sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Crítica: O Ritual


por Joba Tridente

Desde o clássico O Exorcista (1973), de William Friedkin, baseado no livro homônimo de William Peter Blatty, Hollywood firmou o seu gosto pelo gênero e de tempos em tempos ressuscita Deus e o Diabo pra um duelo que todo mundo sabe quem será o vencedor. Em 2011 quem vai para o ringue é O Ritual (The Rite, EUA, 2011), de Mikael Håfström. Com certeza não será o último filme a tratar do batido tema que acaba provocando mais susto (conduzido pela trilha sonora) do que necessariamente medo, pelas batidas sequências de exorcismo. Mesmo sabendo o momento exato da chatice onomatopaica “musical”: Crash! Bum! Tá! Cabum! Blem!, Bong!, o espectador se assusta. Fora isso, segue uma discussão frouxa sobre os (des)caminhos da fé e do ceticismo (de sempre). É claro que não haveria um filme sobre exorcismo sem o conflito da fé versus ceticismo e a indefectível lenga-lenga de que é preciso ver pra crer.

A batalha contra o Diabo, que é a principal tarefa de São Miguel Arcanjo, ainda está sendo travada, porque o Diabo ainda existe e está em atividade no mundo - Papa João Paulo II.

Diz um crédito inicial que o filme é baseado em fatos reais publicados no livro The Rite: The Making of a Modern Exorcist (O Ritual: A Formação do Exorcista Moderno), de Matt Baglio, um jornalista que, em 2007, ao ouvir falar que o Vaticano estava criando uma Escola de Exorcismo, com a pretensão de colocar um padre exorcista em cada diocese ao redor do mundo, passou a investigar a notícia. Foi assim que conheceu o padre americano Gary Thomas, que estava frequentando o seminário, no Ateneu Pontifício Regina Apostolorum, em Roma. Da conversa entre os dois, em vez de um artigo, foi escrito o livro (com intenções cinematográficas). Tenho sérias dúvidas com o dito: baseado em fatos reais. Acho que inspirado é muito mais honesto, já que, de uma forma ou de outra, verdade ou mentira, a história vai ser modificada, a bel-prazer dos realizadores, pra virar um rendoso entretenimento.

Por falar em frase de impacto, quando criança, tinha um anúncio na televisão mostrando duas senhoras fazendo compras num mercado e discutindo sobre uma marca de sabão em pó, cujo texto na caixa dizia fazer maravilhas com as roupas, e uma das mulheres, contrariando a outra, dizia: Ah, isso eles escrevem na embalagem! Todo mundo sabe que a publicidade existe pra induzir os incautos a comprar um produto, independente da qualidade e da sua necessidade. No cinema não é diferente, escolhe se diretor e elenco pra vender um produto, se for possível inserir que aquela história é baseada em fatos reais e o público acreditar, o filme está feito. É um risco que nem sempre dá certo pra quem faz ou quem assiste.


O Ritual conta a história de Michael Kovak (Colin O’Donoghue), um jovem americano cético que, pra fugir do destino hereditário de se tornar um agente funerário, resolve ir pra um seminário, na vã esperança de despertar a sua fé oculta e, de quebra, ter uma boa educação. O plano é estudar e depois saltar fora, antes de ser ordenado padre. Mas, na hora “H”, é chantageado pelo Padre Matthew (Toby Jone) e se vê obrigado a ir para Roma, fazer um curso intensivo de exorcismo. Na sala de aula conhece a jornalista Angeline (Alice Braga), interessada em escrever um artigo sobre o assunto, que fica curiosa a respeito do seu ponto de vista anticlerical. Para ilustrar a teoria do curso, Kovak é recomendado ao padre jesuíta Lucas (Anthony Hopkins), um exorcista juramentado e nada convencional, que tem as suas manhas pra discutir com os Diabos de Possessão que, não tendo ocupação no Inferno, arranjam hospedeiros e passam o tempo fazendo profecias e adivinhações.

O roteirista Michael Petroni tenta, mas não consegue fugir do lugar comum e do previsível. A fraca luz que Kovak, personagem mais perplexo do que complexo, joga sobre o tema: religião (possessão demoníaca) versus psiquiatria (esquizofrenia), acaba se dissipando numa discussão sem brilho com Padre Lucas. No dito pelo não dito acaba prevalecendo o ideário Católico Apostólico Romano. Ou seja, ajoelhou tem que rezar. Filmado em Roma e Budapeste, a impressão é a de que O Ritual não passa de marketing da Igreja Católica (com a falta de contingente) para assediar jovens com uma proposta de sacerdócio com emoção (diabólica). Em tempos de “evangélicos” se reproduzindo feito praga, nos canais televisivos de todo o mundo, com seus exorcismos circenses e vendendo salvação aos tolos, por 30 tostões, qualquer arma é alma no cofre.

Dizer que o velho terror está de volta, com O Ritual, é uma blasfêmia. Além da fascinante atuação de Hopkins não há muito mais o que registrar, já que o resto do elenco cumpre seu papel com correção. O clima não foge à regra e nem dispensa clichês: lugares lúgubres e possessos blasfemando com voz cavernosa, revirando olhos, espumando, escamando a pele etc. É um filme bom, pra quem nunca viu algo do gênero, mediano, pra quem viu pelo menos o clássico O Exorcista e o curioso O Exorcismo de Emily Rose (2005), de Scott Derrickson, e ruim, pra quem já viu tudo quanto é tipo de cinema exorcizante. Todavia, posso estar enganado (já que vi apenas uns quatro), porque, como se diz, 99 não é 100.

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