domingo, 11 de abril de 2021

Crítica: Laura

 


L  A  U  R  A

por Joba Tridente

Alguns filmes vazam da memória da gente logo após a sua exibição. É como se jamais tivessem existido. Outros ficam ali, retidos, bem acomodados numa ramificação neuronal, à espera de que uma leve menção ao título cinematográfico abra um arquivo nostálgico repleto de informações (audiovisuais) que se juntam em curiosa associação, feito um quebra-cabeça de imagens e palavras. A mim, a mera citação ao clássico drama Laura (1944), de Otto Preminger (Anatomia de um Crime, Rio das Almas Perdidas), remete primeiro à inesquecível composição de David Raksin, principalmente à versão letrada por Johnny Mercer. Depois à intrincada trama que se desvela, por entre a luz e a sombra da requintada fotografia (em preto e branco) de Joseph LaShelle, em busca do assassino da bela Laura (Gene Tierney).


Baseado no romance homônimo de Vera Caspary e roteiro de Jay Dratler, Samuel Hoffenstein e Elizabeth Reinhardt, o film noir Laura, listado entre os 10 melhores filmes de mistério de todos os tempos, acompanha as investigações do detetive do Departamento de Polícia de Nova York, Mark McPherson (Dana Andrews) para encontrar o assassino da publicitária Laura (Tierney), cuja beleza e independência despertavam o interesse amoroso da claque masculina. Na mira do detetive estão o jornalista e colunista dândi Waldo Lydecker (Clifton Webb), que seria (segundo ele) responsável pela ascensão profissional de Laura, o oportunista noivo e alpinista social Shelby Carpenter (Vincent Price) e a socialite Ann Treadwell (Judith Anderson), tia da vítima. Todos aparentemente e ou amorosamente interessados na morte de Laura. O espectador não assiste ao assassinato de Laura, mas fica sabendo dos pormenores dele, bem como da vida íntima da vítima, através de flashbacks durante a narrativa, que começa com a investigação em curso.

Mesmo passados setenta e sete anos e por mais que seu enredo seja conhecido, Laura é um (melo)drama que ainda se assiste com interesse. O enredo, que explora com segurança a dobradinha ciúme e obsessão, é envolvente e não vai além da história misteriosa que quer contar..., incluindo as reviravoltas. Os diálogos, que também não espicham o assunto, reservam algumas pérolas irônicas (“Posso aceitar manchas em meu caráter, mas não em minhas roupas.”). Quanto ao ótimo elenco, destacam-se Clifton Webb (indicado ao Oscar pelo seu detestável Lydecker) e Vincent Price. O diretor Preminger, que foi o primeiro a se interessar pela obra de Caspary e a trabalhar na adaptação para o cinema (cujo registro de produção é um imbróglio e tanto), dirigiu o thriller como bem imaginou e após duas rasteiras do estúdio, deu as cartas, numa jogada de mestre, até o corte final. Enfim, quando se trata de Laura (filme, personagem e tema), há sempre algum fotograma, algum gesto ou alguma nota musical a ser revisitada.

*A partir de 08.04.2021 no serviço de streaming Belas Artes à La Carte


NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha.

Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

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