quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Marcos Stankievicz Saboia: Cinemateca de Curitiba - 40 Anos

A pedido do Claque ou Claquete, o Coordenador da Cinemateca de Curitiba, Marcos Stankievicz Saboia, escreveu o artigo Cinemateca de Curitiba - 40 Anos - Um Breve Panorama e, complementando a matéria, concedeu uma entrevista exclusiva ao blog, que pode ser acessada no link: Entrevista: Marcos Stankievicz Saboia.



Cinemateca de Curitiba - 40 anos
Um Breve Panorama
Marcos Stankievicz Saboia

Como é recorrente na história do cinema, a cinematografia paranaense do período silencioso sofreu perdas inestimáveis. A quase totalidade da obra de Annibal Requião (1875-1929) foi perdida no trágico incêndio da Fundação Cinemateca Brasileira em 1957, ali arderam filmes como o Desfile de 15 de Novembro e a “Chegada do Primeiro Automóvel em Curityba”. Dos cerca de 300 filmes realizados por ele, restaram apenas Panorama de Curityba (1909) e Carnaval em Curityba (1910). Outro pioneiro do cinema do Paraná, João Baptista Groff (1897-1970), teve parte de sua obra perdida no mesmo incêndio que consumiu as obras de Requião. Outra parte desapareceu em um segundo incêndio, no final dos anos 1960, em um depósito que ficava nos fundos da casa de Groff. Dentre suas obras estão Zeppelin em Curitiba (1936), Comício Integralista (1937) e, destacando-se como o principal filme do período silencioso do Paraná, Pátria Redimida (1930). A partir dos anos 1930, o cinema paranaense esteve circunscrito à produção de cinejornais.  A produção ficcional paranaense surge apenas por volta de meados dos anos 1960, através de iniciativas individuais.

Entretanto, movimentos cinematográficos no Paraná manifestam-se já a partir de 1948, através do cineclubismo, com seu auge no começo dos anos 1970. Destaca-se também a produção em super-8 e a realização de vários festivais desta bitola em Curitiba. Estas iniciativas foram apoiadas pela Fundação Cultural de Curitiba já a partir de sua criação, em 1973. Surgiram assim condições que favoreceram a criação, em abril de 1975, da Cinemateca de Curitiba, idealizada por Valêncio Xavier e inspirada pela sua estadia em Paris e tendo como modelo a Cinemateca Francesa.

Foto: Marcos Campos
Na sua fundação, a Cinemateca possuía uma sala de cinema com pouco mais de 100 lugares e projeções em 16 e 35 mm, com sessões de terça a domingo, um pequeno depósito de filmes e uma sala de administração. Funcionava anexa ao Museu Guido Viaro, daí sua primeira denominação de Cinemateca do Museu Guido Viaro.  Seu regulamento trazia explicita a missão de “incentivar a prática e o progresso do filme experimental” e “realizar e produzir películas cinematográficas”. Apesar do espaço exíguo, a liberdade de debate, naqueles anos de repressão, fez com que a Cinemateca se tornasse um dos poucos pontos disponíveis na cidade para o encontro de intelectuais, críticos e interessados em cinema. A participação da Cinemateca no movimento cineclubista paranaense, como a promoção do Primeiro Encontro de Cineclubes do Paraná, por exemplo, que resultou na criação da Federação Paranaense de Cineclubes e oferta de vagas em seus cursos à cineclubistas, demonstra a clara intenção de não só preservar e difundir o cinema, mas também de fomentar diretamente a formação de novos cineastas e a produção local.

Foto: Marcos Campos
Contando com realizadores reconhecidos, como Fernando Severo, e iniciativas como o I Festival Brasileiro do Filme S-8, idealizado pelo cineasta Sylvio Back, o movimento de produção em S-8, de Curitiba, teve na Cinemateca do Museu Guido Viaro um importante aliado que, na forma de cursos de formação e empréstimo de equipamentos, impulsionou o surgimento de novos realizadores como: Irmãos Wagner, atuantes na animação, Rui Vezaro, Peter Lorenzo, Nivaldo Lopes, Yanko Del Pino, Pedro Merege, entre outros. O convênio com o MEC, na década de 1970, possibilitou a aquisição de equipamentos, como câmera e moviola 16 mm, colocados à disposição dos cineastas, e também a realização, em escolas municipais, do Projeto Criança e Cinema de Animação, (1978-1979), envolvendo alunos de 7 a 11 anos, em dezenas de animações em S-8.

