NOTRE DAME
por Joba
Tridente
Está chegando às salas de
cinema, no Brasil, o filme Notre Dame (2019), da diretora, roteirista e atriz
francesa Valérie Donzelli (Rainha de Copas), trazendo uma trama
híbrida que claudica no drama, na comédia de costumes, na fantasia, no musical
e na dança..., mas sem assumir (?) um e ou outro gênero (à francesa). Na
história, escrita por Donzelli (em parceria com Benjamin Charbit), acompanhamos
o cotidiano da ocupadíssima Maud Crayon (Valérie Donzelli), uma arquiteta
que, além de mãe dos adolescentes Françoise
(Nafsica Labrakos) e Vincent (Benjamin Ewers), acolhe em
sua casa e cama o ex-marido mala sem alça Martial (Thomas Scimeca),
sempre que este briga com a nova mulher, e anda mexida por uma antiga paixão, o
jornalista Bacchus Renard (Pierre Deladonchamps).
Na peripécia do
fantasioso, a magia do cinema acontece logo no começo da “trama”, ali pelo prólogo de definição
de personagens, quando, por artimanhas da Fadinha da Natureza dos Ventos Tempestuosos,
numa sequência de puro delírio ou sonho, Maud, que é uma arquiteta
insegura, meio tola e sem voz própria, tem a maquete de um parquinho infantil
(encantado) arrebatada de sua casa e milagrosamente premiada, na véspera de
Natal, num concurso (que ela nem se inscreveu) de revitalização da Esplanada de
Notre Dame (antes do incêndio de 2019) lançado pela Câmara Municipal de Paris. A
partir daí, a vida de Maud, que já não era fácil, por conta de dívidas e
do chefe cínico Greg (Samir Guesmi), torna-se mais tensa, com o
acompanhamento do desenvolvimento do projeto, do início das obras, do protesto
dos franceses contra o projeto, que tem mais nada a ver com o original..., além
dos problemas familiares triviais que inclui até uma possível gravidez.
Notre Dame, que se quer questionador da
arquitetura também como forma de arte (há um embate tosco e fugaz sobre o
assunto, que vai parar nos tribunais), é um filme bem linear, onde não faltam
clichês (abomináveis escorregões - típicos de comédias americanas, profissionais
atrapalhados e atrasados, burocracia, a indefectível liberdade sexual dos
casais franceses etc) e nem cenas constrangedoras de “canto” e de “dança”. Seus
personagens (majoritariamente masculinos), mais rasos que um pires, são tão caricatos
e insossos que você pouco se importa com o destino deles. Sinceramente, é
difícil acreditar que, nos dias de hoje, uma mulher como Maud seja tão
submissa aos homens imbecis ao seu redor. É pelo medo de dizer não e ou pela
carência afetiva e econômica?
Apostando num tom
excessivamente fantasioso (e homenagem até ao ET de Spielberg), Notre
Dame é um filme ideal para quem não quer ter o trabalho de pensar nem no
porquê dos personagens usarem praticamente as mesmas roupas do princípio ao fim,
com alguns detalhes relacionados à bandeira francesa..., e tão pouco se importar
de ter a sua inteligência subestimada. O enredo é tão rasteiro que nem
tangencia as questões sociais que apelativamente registra. Ora, se não há
intenção alguma em repercutir a situação dos desabrigados de Paris, por que
registrar melancolicamente uma família, em situação de rua (imigrantes?), na
calçada do prédio da protagonista? Ainda que a sequência seja ligeira, para não
criar vínculo (ou seria vinco?), se o interesse é tão somente o da “comédia”,
por que apelar para a comoção do espectador com tais imagens piegas?
Enfim, a se acreditar na
proposta de uma comédia romântica com elementos fantásticos, Notre Dame carece
de humor que provoque (aos mais exigentes), no mínimo, um sorriso amarelo. Nem
mesmo a parte reservada ao romance convence. Suas gags (algumas americanizadas)
são ridículas e as cenas de nudez são tão batidas que causam mais enfado
que riso e ou espanto. Parece até que a trama foi sendo desenvolvida no
improviso narrativo..., o que, na toada da chanson, talvez resultasse
melhor num musical que numa pretensa comédie française. Ah, e como perguntar não ofende: Se o filme
é francês e fala de arte e de intervenções e ou marcos arquitetônicos em Paris,
como a Torre Eiffel e a Pirâmide (de vidro) do Louvre, por que a sua
protagonista veste uma camiseta com a estampa I (coração
vermelho = Love) Paris..., em vez de Je T’aime
Paris?
NOTA: As considerações acima são pessoais
e, portanto, podem não refletir a opinião geral dos espectadores e cinéfilos de
carteirinha.
Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema)
aos 5 anos de idade. Os primeiros videodocumentários fiz em 1990. O primeiro
curta-metragem (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer
crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se
compara à "traumatizante" e divertida experiência de
cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do
norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003),
de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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