domingo, 1 de junho de 2014

Crítica: A Culpa é das Estrelas


Câncer é um assunto que ainda hoje exige muito tato, muita delicadeza na sua abordagem, seja na vida real, seja na ficção (livro, cinema, tv, teatro).  Doenças variadas, dependência química são temas caros à Hollywood, que não tem pudor algum em tratá-los comercialmente, abusando da pieguice, do clichê..., sempre de olho na bilheteria e no Oscar. Poderia dizer que até virou um gênero cinematográfico: autoajuda. Porém, como felizmente há sempre um mas, na intenção de diretores mais ousados e ou independentes e ou pouco (?) conectados com os produtores, um filme ou outro acaba se destacando na mesmice, como é o caso do comovente A Música Nunca Parou (2011), de Jim Kohlberg, o envolvente 50/50 (2011), de Jonathan Levine e agora do sensível A Culpa é das Estrelas (The Fault in Our Stars), de Josh Boone.


A Culpa é das Estrelas é baseado no romance homônimo de John Green, um dos autores favoritos dos jovens. O seu foco é a “rotina” de jovens diagnosticados com câncer e, sob a luz tênue, o romance entre os adolescentes Hazel Lancaster (Shailene Woodley) e Augustus Waters (Ansel Elgort). Ela, aos 13 anos, soube do câncer de tireoide, que evoluiu para metástase no pulmão. Hazel respira com a ajuda de uma cânula no nariz e de um cilindro de oxigênio que carrega para todo canto em que vai. O diagnóstico dele é osteossarcoma que, após uma decisão vital, Augustus acredita que está controlado. Ela é melancólica, outonal, quase trágica na sua dor compartilhada com o livro de cabeceira Uma Aflição Imperial, do escritor Peter Van Houten (Willem Dafoe), em que busca decifrar o “final”, já que a história termina no meio da frase de Anna, uma menina diagnosticada com leucemia. Ele é otimista, primaveril, sempre procurando levar a vida com humor. Na trama, o resguardo dela versus a expansividade dele. 

Apesar da sinopse pesada o tema é tratado com leveza e doses de humor. Por vezes a narrativa o aproxima do apaixonante As Vantagens de Ser Invisível (2012), de Stephen Chbosky, que fala do deslocamento de jovens no seu próprio meio. Iguais no diagnóstico (câncer), mas contrários na filosofia (e expectativa) de vida pós-diagnóstico, Hazel e Augustus traçam caminhos diferentes, mas não o suficiente para que não se tangenciem. Assim, entre uma lágrima reticente (à beira da explosão) e um riso espontâneo (contendo a explosão), surge uma tocante história de amor juvenil no compasso de um relógio sem os ponteiros do tempo.


Josh Boone, ciente da perola real em mãos, com base no bom roteiro de Scott Neustadter e Michael H. Weber, conduz a história de modo sóbrio e jamais sombrio. É claro que, em se tratando do assunto câncer, o lado “sombrio” é tentador, mal ele não afetou o diretor que parece alheio ao sensacionalismo. 

Em sua essência A Culpa é das Estrelas questiona a forma como, principalmente nós ocidentais, dependendo da fragilidade (e sofrimento!) do paciente e ou do grau de egoísmo (apego) de seus familiares, lidamos com os pequenos prazeres da vida e as grandes dores da morte e ou vice-versa. Lembrança e ou anonimato? Viver intensamente (para ser lembrado) a cada segundo ou prostrar-se (para ser esquecido)? O que será que importa quando a única certeza que temos é que a morte é inexorável e hora mais hora menos arrebanha (ou arrebata!) a todos?


A Culpa é das Estrelas é um drama que provoca (também) no espectador um vendaval de reações e emoções, com seus momentos doloridos ou coloridos. Um drama que perturba pela frieza de algumas sequências..., como a imprescindível visita do jovem casal ao escritor Peter Van Houten, em Amsterdã. A química entre Shailene (Hazel) e Ansel (Augustus) é admirável. E a empatia pelo casal tem nada a ver com a exploração da doença, com piedade e ou autopiedade (dos jovens), mas com o desenvolvimento convincente dos personagens e de suas histórias, que passam bem longe do melodrama.

Essa veracidade do filme, com certeza vem do romance (que ainda não li), já que John Green trabalhou como estagiário por cinco meses em um hospital pediátrico que atendia a crianças debilitadas, em estado crítico. Uma ocupação que deu novo rumo, inclusive profissional, à sua vida. 

Enfim, considerando que é um tema difícil, tratado com a maior consideração; que traz um elenco maravilhoso, entregue aos seus personagens; que a produção é cuidadosa; a direção eficiente e a fotografia impecável..., A Culpa é das Estrelas agradará não apenas aos leitores juvenis, mas também aos espectadores (de todas as idades) que gostam de uma história bem contada... Em tempo: Alguns culpam e outros agradecem às estrelas pelo seu bom ou mau destino. E você?

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