Foto: Marcos Campos
Para orientar cursos e fazer palestras, a Cinemateca do Museu Guido Viaro trouxe a Curitiba os cineastas Ozualdo Candeias, Eduardo Escorel, Rogério Sganzerla, Walter Carvalho, Silvio Tendler, Thomas Farkas, Vladimir Carvalho, Jean-Claude Bernadet. Já no final dos anos 1970, a oferta dos cursos práticos de cinema fez surgir a chamada “Geração Cinemateca”, grupo de cineastas que, além dos superoitistas, contava com nomes como Beto Carminatti, Lu Rufalco, Josina Melo, Berenice Mendes, Homero de Carvalho, e também criou as condições para o surgimento da “Turma do Balão Mágico”, que frequentava e lotava diariamente a pequena sala de trabalho da Cinemateca, da qual faziam parte, além do já citado Nivaldo Lopes, Paulo Friebe, Willy e Werner Schumann, Altenir Silva, Geraldo Pioli.

A década de 1980, com a inauguração dos Cines Groof, Ritz e Luz, na região central de Curitiba, e do Cine Guarani, no Centro Cultural do Portão, que se destacaram pela programação direcionada à exibição de mostras e festivais de cinema e de filmes fora do circuito comercial, foi fundamental para a consolidação da Cinemateca como polo difusor cinematográfico do estado. São deste período as exibições de filmes, em 16 e 35 mm, nos bairros periféricos de Curitiba, iniciativas que contribuíram tanto para a formação de plateia crítica quanto para a inclusão sociocultural da região. Por motivos diversos, as salas Groff, Ritz, Guarani e Luz foram paulatinamente fechadas nos anos 2000.

Foto: Nivaldo Lopes
Após um período de peregrinação por diversos espaços, a Cinemateca do Museu Guido Viaro recebeu sua nova sede no ano de 1998, e um novo nome: Cinemateca de Curitiba. Erigida a partir de dois prédios históricos com um anexo moderno, a Cinemateca possui agora, em 1.200 metros quadrados, acervos climatizados, para nitrato e para cópias de segurança, espaços para revisão de filmes, sala de moviola, biblioteca, sala de exibição com 104 lugares, sala para cursos, ilha de edição digital, hall com exibição de equipamentos antigos e espaços administrativos. Seu acervo conta hoje com 2500 entradas em película e outras 2500 em diversas mídias digitais.

Foto: Nivaldo Lopes
Atualmente, a Cinemateca de Curitiba, levando em conta os desafios inerentes a todas as mudanças tecnológicas e sociais, segue os princípios de preservação, difusão, pesquisa e formação que pautaram os primeiros anos. Tem preservados em seus acervos os filmes recuperados de Requião, Groff e de inúmeros outros cineastas que construíram a história do cinema paranaense. À parte da facilidade de acesso aos equipamentos hoje disponíveis, os cursos promovidos pela instituição são bastante concorridos, continuando assim sua tradição de apoiar futuros cineastas. A difusão em bairros afastados do centro continua relevante e cristalizada como política pública.

Brevemente a Fundação Cultural de Curitiba e a Cinemateca de Curitiba ampliarão seus espaços, com um prédio que recuperará duas das salas que foram fechadas, estúdio, salas de curso e debate. O Cine Guarani foi reformado e reaberto em 2012.


Foto: Acervo Marcos S. Saboia
Marcos Stankievicz Saboia é Coordenador da Cinemateca de Curitiba. Graduado em Educação Artística/Música (UNESPAR-FAP), Filosofia (UFPR) e Cinema (UNESPAR-FAP), há mais de uma década atua na área cinematográfica do Paraná, dividindo direção, montagem, produção, roteiro. Em 2008, em parceria com Joba Tridente, dirigiu o curta-metragem CORTEJO, película em 35 mm.


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