Bergman Island
por Joba Tridente
Fårö é uma ilha de areia fina e paisagem árida, repleta de monólitos de calcário, chamados ‘raukar’, no mar Báltico, a nordeste de Gotland, a maior ilha da Suécia. Hoje em dia Fårö é mais conhecida como a Ilha de Bergman, não porque o famoso cineasta fosse seu proprietário, mas porque adquiriu propriedades, viveu e trabalhou na ilha por mais de 40 anos e foi onde rodou filmes como Através de um espelho; Persona; A hora do lobo; Vergonha; A paixão de Ana; Cenas de um casamento. Ali encontra-se o Centro Cultural Bergman, que proporciona ao turista fã do cineasta o Safári Bergman (passeio por locais de filmagem e pontos curiosos) e a Semana Bergman (com seminários, sessões de cinema, conferências), no final do mês de junho. Ou seja, atrações turísticas cinéfilas, em torno da obra e do grande diretor sueco, não faltam. Inclusive, uma das casas de Ingmar Bergman (1918-2007) é oferecida como residência de artista para autores em crise criativa e/ou em busca de inspiração, como é o caso dos protagonistas do drama romântico A Ilha de Bergman (Bergman Island, 2021), escrito e dirigido pela francesa Mia Hansen-Løve.
“Bergman foi tão cruel em sua arte
quanto em sua vida.”
“A morte é apenas uma luz se apagando.”
No murmurinho cinéfilo, acredita-se que a metaficção de Mia Hansen-Løve (que foi casada com o famoso cineasta francês Olivier Assayas) talvez seja menos ficção do que parece e que, nas entrelinhas, traria elementos da sua vida profissional e pessoal, tanto na composição do enredo quanto no desenvolvimento das personagens. Talvez por isso (?) que, a princípio, a ambiguidade (?) feminina, a dependência e/ou a necessidade da aprovação e/ou da conivência masculina aos projetos profissionais e/ou pessoais de Chris e Amy (alter egos de Mia?) soa bem estranha, já que, também no cinema, as mulheres estão conquistando com relevância o seu espaço. Depois, durante o processo de amadurecimento dos projetos das duas (ou três?) mulheres, aceita-se tais atitudes como catarse (autoral?). Supondo que, para se livrar de todas as aflições, inseguranças, medos femininos, só “exorcizando” os homens (soberanos) que (sublimados) não atendem às suas expectativas. Daí a impressão de uma marioneteira (Mia) manipulando uma marionete (Chris) que manipula outra marionete (Amy)..., na esperança de uma hora as cordas catárticas se romperem e libertá-las (de si mesmas), para que encontrem a independência profissional e pessoal em algum lugar fora da Ilha de Bergman (real e fictícia). Em algum lugar onde as obras impactantes de autores consagrados não fustiguem os (as) autores(as) iniciantes em busca da própria linguagem.
A Ilha de Bergman é um filme que pode fazer o fã de Ingmar Bergman querer revisitar a sua fascinante obra e o espectador leigo a conhecer e certamente se surpreender com o quanto o cinema passado pode fazer sombra no cinema presente. Ah, não confundir o instigante Bergman Island (2021), de Mia Hansen-Løve, com o interessante Bergman Island (2006), de Marie Nyreröd. Pois, entre o devaneio e a memória das águas do mar, nem toda onda é a responsável por esculpir um “raukar”.
Produzido pela França, Bélgica, Alemanha, Suécia e
México, A Ilha de Bergman, chega aos
cinemas brasileiros em 24 de fevereiro
de 2022, com distribuição da Pandora Filmes.
Trailer Aqui
NOTA: As considerações acima são pessoais e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de carteirinha.
Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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