De Canção em Canção
por Joba
Tridente
Tem filme novo de Terrence Malick nos cinemas: De
Canção em Canção (Song to Song,
2017). Mas será realmente um filme novo?
Exibindo como pano de fundo um
festival de música em Austin, no Texas, De
Canção em Canção apresenta uma variação da mesma penitência religiosa
proposta (qual uma oração-reflexo) em Amor
Pleno (2013) e Cavaleiro de Copas
(2015): homens monossilábicos (caricatura masculina!), sem saber (ou ter) o
quê dizer sobre a vida e o amor para suas companheiras, namoradas, amantes...,
e mulheres psicóticas, desequilibradas, bipolares, amando e odiando (em
pensamento) seus companheiros, namorados, amantes. Ambos incapazes (?) de se
manifestarem verbalmente. Enquanto homens andam a esmo e casais se olham
(desejosos ou não), se relam, se roçam, insinuam sexo e mulheres possam nuas e
ou seminuas, os/as protagonistas pensam (em off) o quê gostariam de falar
(mas não dizem!) sobre o amor, o ódio, a vida, a dor, a religião e deus (não
necessariamente nessa ordem cristã), uns aos outros, não tivessem tão
ensimesmados lambendo as próprias feridas, como se as maiores do mundo.
Através de cortes (com a introdução de belas
imagens), recortes (com a introdução de belas imagens) e picotes (com a
introdução de belas imagens) no dia a dia de trabalho ou de badalação de cada
personagem, a narrativa tenta dar prumo (ou sentido!) às relações ambíguas
entre os artistas da área musical Faye
(Rooney Mara), BV (Ryan Gosling), Cook (Michael Fassbender), Rhonda (Natalie
Portman)..., que vão se enredando profissional, social e afetivamente tal
qual numa balada romântica e caótica de amor e dor (“Te amo! Você é o amor da minha vida! Te amarei para sempre! Te amei!”).
Não faltam angústia, melancolia, vazio existencial, a busca por deus,
triângulos amorosos e angustiosos, imagens imersivas e contemplativas (sempre
em movimento: haja travelling!): paisagens
bucólicas com mato, grama, capim, árvore, folhas, pássaros, montanhas, rios,
mares, praias, piscina, nascer e por de sol, estradas, viadutos, pontes,
carros, aviões..., e o que mais se desejar e imaginar do fascinante arquivo de
imagens (salvatela de computador) das quatro estações de Emmanuel Lubezki. A cor do figurino
também varia conforme o humor dos personagens. O elo está no conjunto ou num mero detalhe!
Se você não assistiu aos reflexivos Amor Pleno/To the Wonder (2013) e Cavaleiro
de Copas/Knight of Cups (2015), este drama light and heavy pode até lhe parecer
original e tocante. Porém, pelas vias abstratas (ou seria herméticas?) do mestre tão off das badalações quanto as narrativas
em off dos seus últimos trabalhos
cinematográficos, praticamente sem diálogos (o que deve gerar uma boa economia
em som direto), De Canção em Canção,
que deixa muito espectador atônito (!), está mais
para um “adendo” a tangenciar sistematicamente os dois filmes anteriores.
Quem não assistiu ao seu belíssimo e inquietante A
Árvore da Vida (2011), também pode demorar um pouco para amarrar as
pontas do script metafísico. Já o cinéfilo que tem acompanhado os recentes
devaneios do messiânico roteirista e diretor, onde seus personagens estão sempre à deriva (revirando os olhos),
em busca de um deus cristão que lhes dê respostas e algum significado para suas vidas vazias e ou praticando
atos de solidariedade em hospitais e periferias, vai sentir que De
Canção em Canção é um dos galhos frágeis e com frutos muito
menos suculentos da árvore citada. O argumento de que a salvação do homem se dará através da prática sincera do amor humano é nobre, mas o roteiro para a redenção é pobre.
Decifrar a trama do emblemático De Canção em Canção não é um exercício fácil para o espectador de
primeiro Malick, pois depende da intimidade com os seus filmes recentes, bem
como da aceitação da sua linguagem (filosófica cristã) cada vez mais redundante,
para mensurar o vazio existencial de seus personagens e as particularidades da
“mensagem” ou “moral” religiosa nas entrelinhas do drama. Assim, é bem possível
que (neste imbróglio transcendental) alguém se perca no labirinto das
lamentações, cego pelos flashes de tantas lamúrias pessoais e totalmente alheio
aos anseios de quem quer que seja.
A mim..., que após a sessão ainda não tinha opinião
formada e chegando em casa assisti ao Cavaleiro
de Copas, seguido de Amor Pleno...,
confesso que a sensação é mais de frustração, por esta melancólica canção de
Malick não ter me convencido totalmente, do que de decepção pela sua
idiossincrasia visual. O vazio que me ficou é bem maior que o vazio de seus
personagens no show business da vida.
Um vazio que não consegui preencher nem com as belas imagens rurais e urbanas que pululam aleatoriamente
na telona...
*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de
idade. Os primeiros vídeo-documentários, em VHS, fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo),
em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista
e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
Estou há muito anos em dívida com tudo que o cineasta fez. Creio que o último que vi dele foi "A árvore da vida". Aproveitarei o ensejo da sua postagem para buscar uma atualização.
ResponderExcluirAbraços.
..., olá, J. E. Guimarães, depois do grande "sacrifício", volte para comentar sobre os filmes malickianos que assistiu! Abração!
ResponderExcluirMuito confuso mas bom! Terrence Malick é um daqueles diretores que ou se ama ou se odeia. Sua estética apurada, de linguagem rebuscada e muito existencialismo conquista o público com a mesma intensidade que o afasta, e um exemplo dessa relação de amor e ódio é seu novo trabalho DE CANÇÃO EM CANÇÃO, que novamente traz um elenco estelar com Michael Fassbender, Ronney Mara, Ryan Gosling (Do óptimo Novo Filme Blade Runner 2049 ), Natalie Portman e ainda conta com várias outras participações mais do que especiais, que falaremos mais a frente. DE CANÇÃO EM CANÇÃO é a prova de que o talento contemplativo e filosófico de Malick pode abordar vários temas e tomar várias formas, afinal, não importa o que façamos ou como vivamos – a reflexão sempre será necessária. Nossa existência depende disso, pois assim como disse o filósofo francês René Descartes no livro O Discurso do Método de 1637: “Desde que eu duvide, eu penso; porque eu penso, eu existo”.
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