quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Crítica: The Post - A Guerra Secreta


The Post - A Guerra Secreta
por Joba Tridente*

Em um tempo em que fakes são cada vez mais news, criados por imbecis e grupelhos de “informação” em busca de publicidade (e grana fácil), em redes sociais, jornais e revistas (digitais, televisivos, impressos)..., é mais do que pertinente a fala do juiz do Supremo Tribunal dos EUA, Hugo Black, recorrendo à Primeira Emenda da Constituição norte-americana, quando do processo New York Times Co. v. Estados Unidos (1971), por causa da publicação de trechos de um dossiê secreto, desvelando as reais intenções do país na Guerra do Vietnã: “A imprensa deve servir aos governados e não aos governantes”. A afirmação de Black, que você pode ler na íntegra aqui e ou aqui, está presente em The Post - A Guerra Secreta, o novo filme de Steven Spielberg.


The Post - A Guerra Secreta (The Post, EUA, 2017) é um docudrama, com essência de thriller jornalístico, sobre a liberdade de imprensa nos anos 1970 e o seu reflexo nas décadas posteriores. Os eventos do fascinante enredo se passam em 1971, no governo de Nixon (que aparece apenas de costas - suas falas seriam gravações originais), quando o jornal local Washington Post, de propriedade de Katharine 'Kay' Graham (Meryl Streep), a primeira editora de jornal feminino da América, e o editor-chefe Ben Bradlee (Tom Hanks) veem a oportunidade de ganhar mercado e notoriedade com a publicação de um dossiê confidencial norte-americano, relacionado às ações do EUA no Vietnã (1961-1973), depois que o New York Times foi proibido de dar continuidade à sua série de artigos sobre o tema que comprometia os presidentes norte-americanos John Kennedy (1917-1963), Lyndon Johnson (1908-1973) e Richard Nixon (1913-1994) e o Secretário de Defesa dos EUA (1961-1968) Bob McNamara (1916-2009), pois, segundo Nixon, punha em xeque a credibilidade norte-americana (para o resto do mundo).

A trama histórica acompanha os dias tensos que precederam o julgamento da ação contra o New York Times, quando jornalistas, redatores, conselho editorial e advogados do Washington Post, discutem se o jornal tem ou não o direito (segundo a Primeira Emenda Constitucional dos EUA) de publicar novos fatos do dossiê confidencial (de interesse público), colhido da mesma fonte do NYT, e as consequências da publicação: ameaça de prisão, processo, descrédito dos acionistas...


Escrito por Josh Singer (o co-roteirista do excelente Spotlight) e Elizabeth Hannah, o roteiro de The Post - A Guerra Secreta, sobre a liberdade de imprensa e jornalismo investigativo setentista, pode até parecer datado, com o crescimento dos “urgentes” web-jornais, em detrimento dos jornais impressos (e mesmo televisivos)..., mas o assunto continua relevante, já que, indiferente à plataforma midiática, por falta de critérios (ou seria de ética?), a maioria dos veículos de comunicação abusa de notícias sensacionalistas (de ocasião!) em benefício de governos, de políticos e do capitalismo selvagem. No papel, na tv ou na internet, como vimos recentemente em O Abutre (2014), a notícia, a cada dia mais emburrecedora, serve tão somente a quem paga mais por sua veiculação...

Confesso que nunca fui fã dos dramalhões piegas de Steven Spielberg (raramente os vejo), prefiro-o nas divertidas fantasias de ação e aventura, do que em produções ao estilo de Ponte dos Espiões. No entanto, assim como em Lincoln (2012), ele me pareceu mais comedido (em pieguice) e seguro em The Post - A Guerra Secreta, que começa claudicante - pois o assunto é meio confuso até para quem não é estadunidense - e depois engata e cresce intensificando o clima de thriller. Há uma escorregadela aqui e outra acolá (repare nos cartazes de cinema na parede) na composição cênica, mas nada que influa no excelente desenvolvimento narrativo que traz um elenco afinadíssimo (Streep e Hanks magníficos), bela fotografia e notável reconstituição de época e de costumes da machista sociedade norte-americana.


Enfim, considerando o suspense (ainda que se conheça o final do caso The Pentagon Papers); a nostalgia das redações físicas e do aparelhamento de impressão gráfica; a oportuna referência ao escândalo político Watergate (lido e visto em Todos Os Homens do Presidente), ocorrido dois anos após este relato; o interesse histórico, mesmo para quem não está (?) familiarizado com o assunto Vietnã e Liberdade de Imprensa (no mundo) e o puxão de orelhas em quem brinca de jornalismo contemporâneo, futilizando a informação séria e enaltecendo a descartável..., The Post - A Guerra Secreta é um ótimo programa para quem espera que a imprensa realmente sirva aos governados e não aos governantes, neste Brasil maculado por políticos corruptos e mídia conivente e noutros países idem.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

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