feminina de Belém do Pará.
Dirigido por Belisário Franca (Menino 23; Soldados do Araguaia; O Paradoxo da Democracia), que dividiu o desenvolvimento do roteiro com Ismael Machado e Yan Motta, Nazinha, Olhai Por Nós acompanha a fala, o desabafo, a confissão de quatro detentos (e de alguns familiares seus) à espera do benefício de saída temporária para celebrar o Círio de Nazaré: Julio (vários crimes), Everaldo (drogas), Neuza (acusada de assassinato) e Raissa (envolvimento com traficante de drogas). Quatro parágrafos e uma referência: Nazinha (Nossa Senhora de Nazaré), cuja cerimônia religiosa, reúne milhares de pessoas, numa onda gigantesca de gratidão e fé...
Ainda que as “imagens (subliminares?) em segundo plano” angustiem o espectador, o documentário não trata da situação dos ambientes carcerários na ressocialização dos prisioneiros, mas das particularidades sociais e religiosas dos quatro detentos (em particular) que tentam justificar ou buscar justificativa para as suas privações de liberdade e o apego à fé à Nazinha. É difícil imaginar que, num lugar onde muitos prisioneiros são esquecidos pela própria família..., para não dizer que estão ali abandonados apenas pela morosíssima justiça (brasileira?)..., algum preso se apegue à fé (que move montanhas) para abrir as grades da cela na esperança de uma nova vida em sociedade. Esperança que, na maioria das vezes, alimentada pelo vício criminoso, mal dá uma volta no círculo vicioso da marginalidade. Porém, contrariando a opinião formada, amparados pelo bom comportamento no cativeiro, pelo cumprimento de parte da pena e (ao menos aparentemente) pelo voto de religiosidade, alguns cativos conseguem ser agraciados com o benefício de saída temporária para celebrar (no purgatório) às comemorações do Círio de Nazaré. Para uns, a oportunidade faz o fujão. Para outros, o fim da festa religiosa é a resignação da pena.
Como diz Julio: “Estamos sempre presos, na prisão ou fora dela, à família, à casa e seus objetos, ao trabalho...” O documentário Nazinha, Olhai Por Nós expõe fatos, mas não se interpõe entre os condenados e a justiça. Tampouco santifica bandidos e ou demoniza a justiça com a gratuidade de discursos panfletários. Não se vê, em momento algum, Belisário se deixar levar pela vaidade do senso crítico (de ter uma câmera e um microfone à mão) e tomar o protagonismo da situação. Se houve deslumbramento ou vaidade, caiu no corte final. Essa isenção de (pre)julgamento narrativo dá ao espectador a oportunidade de tirar suas próprias conclusões diante dos registros filmados com o devido distanciamento. O que não quer dizer que documentário seja um iceberg à deriva. Há comoção, mas sem apelar à pieguice clichê e ou à indução emocional com trilha sonora chorosa.
*Estreia prevista, no streaming TvoD (NOW, Google Plai, iTunes), para o dia 6 de maio de 2021, com sessões especiais em salas de cinema a partir de 29 de abril de 2021.
NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha.
Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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