NOITE MÁGICA
por Joba Tridente
O ano é 1990. Verão. Os italianos estão apostando
tudo na sua famosa Squadra Azzurra na Copa do Mundo de Futebol, na Itália. Na
fatídica noite de 3 de julho, enquanto a semifinal entre a Itália e a Argentina leva
os torcedores à loucura, o produtor de filmes Leandro Saponaro (Giancarlo
Giannini) é encontrado morto nas águas do rio Tibre. Os suspeitos: Antonio
Scordia (Mauro Lamantia), Eugenia Malaspina (Irene Vetere),
Luciano Ambrogi (Giovanni Toscano), três aspirantes a roteiristas
e finalistas do Prêmio Solinas que vieram à Roma conhecer o vencedor e foram os
últimos a vê-lo com vida. Segundo Giusy Fusacchia (Marina Rocco),
a deslumbrada amante do morto, eles são os assassinos. Será? E qual seria
a motivação do crime?
É a partir do depoimento dos três, na delegacia, que
conhecemos (em flashback) os bastidores cinematográficos deste “thriller-bufo”
e o enredamento de cada um na história policialesca que se quer tanto cômica quanto
icônica na homenagem à era de ouro do grande cinema italiano. Embora a nova
geração de espectadores (que possivelmente não verá este filme) sequer saiba
quem foi Ettore Scola, Federico Fellini, Michelangelo Antonioni, Dino Risi, Mario
Monicelli, Marcello Mastroianni...
O argumento crítico de Noite Mágica é até interessante
ou ao menos bem-intencionado na releitura saudosista de um passado
cinematográfico à beira da massificação midiática em prol do lucro fácil.
Porém, o mesmo não pode ser dito do enredo pra lá de preguiçoso e que só parece
dinâmico (e até envolvente em algumas cenas) por causa da narrativa apressada e
tipicamente barulhenta. Quanto aos três protagonistas, seus pretenciosos personagens
(de classes sociais e formação diferentes) são tão rasos que não há (?) margem
para a mínima empatia com o público: o primeiro (Antonio), um cinéfilo
falastrão; a segunda (Eugenia), uma autora depressiva; o terceiro (Luciano),
um “sedutor barato” de mulheres. Se bem que as idiossincrasias de cada um
acabam não fazendo muita diferença num contexto onde Roma é tanto a Loba quanto
o Lobo de cada autor cinematográfico..., ora o afaga e o alimenta, ora o
cerceia e o afoga. Mas, como somos prevenidos no “prólogo”, na linha do pênalti
o sucesso do jogador depende do fracasso do goleiro. E vice-versa! Ou ainda,
como diz o delegado (Paolo Sassanelli) durante a investigação da morte
do produtor: para ser roteirista, antes é preciso ser espectador.
Assim, dependendo da paciência do espectador cinéfilo
e ou do espectador casual, o nostálgico Noite Mágica pode ser um filme
prazeroso ou uma grande chateação, já que carece do charme e, principalmente,
daquele antigo humor de gargalhada fácil das inesquecíveis comédias italianas
que “propõe” homenagear. Ainda que busque sinceridade, falta veracidade na
maioria das situações internas e ou externas na cidade de Roma, que continua
eterna e também set de festas sem fim de cinema. Mas não se pode negar
que, ao menos, duas sequências se destacam: a que se passa numa produtora de
roteiros e a da escolha de um ator para representar um trabalhador braçal.
Toda via da trama que se enrosca na encruzilhada de
ideias demais e conteúdo de menos, no entanto, é muito barulho, muita boêmia, muita
bizarrice, muita conversa fiada, muita metalinguagem por nada..., no envolvimento
dos três caricatos jovens adultos com produtores parasitas, diretores
inescrupulosos, roteiristas submissos e artistas em busca de um papel de
destaque que pululam por todo lado. Ah, e quanto à charada do crime, não é
difícil descobrir o assassino e suas razões óbvias.
Noite Mágica (Notti Magiche, 2018), com
direção claudicante de Paolo Virzì (dos ótimos Ella e John e Capital
Humano), que escreveu o rocambolesco roteiro em parceria com Francesca
Archibugi e Francesco Piccolo, é o tipo de filme (de referências?) que o cinéfilo
(ou cinerd) festivo adora embarcar entusiasmado na fricção de reconhecer
(ali) autores e passagens
cinematográficas que o espectador náufrago não tem “obrigação” alguma de
conhecer e tão pouco compreender a pertinência delas na alegoria, como se fato...,
já que a história (que não vem com rodapé explicativo) tem que arrebatar também
o público leigo...
Enfim, parodiando Luigi Pirandello, o filme bem que
podia ser (re)intitulado: três
roteiristas à procura de um roteirista e de um diretor...
*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de
idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo),
em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista
e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado em Curitiba.
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