sexta-feira, 7 de junho de 2013

Crítica: O Grande Gatsby


Quando lançado em 1925, O Grande Gatsby, esteve fadado ao fracasso. Recebido friamente pela crítica, o romance de F. Scott Fitzgerald mal vendeu 20 mil exemplares. Bastou a sua morte para que o livro fosse redescoberto, elevado à categoria de clássico e considerado a sua obra-prima. E desde então vem ganhando adaptações para o cinema, teatro, ópera, HQ. A arte tem dessas coisas. O ciclo vicia a cultura e quando o artista se vai, encontra-se a cura.

O Grande Gatsby (The Great Gatsby, Austrália, EUA, 2013), na alucinante visão de Baz Luhrmann, é a quinta versão cinematográfica da obra (houve uma adaptação para a TV em 2000) e com certeza a mais audaciosa. A única anterior que vi e de que me lembro vagamente é a de 1974, do diretor Jack Clayton, com Robert Redford e Mia Farrow, com roteiro de Ford Coppola, detonada pela crítica. Na época gostei. Era mais espectador que crítico. Nunca mais a revi.


Quarenta anos depois, Baz Luhrmann, reinterpreta F. Scott Fitzgerald e recauchuta o universo d’O Grande Gatsby, com furor, estética e trilha sonora “fora de ordem e de tempo” que o consagraram com os estonteantes Romeu+Julieta (1996) e Moulin Rouge (2001). Frenesi à parte, o roteiro de Baz e de Craig Pearce busca fidelidade verbal e visual da obra original e quando toma alguma liberdade poética, amarrando a narrativa, esta não chega a incomodar, pelo contrário, até realça nuances do romance crítico de Fitzgerald, que destila o american way of life nos anos 1920, sem os inconvenientes da ressaca socioeconômica do american dream.

Neste drama trágico, onde uma aventura amorosa (correspondida ou não) custa caro, a história se desenvolve catártica, ao sabor da fervilhante memória do aspirante a escritor Nick Carraway (Tobey Maguire). O jovem interiorano que chegou entusiasmado a Nova York, na primavera de 1922, e sentiu-se atraído (e traído) pelo mundo dos ricos e famosos, desvela os prazeres e dissabores da companhia de pessoas excessivas, não apenas para lembrar e esquecer os loucos anos de 1920, mas para recuperar a sanidade e, talvez, o que restou dos seus sonhos juvenis. Vizinho do misterioso milionário Jay Gatsby (Leonardo DiCaprio, excelente), e primo da fútil Daisy (Carey Mulligan), esposa do egocêntrico e mulherengo Tom Buchanan (Joel Edgerton, ótimo), Carraway se enredou inadvertidamente na intimidade dos três e descobriu tarde demais que, para se viver “sem regras” (e sair ileso), mais que cacife, é preciso muito estômago (ou fígado).


Assim como em O Grande Gatsby, de Fitzgerald, o de Luhrmann não disfarça a contradição do copo cheio de nada, da melancolia dos seus festivos personagens. Por trás das máscaras, a história mais tocante é a do venturoso Gatsby, que se (re)inventou em nome de um amor que insiste num presente, sem se dar conta de que o seu tempo parou num outro campo de batalha. A história de Tom, também é interessante, mas, pautada pela devassidão e não pela paixão avassaladora, a sua carga dramática é outra, bem menos envolvente. O mesmo pode ser dito da submissa Daisy, perdida em si mesma e sem um repente suficientemente forte para retirá-la do marasmo a que se condenou.

Como se ouvisse Oscar Wilde: ... aquele que se mantém o mais longe possível do seu século é na verdade o que melhor o espelha..., Baz Luhrmann faz de O Grande Gatsby, obra que também aparece embebida da essência de Wilde, um filme deliciosamente provocante e muito bem embalado pelo efervescente jazz com batida pop-hip-hop. Mesmo abusando do preciosismo, que lhe é peculiar, (re)constrói com admirável competência uma trama (aparentemente simples e novelesca), com ares de sátira e de parábola, emoldurada por uma cenografia de cair o queixo. Diante de enquadramentos desconcertantes, coreografias arrebatadoras, belos efeitos gráficos..., é impossível não se sentir no cerne da luxuriante realidade (ilusória?) norte-americana dos 1900.  Ou não se apiedar do apaixonado Gatsby.


Nunca é demais lembrar que, se o leitor é um espectador que não gosta de excessos, e vice-versa, talvez seja melhor manter distância. Mas que vai perder uma vibrante adaptação, ah, isso vai.

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