quarta-feira, 28 de abril de 2021

Crítica: Minhas Férias com Patrick


 MINHAS FÉRIAS COM PATRICK

por Joba Tridente 

Em geral a gente sabe o que esperar das comédias norte-americanas, italianas ou inglesas, e até mesmo das brasileiras, menos das francesas, que podem surpreender, decepcionar ou não passar de um “assim-assim”.

Levemente inspirada no livro Viagem com um burro pelas Cevenas (1879), do escritor escocês Robert Louis Stevenson (cuja vida romanesca é citada no filme), a comédia Minhas Férias com Patrick (Antoinette dans les Cévennes, 2020), dirigida por Caroline Vignal, acompanha as aventuras amorosas de Antoinette (Laure Calamy), uma professora do ensino fundamental que está de caso com o pai de uma aluna e, ao saber que ele está com a esposa Éléonore (Olivia Côte) e a filha Alice (Louise Vidal) passando férias nas Cévennes, região turística para longas caminhadas, decide ir atrás do galante. Como toda via das encruzilhadas dos amores clandestinos leva ao inesperado, ao buscar pelo amante Vladimir (Benjamin Lavernhe), a carente Antoinette, chega à primeira hospedaria e, sem ter notícias dele, aluga os serviços do burro de carga Patrick e, aos trancos e barrancos, sai à procura do seu objeto de desejo sexual, de pousada em pousada, caminhando por uma paisagem agreste belíssima.


O cinema francês é mestre em fazer parecer natural o triângulo amoroso na França. Em suas “cômicas” ou “melodramáticas” narrativas, os casais raramente se importam com os casos extraconjugais de seus cônjuges. Se o sabem, aceitam (o pecadilho) e ou se separam “civilizadamente” apenas trocando de casa e ou de quarto. Simples assim! Aceitavelmente amoral! É esse vale-tudo “natural” pelo prazer sexual que leva a emancipada Antoinette, a caminhar e a caminhar ao lado do gente boa, mas temperamental e manhoso, Patrick, em busca de Vladimir. O burro, aliás, é o personagem mais simpático de toda a trama que, por sinal, conta com ótimo elenco humano. Concentrado no seu papel, ele ouve as confidências da acompanhante, feito um bom psicanalista, tem senso de humor e ainda sabe demonstrar amizade e ciúmes de modo convincente. Merece um filme só dele, onde relembre as melhores histórias ouvidas dos parceiros de caminhada pelas Cévennes.


Minhas Férias com Patrick é uma comédia romântica engraçadinha que flerta com o absurdo. Provoca um risinho aqui e outro acolá, já que nem todas as gags funcionam e o humor (para francês rir) jamais é hilariante. O enredo mínimo, da própria Vignal, sobre as artimanhas do amor adulto (ou adúltero!) num cenário bucólico, é linear e sem grandes surpresas. Como é de praxe o grande fluxo de pessoas em filmes de estrada, diversos personagens (andantes e hóspedes aleatórios trama afora e adentro), com suas retóricas liberais ou moralistas, vão se tornando cada vez mais previsíveis e praticamente invisíveis após os encontros casuais com a irredutível protagonista. Um alerta: Se você quiser passar uma temporada discreta, na sua, fique bem longe da região, porque, pelo que se vê, ali todo mundo sabe da vida íntima de todo mundo (hospedeiros e turistas). Portanto, se não quiser saber de fofocas alheias e nem que se metam na sua vida, pense bem antes de botar o pé nas trilhas das Cévennes (risos).


Ah, a crocância do baguete! Essa espécie de enredo, tipicamente francês (abordando triângulos amorosos), normalmente se passa num cenário urbano e o clima geral é de estresse. O vilão responsável pela desarmonia sexual de um casal é (invariavelmente) o estresse. Espera-se, então, que a troca da urbe pelo campo, traga um olhar arejado sobre os percalços do desejo sexual e os artifícios da traição, certo? Espera-se, em vão! Em um lugar paradisíaco, montanhoso, ar puro, onde todo mundo transborda felicidade, menos a desiludida Antoinette, a expectativa é por uma comédia de erros, por um jogo de gato e rato, por uma virada espetacular, por insinuações picantes... Mas, o que se vê é uma história de amor obsessivo adolescente vivenciada por uma mulher adulta (com traços de ninfomaníaca) e um homem (oportunista) disponível. Satisfação momentânea e nada mais! Falta sutileza, falta romantismo, falta química ao casal de personagens (retratados como pessoas comuns e sem atributos de beleza física) e sobra constrangimento. É como se a urgência, a necessidade sexual de uma pessoa adulta a fizesse “agir” feito um boneco de plástico, sem qualquer sentimento. Mecanicidade versus sedução. Sei lá, talvez a narrativa esteja correta em sua frieza, coerente com o argumento e com o script de Caroline Vignal..., eu é que estou em outra paisagem.


Enfim, para quem está cansado de tanta realidade pandêmica e busca uma comédia leve, descompromissada e com clichês sexuais à la française, Minhas Férias com Patrick (que concorreu nas categorias:  filme, direção, roteiro, ator, atriz, música, fotografia e edição, no César 2021, premiando Laure Calamy, e foi selecionado para o Festival de Cannes 2020 e o Festival du film francophone d'Angoulême 2020) pode ser uma alternativa. Afinal, cada um é dono do seu próprio olhar e não há como não se encantar, ao menos, com o cenário e com o orelhudo Patrick.

*Estreia prevista para 29.04.2021, nas salas de cinema e no Now, iTunes, Google Play, Youtube Filmes, Vivo Play e Sky Play.


NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha.

Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


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