sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Crítica: A Chegada


A  Chegada
por Joba Tridente

Para quem está procurando novidade no gênero ficção científica, uma boa sugestão é o enigmático e introspectivo filme A Chegada, do diretor canadense Denis Villeneuve, baseado na novela A Story of Your Life (prêmios Sturgeon/1999 e Nebula/2000), do escritor Ted Chiang..., obra que discute a (ainda controversa) relatividade linguística Sapir-Whorf ¹.


A Chegada (Arrival, 2016), com suas aeronaves côncavas pairando entre o Céu e a Terra ou entre o Céu e o Mar, feito 12 Torres de Babel em forma de orelha de pedra, nos conduz curiosamente através do signo linguístico a uma intensa viagem ao obscuro interior de nós mesmos. O quê ou quem somos nós diante de um desconhecido? Por que tememos (e nos armamos) diante do desconhecido. A palavra ou sua ausência é o quê nos conduz à glória e ou à derrota..., das meras relações familiares às internacionais (ou interestelares!). Passamos a vida interpretando sinais da natureza animal e não-animal e basta uma imagem e ou gesto em falso, uma palavra mal dita, mal pontuada e ou mal significada, um alimento vencido..., para a linha da vida se tornar ininteligível.


Ver (o outro), ouvir (o outro), compreender (o outro) para, então, dialogar com o outro é a base, o mote deste thriller espetacular que procura na metafísica uma forma diferenciada de se comunicar com o espectador. Nele, acompanhamos fascinados o trabalho da linguista Dra. Louise Banks (Amy Adams) e do físico Ian Donelly (Jeremy Renner), convocados pelo coronel Weber (Forest Whitaker), das Forças Armadas Americanas, para intermediarem o contato entre humanos e alienígenas, cuja nave “pousou” em Montana.

O quê não lhes falta são perguntas aos visitantes espaciais. Porém, como indagar das suas intenções (turismo, imigração ou invasão?) quando não se tem ideia da língua deles e nem ciência de que conhecem a nossa? Enquanto os governos de todo o mundo têm pressa em conhecer a motivação alienígena, para (se preciso) se armar..., Louise precisa de tempo para encontrar a ferramenta certa, a sua Pedra de Roseta para decifrar um painel repleto de signos complexos, no interior da nave. Cena que remete a uma sequência emocionante em Para Sempre Alice (2014), onde, em plena sala de aula, a linguista Alice/Juliane Moore, sentindo os primeiros sintomas do Mal de Alzheimer, não consegue definir “Léxico” (..., as palavras estão todas aí, mas não consigo alcançá-las!). É o mesmo sentimento de impotência de Banks e Donelly frente a um símbolo de “duplo” sentido.


A Chegada, com ótimo roteiro de Eric Heisserer, é um drama existencial pautado pela comunicação entre espécies diferentes, pela busca de um diálogo em comum (pacifista!), seja com ETs, com governos interconectados e ou com cidadãos que se deixam influenciar pela mídia sensacionalista e as religiões descerebradas. A trama intimista desvela a aldeia (que se quer) global a cada dia mais fragmentada. Toda via do verbo mal conjugado, num mundo individualista (que se quer unido), constantemente hackeado (espionado), como confiar em quem nos parece “perigoso” por conta da língua e ou do costume?

Ao contrário das anestesiantes produções de ação explosiva, repletas de efeitos especiais mirabolantes, A Chegada é uma ficção científica provocativa, do tipo que estimula o cérebro, fazendo até mesmo o espectador mais néscio pensar no assunto. Sem parecer didática, a narrativa sóbria (que joga com o fluxo de tempo na memória afetiva) explora as ciências humanas e as exatas sem arrogância e ou achismos bobos..., embora no campo fictício tenha essa liberdade poética imaginativa que diverte fãs do gênero e apavora cientistas (reais). A gravidade singular, no interior da nave extraterrestre, é um achado que pode ter um duplo sentido nas duas ciências!


Enfim, considerando o brilho do roteiro contrario à “lógica” hollywoodiana do mocinho americano versus vilão espacial; a direção equilibradíssima; o elenco excelente; a eficiência dos “tímidos” efeitos especiais; a montagem (pegadinha?) bacana..., definitivamente, este é um filme indicado ao espectador inteligente ou, pelo menos, acima da média, à procura de diversão com reflexão!


1. Relatividade Linguística, sugestão de leitura, entre outras: A teoria da relatividade linguística Sapir-Whorf e Universalismo e Relativismo Linguístico.


Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

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