Transeunte (Brasil, 2010), de Eryk Rocha, é um doc-drama sobre um cidadão em trânsito em uma cidade em transe. A vida transformou Expedito (Fernando Bezerra) e a cidade do Rio de Janeiro. Ele, um aposentado de 65 anos, é quase puro silêncio em seu anonimato. Ela, quatrocentona, é toda ruídos. O Expedito é um homem solitário que passa o tempo que lhe sobra olhando, de seu apartamento, a cidade que se eleva, e na rua, o povo que se leva. O Rio é uma capital (in)diferente ao destino dos transeuntes.
Com uma fotografia curiosa, em preto no branco, de Miguel Vassy, repleto de closes, detalhamentos faciais, registro de “coisas”, meio que tendência em filmes mais ou menos alternativos, Transeunte é um street movie para um público seleto, talvez mais seleto do que o público de Glauber Rocha, pai de Eryk. A narrativa convida o espectador a fazer uma caminhada de observação (que talvez já tenha feito e nem se dado conta), na companhia do monossilábico Expedido que, de posse de um radinho à pilha e fones de ouvido, passeia anônimo pela cidade, flagrando fragmentos de conversas de outros anônimos.
Andar pelo Rio de Janeiro (e ou qualquer outra capital brasileira), hoje em dia, é uma aventura de risco. No entanto, enquanto transita de um lado para outro, sem compromisso ou pressa, se atentando a gestos, rugas e rusgas de estranhos, Expedido não demonstra qualquer temor, a que uma pessoa de sua idade está sujeita. A preocupação com a sua segurança, andando por ruelas escuras ou no meio do povo, fica por conta do publico já anestesiado pelas notícias de mau agouro televisivo. A cidade carioca de Eryk é uma cidade que parece desconhecer o medo de uma bala perdida ou do assalto saidinha de banco. É um Rio (possível?) de paz. Não há qualquer sinal de violência..., apenas solidão e anonimato até num sexo fugidio. Uma cidade que parece estacionada nos idos dos anos 1950.
Baseado no roteiro de Manuela Dias e de Eryk Rocha, praticamente sem diálogos e com boa dose de “experimentalismo”, Transeunte é um filme inquietante que se projeta longe das neochanchadas brasileiras ou da cinematografia de ocasião. O distraído e ou apressado espectador nada pode fazer quanto ao seu ritmo e nem tão pouco antecipar o destino de Expedito que, como uma canção bossa nova insistindo em harmonizar o funk, vagueia, dono de si mesmo, mas não alheio ao mundo carioca que o cerca, virando construção ou cantoria no botequim que habita o seu caminho.
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