Viva - A Vida é uma
Festa
por Joba
Tridente*
Em 2014, quando pesquisava material para escrever
sobre a belíssima animação Festa no Céu (The Book of Life), produzida por Guillermo del Toro e dirigida por
Jorge R. Gutierrez, descobri que em 2013 a produtora mexicana Metacube
Technology & Entertainment venceu um processo contra a Pixar Animation
Studios pelo direito ao título Dia de Muertos, que a empresa da
Disney Company pretendia usar em sua produção prevista para 2015. A produtora
Metacube, sediada em Guadalajara, já vinha trabalhando há 10 anos no
longa-metragem de animação Dia de los Muertos, La Película, que
mudou o título para Dia de Muertos - La Leyenda Original... e ficou mesmo apenas Día
de Muertos, cuja estreia estava marcada para outubro de 2017, mas, por
causa do lançamento de Coco (Viva – A Vida é uma Festa), da Pixar,
foi adiado para novembro de 2018..., leia em Disney una sombra para Día de muertos e 'Día de Muertos': la película 100% mexicana
que nació antes que 'Coco' y será eclipsada por Disney e Cinta mexicana 'Día de Muertos' aplazó su
estreno por 'Coco'.
E já que estou falando de temática mexicana, veja os
excelentes curtas Hasta Los Huesos, do
premiado animador René Castillo (2001), que inspirou Tim Burton em A Noiva Cadáver e Dia de los Muertos (2013), que não é mexicano mas é muito
bonito. Haja muertos para tanta animación!’’
Bem, o tal filme da Pixar, esperado para 2015 e
lançado em 2017, como já disse acima, é Coco,
que no Brasil (talvez para evitar gracejos com “coco”, a fruta, “coco”, a dança, e ou “cocô”, o excremento) recebeu o título de Viva - A Vida é uma Festa..., uma animação que dialoga muito com Festa no Céu (2014), através de seus
protagonistas que amam a música, mas são forçados, por suas famílias, a exercerem
outra profissão: (Manolo Sanchez) toureador
e (Miguel Rivera) sapateiro. Porém,
na questão cultural, enquanto Festa no Céu, assim como o recente O Touro Ferdinando, levanta a
bandeira de protesto contra a violência nas touradas e a matança de bois na
arena, Viva - A Vida é uma Festa
trata (ironicamente?) de direitos autorais, do resgate da dignidade de um
músico e a paz de espírito de uma rancorosa família (Rivera) com o fim de uma história de amor no passado. É certo que a
futura animação mexicana Día de Muertos
também dialogue com os dois anteriores ao se debruçar sobre o rico folclore
local. Afinal, como diz uma criança que ouve comovida a história da morte Manolo, em Festa no Céu: “Qual é a dos mexicanos com a morte?”.
Por motivos “diferentes” e artimanhas do destino, mas
com a paixão em comum pela música, o romântico Manolo Sanchez, em Festa no Céu, e o jovem Miguel Rivera, em Viva - A Vida é uma Festa, vão parar no alegre mundo dos mortos lembrados e no triste mundo dos mortos esquecidos
onde, além de seus finados parentes, encontram a força necessária para suas
realizações pessoais no diverso mundo dos
vivos. Cada trama com sua tessitura: o apaixonado Manolo chega lá, em busca da sua amada Maria, porque foi traído e morto; o inocente Miguel atravessa o umbral por não saber da magia espiritual
impregnada nos pertences dos mortos.
É interessante notar que, em ambas as produções, é
forte a presença de mulheres em situação de empoderamento feminino e ou de
matriarcado (nos dois lados da vida)..., bem como, entre outros detalhes
curiosos e homenagem justa à cultura mexicana (nas viagens intramundos), vale ressaltar
o fantástico encontro de Manolo com
as irmãs Adelitas (participantes
ativas da Revolução Mexicana) e de Miguel
com a revolucionária artista Frida Khalo.
O argumento de Viva
- A Vida é uma Festa é o tradicional: um personagem em busca de um sonho e
o pesadelo que será para realizá-lo, já que terá de enfrentar, entre outros
dissabores, a própria família..., porque histórias de superação (protagonizadas
por vivos ou mortos) funcionam com espectadores de qualquer idade.
Embalado por
excelente trilha sonora (que soa muito melhor em versão espanhola, como a Recuérdame (Remember Me) de Kristen Anderson-Lopez e Robert
Lopez, indicada ao Oscar 2018), o espectador acompanha a emocionante jornada do
pequeno Miguel Rivera, um garoto adorável
de 12 anos que nasceu para ser músico, de corpo e alma, e tem no ator e cantor Ernesto de la Cruz, o seu grande ídolo.
Todavia, a paixão musical do menino não é compartilhada pela sua família
matriarcal (de sapateiros), que acredita ser ela a responsável pela
infelicidade de todos os membros do clã desde o dia em que o seu tataravô, que
era cantor e compositor, foi embora de casa (para viver de música), abandonando
a mulher Amélia e a filha pequenina Inês (a Coco). Por décadas foi assim na Família
Rivera: cabeça baixa, na fazedura de calçados, e coração fechado para
qualquer manifestação musical..., até o jovenzinho cheio de vida Miguel decidir quebrar a tradição e
trilhar o seu próprio caminho.
Tradição familiar, que cerceia sonhos juvenis e provocam frustrações irreparáveis, e divagações sobre a morte (ou o pós-vida) não são temas fáceis de se tratar, principalmente quando o público alvo preferencial é a criança (ou jovem) em fase de formação, em fase de descoberta dos ganhos e das perdas na vida..., assuntos que Festa no Céu e Viva - A Vida é uma Festa tratam com naturalidade e segurança, sem exceder na dureza crítica (necessária) e ou se deixar seduzir pela pieguice moralizante (patrimonial). Assim, em um e outro desenho animado os protagonistas chegam ao final da jornada em paz com o passado e prontos para conquistar um futuro por mérito próprio.
Viva - A Vida é uma Festa é uma animação prazerosa, contagiante e nos presenteia ao menos com duas sequências antológicas: uma no mundo dos vivos (com Miguel e Coco) e outra no mundo dos esquecidos (com Miguel, Héctor, Chicharrón), favorecidas ainda mais com as canções-tema: Recuérdame e Juanita.
Embora menos inventiva no enredo, na criação, cor e traçado gráfico de personagens que Festa no Céu (com seus deslumbrantes - e manipuláveis - bonecos de madeira e quinquilharias metálicas), mas não menos intensa, a animação Viva - A Vida é uma Festa, dirigida por Lee Unkrich e Adrian Molina, autor do melodramático roteiro, mantém o padrão técnico habitual (com sua prodigiosa plasticidade) da Disney/Pixar. Enfim, mais um filme maravilhoso para celebrar o cinema e a tradição mexicana.
*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de
idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo),
em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista
e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
Não assisti o filme .
ResponderExcluirLendo seu comentário tenho certeza que vou gostar muito .
Mas penso que é um "desenho" para adultos pois acredito que tem muitos significados com simbologia ou filosofias de costumes .
Excelente seu comentário/blog
Obrigado
..., olá, Marina Seischi, apesar da temática complexa, Viva - A Vida é uma Festa, tem uma narrativa mais simples e menos tensa (ou adulta) que Festa no Céu. ..., acho que vai gostar de uma e de outra animação, também porque, independente do conteúdo interessante é de ma plasticidade de encher os olhos e fazer cair o queixo. ..., grato por sua visita e considerações!
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