Houve um tempo (?) em que a Guerra Fria (1945-1991) entre o capitalismo norte-americano e o socialismo soviético esquentou tanto que os EUA e a URSS só não chegaram ao ponto de combustão porque o potencial nuclear de ambos explodiria a ambos. Nesse período (?) de terrorismo psicológico, de acende o pavio do lado de cá e apaga o pavio do lado se lá, não faltaram fatos e boatos de espionagem e contraespionagem para alimentar a mídia e aumentar a paranoia americana e a aflição no resto do mundo.
É claro que um assunto tão buliçoso
desses não passaria despercebido em Hollywood, que produziu algumas pérolas. O
gênero andava meio esquecido (?), é verdade, até Steven Spielberg apresentar a sua versão da Ponte dos Espiões (Bridge of
Spies, 2015), que resgata o processo de negociação, mediado pelo advogado
de seguros James B. Donovan (Tom Hanks), entre os EUA e a URSS, na
troca do espião britânico de ascendência alemã-russa Rudolf Abel (Mark Rylance)
pelo americano Francis Gary Powers (Austin Stowell).
Ponte
dos Espiões, com roteiro dos irmãos Ethan e Joel Cohen, em parceria com
Matt Charman, não é exatamente um thriller, um filme de espionagem ou de
tribunal, mas um drama(lhão) ao estilo ufanista de Spielberg sobre um advogado
de seguros (Donovan/Hanks) designado
(a contragosto) pela Ordem dos Advogados para defender (e perder a causa) de um
espião “russo” (Abel/Rylance). O
“problema” para a inflexível justiça americana e o júri pro forma é que o nobre advogado estadunidense James B. Donovan (1916-1970)
decide levar a sério o seu trabalho e, com bom argumento, mudar o veredicto de
praxe (pena de morte) para os “crimes” de espionagem. Assim, quando um espião
norte-americano (Powers/Stowell),
piloto do célebre U-2, cai em mãos
soviéticas, o famoso e odiado articulador Donovan
é convocado para negociar (discretamente) a troca dos espiões.
Com os pés no fato (documental) e os
olhos no fato (comercial), o filme de Spielberg, livremente inspirado na
biografia de Donovan (Negotiator: The
Life and Career of James B. Donovan, 2006), escrita por Philip J. Bigger, e,
possivelmente, no livro do próprio advogado (Strangers on a Bridge, The Case of Colonel Abel, 1964), não chega a
ser ruim, mas tampouco é memorável.
Uma vez que se releve as liberdades poéticas, o chauvinismo (argh!), as cenas
bobas (leitores) e analogias (EUA/URSS) piegas via metrô (a última é de matar
diabético!), é até possível encontrar um enredo satisfatório. A trama,
ocupada em defender a Constituição Americana e destacar o valor de seu cidadão
varonil, é claro, passa longe do entretenimento espionagem-pipoca (007, MI)...,
ainda que tenha uma elaborada apresentação do espião Rudolf Abel e uma excelente sequência de perseguição (a pé) sob forte
chuva. Todavia, 140 minutos me pareceu tempo demais para a conversação sobre os
percalços da espionagem e seus espiões notórios.
Enfim, levando em conta que Ponte dos Espiões é inspirado em fatos
e que os irmãos Cohen marcam boa presença na ironia de alguns diálogos e
pontuadas situações; que a curiosidade histórica é para americanófilo algum
botar defeito; que Mark Rylance, em magnífica interpretação, rouba todas as
cenas; que Tom Hanks, sempre à vontade, emociona; que a invasiva trilha de Thomas
Newman, insuportável em sua grandiloquência choramingas, não tira o brilho da
impressionante fotografia (sépia) de Janusz Kaminski..., considero que os fãs do
Spielberg (melo)dramático vão gostar. Eu sou mais do Spielberg aventuresco.
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