Quando me
proponho a ver algum filme, não leio críticas e ou sinopses reveladoras. Prefiro
fazer a minha própria leitura. Sei que apostar no diretor e ou no elenco pode não
ser a melhor das alternativas, mas é pelo que vale arriscar, mesmo ciente de
que nomes, passado e prêmios não garantem um bom espetáculo. Cinema (também) é
uma cultura de risco! Assim, a sensação de ganho ou perda, de horas na sala,
dependerá da minha expectativa. Vi A
Pele Que Habito, bem depois do lançamento, na primeira de duas sessões, num
cinema, praticamente, vazio.
Baseado
no roteiro de Pedro e Augustín Almodóvar, A
Pele Que Habito é uma ficção científica de horror B, inspirada no livro Mygale (lançado no Brasil pela Editora
Record, com o título Tarântula), do
escritor francês Thierry Jonquet (1959-2009). Em sua trama rasa e nada
convincente, Antonio Banderas é o
ilustre e inescrupuloso cirurgião plástico Robert
Ledgard que, após duas tragédias em sua família e por razões pessoais, de
dedica à pesquisa de uma pele artificial e às novas técnicas de cirurgia,
usando como cobaia a paciente Vera (Elena Anaya). A sua governanta é Marilia (Marisa Paredes), uma velha conhecida, cuja intimidade será
desvelada aos poucos.
Assisti a
todos os filmes de Pedro Almodóvar que
passaram no Brasil. Alguns perderam um pouco do encanto numa segunda vista, mas,
no geral, continuo gostando da grande maioria. Talvez por isso a frustração
diante de A Pele Que Habito (La Piel que Habito, Espanha, 2011), que
me pareceu um cinema tributo ao próprio Almodóvar, por conta dos retalhos “referências”
de outras produções suas costuradas aqui e ali. Os signos de cada autor são a
sua assinatura e com Almodóvar não é diferente. Seus filmes são reconhecíveis pela
ousadia, pelas cores, pelas personagens femininas (e atrizes), pela bizarrice,
pelo humor (negro) ou melodrama, sem que se leia seu nome nos créditos. Porém,
desta vez, nem ele e nem os atores e seus personagens convencem. Todos (!) os
seus clichês estão ali, literalmente à flor da pele: tortura, sadomasoquismo, supressão
da identidade, violência, submissão, crise familiar e sexual, vingança,
mulheres, novelão, fetiche. Mas os elementos não têm liga. Se der continuidade,
deu!
A
produção flerta com a ficção científica (nem tanto por se passar em 2012, mas
porque, a despeito da existência de uma pele artificial, a ciência médica ainda
não criou aquele tipo de pele inviolável (imune a fogo, cortes, picadas) e
tampouco tem tecnologia para modificar um esqueleto (da cabeça aos pés), como
faz o Dr. Ledgard. Se já era difícil
engolir a o troca-troca de rosto de John Travolta e Nicolas Cage em A Outra Face (Face/Off), de John
Woo, aceitar a modificação da ossatura humana é pior ainda. Haja metáfora e
imaginação! É mais fácil acreditar que Clark
Kent e Superman são duas pessoas
diferentes. Quanto ao horror B, ele se dá por conta do clima kitsch chic,
beirando o trash, que a permeia: o “baiano brasileño” Zeca (Roberto Álamo),
fantasiado de Tigre, seria hilário, não fosse ele uma ridícula caricatura bem
ao gosto dos gringos que ainda pensam que samba é rumba.
Apesar de
Almodóvar estar (ausente?) em tudo, do começo ao enfadonho e tolo final, A Pele Que Habito parece ter sido
dirigido por um cover (dele) enroscado numa atadura. Todavia, nem tudo é um equívoco
neste filme que se assiste bocejando. Há que se destacar a direção de arte, na
minuciosa temática dos quadros espalhados pela casa-clínica de Ledgard, mas o que chama a atenção,
mesmo, é o que se vê nas entrelinhas do leitmotiv, em duas belas sequências: a
da releitura de Venus del Espejo, de Diego
Velázques (1599 - 1660), transformada em Venus
del Video, quando o doutor examina a sua paciente deitada nua, através de
uma imensa tela de televisão (que remete ao belo Os Abraços Partidos); e o grito visual de Vera, ainda que prisioneiro, extrapolando a dor e se espalhando
pela parede do quarto. Num melodrama sonolento e de pouco interesse, com uma
óbvia “reviravolta reveladora” e um final, precedido de risível chantagem (!),
pra lá de previsível, foi o que me valeu.
Prezado Joba: ótimo texto! Também acho que esse filme tem umas questões que merecem ser discutidas. Veja meu texto: http://arquivoscriticos.blogspot.com/2011/12/sim-almodovar-as-aparencias-enganam-mas.html
ResponderExcluirOlá, Ravel.
ResponderExcluirSua leitura é mais complexa que a minha.
Depois que postei a crítica no Claque ou Claquete, saí a ler as matérias alheias.
Abri várias páginas e, infelizmente,
me perdi ao não salvar o nome e o endereço
de uma autora que fez um comentário mordaz,
ferino, sobre o crime e o castigo em A Pele Que Habito.
Ela dizia (ironicamente)algo como: ser mulher é um fardo tão grande que a pena imputada a um criminoso é transformá-lo em uma.
Para se pensar!
Abs.
T+
Joba
Oi, Joba! Fiquei curioso em ler esse texto. Vou procurá-lo, e se achar lhe mando o link. Gostei de seu texto, também, sobre Operação Presente. Vimos o final de forma semelhante.
ResponderExcluirGrande abraço!
Olá, Ravel.
ResponderExcluirSe voltar a esbarrar na crítica
eu lhe informo.
Abração.
T+
Joba