Em 31 de
Julho de 2014, publiquei a saborosa crônica Cinema em Curitiba, de Luiz Renato Roble.
Mesmo muito acessada, somente dois anos depois ela recebeu um comentário do
cinéfilo João Carlos Amódio. Gostei
tanto que, a meu pedido, o comentário foi revisto, ampliado e formatado nesta
crônica que você confere abaixo.
Flash Gordon - 1936 |
O Cinema no Tempo dos
Seriados
João Carlos Amódio
Sempre fui
fanático por cinema, pois sou de uma geração que não tinha TV para ver. Teatro
infantil nunca ouvi falar. Sou do tempo dos seriados no cinema. Após o ultimo
filme, vinha o seriado, um espécie de filme-novela, geralmente de far west (faroeste) ou ficção
cientifica, como o Flash Gordon, ou
de aventuras, como O Fantasma que nunca
morre!, com seu cão e seu anel em formato de caveira. Quando ele dava um
soco na face do bandido, deixava a estampa da caveira marcada. Ainda acho que
era para o todo sempre!
No cinema de
meu bairro, o Guarani, nos bons
tempos, tinha matinê aos sábados e aos domingos. Como os seriados só passavam
aos sábados, éramos “obrigados” a ir aos sábados e aos domingos! Antes de morar
no Portão, morávamos no centro da cidade de Curitiba e meus pais também
gostavam muito de cinema. Quando eu tinha os meus 7 anos já podia entrar nos
cinemas à noite, acompanhado dos pais. Ainda não havia uma censura por faixa de
idade e os filmes eram livre ou impróprio para menores de 18 anos!
Phantom - Fantasma - 1943 |
Nessa época
passavam muitos filmes italianos, alemães, ainda de antes da II Guerra. Os que
mais me marcaram foram os italianos, os filmes
noir, soturnos mesmo. Ainda lembro de um, que me marcou muito, em que havia
uma cena noturna em uma pequena aldeia cercada por uma muralha, onde um vigia
noturno, com um lampião nas mãos, a percorria toda, entoando: “Mezza notte! Tutti dormine tranquilo!” Vendo
a sua sombra refletida por muitos metros no chão da calçada por onde passava e
aterrorizado com o que podia acontecer a seguir falei: “Pai, quero ir fazer xixi!” Uma vez, duas, três, quatro! Aí minha
mãe disse: “Carlos leve o Joãozinho para
o banheiro!”.
Lá fui eu e
ele para o banheiro. Na realidade eu não queria fazer xixi nenhum, queria era
sair da cena soturna do filme. Entrei no reservado e fiquei contando os
azulejos do banheiro. Meu pai, já louco de raiva por estar perdendo o melhor da
fita (nesse tempo era esse o termo para filme), dizia: “Faz logo!” E nada de fazer! Então o jeito foi voltar para a
poltrona. Enquanto a cena era outra, tudo bem, mas quando voltou a sequência
aterrorizante, o jeito foi fechar os olhos. Embora continuasse ouvindo o som!
Bruxa - Branca de Neve - 1937 |
Esse filme
italiano, que me marcou tanto, eu só vi uma vez. Imagina se tivesse visto mais
vezes?! Também me lembro de quando foi exibido, pela primeira vez em Curitiba, o
desenho Branca de Neve. Foi no Cine Avenida. Era manhã de domingo e lá fomos nós, meu pai e eu,
numa matinada. Quando chegamos a sessão já tinha iniciado e, no que eu entro na
sala, tudo escuro, aparece uma bruxa com uma enorme berruga na ponta do nariz
e, segurando uma maçã em uma das mãos, solta aquela gargalhada. Ouvindo aquele
som terrível, vindo lá do útero da malvada, agarrei a mão de meu pai e gritei:
“VAMOS EMBORA!!!!” Saí puxando ele. Na sala de espera, meu pai
me acalmou e me convenceu a entrar novamente. Fui, mas com um “medaço” danado
da dita bruxa!
Que sufoco!
Ainda bem que meu pai tinha uma paciência de Jó!
*
fotos:
web
João Carlos Amódio
(por ele mesmo): “Meus guias são os cinéfilos! Pelo lado materno tem o primo
Henrique de Oliveira Jr., fotógrafo, técnico de cinema, diretor de filmes e
agitador cultural. Ele começou a fotografar aos 8 anos. Aos 12, empregou-se
como ajudante num laboratório dentário e, com a experiência, tornou-se
protético. Autodidata, projetou e construiu um projetor 35 mm e câmeras de
diversas bitolas. O Sauro José Bartolomei, um tio e padrinho de batismo, que
desde menino realizava suas seções de cinema na casa de minha avó, na vida adulta
comprou câmeras 16 mm e projetor sonoro Bell e câmera Super-8 e projetor para Super-8, com
que filmava e exibia as festas natalinas da família e todos os acontecimentos
que considerava importantes. Como se não bastasse, uma sobrinha minha casou-se
com um sobrinho do Pascoal Segreto, o cara que inaugurou o primeiro cinema no
Brasil. Tem o cinéfilo o Ismail Macedo, um dos sócios proprietários do Cine Guarani, do Portão. Outro
personagem muito importante no meu aprimoramento pelo cinema foi Waldomiro
Jensen, técnico eletrônico, responsável pela parte técnica dos projetores e do
sistema de som dos cinemas do grupo David Carneiro. Finalizo com o Professor
Leonel Moro, inventor do processo de filmagem denominado Moroscope! É tudo isso
e um pouco mais." Quem desejar saber detalhadamente sobre cada personagem aqui citado,
é só visitar o meu blog Matinês
no Cine Guarani.
Muito bom! :D
ResponderExcluirComo sempre, uma das máximas do cinema é a experiência coletiva, o compartilhamento de impressões sobre cada filme descritas com subjetividade rara, ainda mais quando enaltece uma boa nostalgia que vale a leitura.
..., com certeza, Thiago. ..., como serão as suas lembranças de hoje, num amanhã mais distante? abs,
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