Victoria
e Abdul - O C0nfidente da Rainha
por Joba Tridente*
Histórias palacianas envolvendo monarcas e súditos,
quando em boas mãos e sob olhar perspicaz, sempre rendem bons filmes. As maquinações
dos bastidores da famosa realeza britânica, com toda pompa e circunstância...,
e algum escândalo conveniente (sempre na boca de cena das intrigas), valem ouro.
Em 1997 o diretor inglês John Madden trouxe para a
telona o interessante e intenso Mrs Brown,
focado na explosiva relação de amizade (próxima ou íntima?) entre a Rainha Victoria (Judi Dench) e o seu arrogante
serviçal cavalariço escocês John Brown
(Billy Connolly). Um relacionamento (de 1864 a 1883) que, segundo os pesquisadores,
teria ido muito além do que se vê no drama (melancólico). Agora, vinte anos
depois, é a vez do diretor britânico Stephen
Frears contar, com muita elegância e humor, do convívio afetivo (próximo ou
íntimo?) da Rainha Victoria (Judi Dench) com seu devotado servo
indiano Abdul Karim (Ali Fazal) na encantadora comédia (quase
dramática) Victoria e Abdul - O
Confidente da Rainha. Um relacionamento afetuoso (de 1887 a 1901) que, nos últimos anos, também tem dado pano pra manga. Aliás, se alguém que nunca chupou uma manga (a
fruta) lhe perguntasse o gosto, o que você diria? A resposta de Abdul para Victoria é inesquecível!
Victoria e
Abdul - O Confidente da Rainha, deliciosamente roteirizado por Lee Hall, é “baseado em eventos reais..., na maior
parte” e também no livro Victoria & Abdul: The True Story of the
Queen’s Closest Confidant (2010), da jornalista Shrabani Basu. A comédia (quase
dramática) tem a “leveza” muito peculiar do indiscreto humor inglês, que se
torna impagável na boca de Mohammed (Adeel Akhtar, ótimo), o indiano simplório
que é “escolhido” para acompanhar o escrevente Abdul (Fazal) até a Inglaterra, para entregar uma moeda cerimonial,
cunhada na Índia (sob domínio britânico), à Rainha
Victória (Dench), em homenagem ao seu Jubileu de Ouro.
A viagem era pra ser um vapt-vupt: chegar, entregar a medalha e voltar. Mas, o
devotadíssimo Abdul acaba despertando
o interesse entusiástico da Rainha
Victoria e é convocado para lhe servir, por tempo indeterminado, como seu “Munshi”, um professor para lhe ensinar
tudo sobre os costumes da misteriosa Índia (onde ela jamais esteve). A surpreendente
amizade e intimidade dos dois, assim como aconteceu com Brown (o servo favorito anterior da Rainha), também escandaliza o
palácio, provocando ciúmes e intrigas entre funcionários, políticos e membros
da buliçosa família real.
Victoria e
Abdul - O Confidente da Rainha é daquelas tramas que te envolvem já nos
primeiros minutos e não te deixam mais escapar das amarras até os créditos
finais. A “doce” ironia dos diálogos de ontem dizem muito das relações
internacionais de hoje, sejam elas monárquicas, republicanas, democráticas, muçulmanas...,
pois, afinal, como diz Mohammed: “Todos querem alguma coisa!” (do outro
para se distinguir do outro). Intolerância, racismo, religião, poesia, sabores
e linguagem fazem parte de uma pauta que prima pela independência (e liberdade
poética) no desenvolvimento do formidável roteiro e excelência de Frears na direção de uma narrativa muito bem-humorada (às vezes ferina!) e com urdidura digna da mais bela lenda oriental.
Considerando a fotografia e direção de arte impecáveis;
a atuação exemplar da adorável Judi Dench
(magnífica e generosa) e do expressivo Ali Fazal (com naturalidade e brilho no olhar cativantes); as personagens protagonistas muito bem desenvolvidas
(deixando maliciosamente para o espectador decidir o que é real e o que é imaginário na fascinante
relação entre a solitária rainha inglesa e seu afetuoso serviçal indiano); o
elenco de apoio formidável; o enredo empolgante, com tiradas geniais..., Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha,
de Stephen Frears, é uma delícia de espetáculo.
Toda via das biografias e fofocas britânicas, porém, quem prefere as velhas verdades sem graça às fabulosas lendas divertidas e sem compromisso, há um bom material especulativo na internet sobre o
indiano/muçulmano Abdul Karim e sobre o escocês John Brown. Não é muita coisa,
já que a família real inglesa tratou de destruir os diários e a correspondência
que os dois trocaram com Victoria. Mas, sabe como é, há sempre um tapete a ser
levantado pra se varrer a poeira acumulada!
*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de
idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo),
em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista
e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e
divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro
tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.
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