A Z O R
por Joba Tridente
Quando ouve falar em paraíso (ou refúgio) fiscal,
muita gente de pouca e/ou quase nenhuma grana, dá asas à imaginação e viaja na
ideia de um lugar onde dinheiro dá em árvore (frutas-moedas) e até mesmo no
chão (grama-dólar). Mas, assim que escorrega na maionese e cai na real (ou na
falta do real) e se esborracha nas suas dívidas secas, se pergunta entre muitos
ais: Qual é o caminho das pedras ou o
pulo do gato sem rastro para as delícias lucrativas das empresas offshore? Onde começa a trilha para a fonte dos
privilegiados que jorra dinheiro? Bem, se “ninguém” sabe e “ninguém” viu e
“ninguém” falou é por causa do Ali Mandha Kalar. Traduziu? Também porque, essa
gente sempre em off sabe muito bem como
faturar alto em qualquer situação política e/ou catastrófica. Aliás, quanto
mais extrema e/ou mais trágica, melhor!
“Fique quieto!
Cuidado com o
que diz!”
Um das ocasiões mais revoltantes do livre
investimento dos abastados está no foco do excelente thriller político
argentino Azor (2021), do estreante diretor
suíço Andreas Fontana. Escrito por
Fontana e Mariano Llinás, o roteiro traz à luz (às vezes difusa) um punhado de
personagens “acima de qualquer suspeita” que anda pelas sombras, procurando se
beneficiar dos esquemas (bancários) de corrupção na Argentina, sob a viscosa
ditadura de Jorge Rafael Videla (1976-1981)..., apoiada por civis da elite
nacional (claro!) e com a conivência da igreja (óbvio!).
A trama que, aos poucos vai amarrando tensos fios
(desencapados?) começa com as cenas de um simpático personagem posando risonho
para fotógrafos (?). Ele é René Keys
(Alan Gegenschatz), personagem-chave
neste enredo sombrio..., e estas são as únicas cenas em que aparece antes de sumir
do mapa. O mês é dezembro. O ano 1980. Sem notícias do sócio, o banqueiro suíço
Yvan De Wiel (Fabrizio Rongione) e sua esposa Inés
(Stéphanie Cléau), desembarcam em
Buenos Aires atrás de pistas e para dar continuidade nos negócios financeiros
firmados com a clientela particularmente rica e influente e que, entre
sussurros e precaução, não sabe se o solícito René fugiu, foi sequestrado, foi morto..., naquele país em grande
deformação. Yvan e Inês não entendem, de imediato, a
situação política da Argentina. Mas não demora para que também comecem a pisar
em ovos. Principalmente após Ivan
encontrar, em uma lista de correntistas deixada por René, o nome Lázaro, que
ele desconhece...
“Estamos em fase
de purificação:
os parasitas
precisam ser exterminados”
Azor é
narrado em cinco capítulos distintos, pero
no mucho, que sinalizam o itinerário e os percalços da relação financeira entre
os oportunistas investidores e sonegadores argentinos e o oportuno sistema
bancário suíço: A Turnê do Camelo
(rito de passagem); As visitas; Um Duelo; A Gala; Lázaro. A
determinada busca de Yvan por René é praticamente uma jornada de herói banqueiro no atalho do dinheiro e da corrupção, por “baixo dos
panos” da genocida ditadura militar. Um simbólico beija-mão redentor dos
“pecadilhos” dos abastados também sob o regime dos abestados. Toda via do lucro
fácil, no entanto, dá voltas, meias-voltas ou navega por águas sombrias ao pôr
do sol? Como medir a integridade de um propósito e/ou de um depósito? Quem
assistir saberá até onde vai o caráter de um profissional tão “neutro” quanto o
seu país (na época)!
Azor é uma
co-produção Argentina/Suíça/Franca e cuja narrativa dispensa metáforas (mas não
os neologismos) e economiza palavras nos maquiavélicos diálogos (em francês e
espanhol) de falas curtas, de falas diretas ou de falas interrompidas na
intenção ferina de se alcançar a meta: O
medo te torna medíocre!. Assim, o que não é dito ou é subtraído das
conversas (formais e informais) e/ou a ação meramente sugerida terá de ser concebida
pela mente do espectador intuitivo.
Enfim, com performances notáveis de Fabrizio Rongione
e Stéphanie Cléau, apoiados por um ótimo elenco coadjuvante, formado por atores
veteranos, Andreas Fontana realiza um filme irretocável sobre a ganância sem
limites (também em tempos de crise). A fotografia discreta de Gabriel Sandru, nos rodeios da música
de Paul Couler, dá o tom cirúrgico para a edição precisa de Nicolas Desmaison.
NOTA: As considerações acima são pessoais e,
portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de
carteirinha.
Joba
Tridente: O
primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros
videodocumentários fiz em 1990. O primeiro curta-metragem (Cortejo), em
35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e
coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder,
2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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