sábado, 23 de dezembro de 2017

Crítica: O Rei do Show


O Rei do Show
por Joba Tridente*

Quando se fala em musical não há como não pensar de imediato no cinema e no teatro norte-americano. Ao se falar do envolvente O Rei do Show (The Greatest Showman, 2017), dirigido por Michael Gracey, não há como não se lembrar do intrigante drama Monstros (Freaks, 1932), dirigido por Tod Browing (1880-1962). Ambos trazem em sua trama, seres humanos considerados bizarros, por deficiência física e ou alguma habilidade extraordinária.

O cult Monstros, baseado no conto Spurs (1923), do escritor de horror e mistério Tod Robbins (1888-1949), conta a história de uma bela e interesseira trapezista Cleópatra (Olga Baclanova) que namora o atlético Hércules (Henry Victor) mas se deixa seduzir pela fortuna do anão Hans (Harry Earles). O arrebatador musical O Rei do Show é uma cinebiografia inspirada na vida do controverso produtor e apresentador de show de variedades Phineas Taylor Barnum (1810-1891), que em 1834 chamou a atenção do público ao criar um circo itinerante onde apresentava o seu “Maior Show da Terra”, expondo pessoas “bizarras” e animais exóticos em números “artísticos” que tanto incomodava quanto divertia a plateia formada por gentes que se consideravam normais..., ao menos fisicamente. Assim como no drama de Browing, no musical de Gracey há interessante reflexão sobre preconceitos e sobre a aceitação social do diferente no físico e ou na cor. Bem como histórias circenses de amores (quase) impossíveis de seus protagonistas: a do pobre Barnum (Hugh Jackman) apaixonado pela bem-nascida Charity (Michelle Williams), e a do rico ator branco Phillip Carlyle (Zac Efron) apaixonado pela pobre trapezista negra Anne Wheeler (Zendaya).


Todo espectador sabe que qualquer narrativa (literária, cinematográfica, teatral) inspirada em fatos tem muito de liberdade poética de seus autores. Na intenção de envolver o público (e fazer boa bilheteria), uns douram a pílula e outros a fazem mais amarga. Em O Rei do Show, escrito por Jenny Bicks e Bill Condon, não é diferente. Pontuado com irresistíveis canções da dupla responsável pelas letras de La La Land, Benj Pasek e Justin Paul, levadas numa batida pop, afro e gospel contagiante, o filme traz uma leitura condescendente, que (segundo os estudiosos) destoa da biografia de P.T. Barnum, também tema de um musical (Barnum) que estreou na Broadway em 1980 (ficou em cartaz até 1982 e desde 1981 vem sendo montado em Londres). A mim o enredo não pareceu tão distante (do que li na internet - onde nem tudo é o que é - sobre o personagem).


Provavelmente, por estética ou mercado (?), os realizadores optaram por não polemizar alguns atos embaraçosos (exploração de incapaz, lei de contracepção) creditados ao empresário e político..., uma vez que no breve recorte de vida apresentado não caberiam e ou não haviam ocorrido. Assim como teriam apimentado a história da “Rouxinol Sueca” Jenny Lind (Rebecca Ferguson), com Barnum, quando da sua turnê norte-americana produzida pelo empresário, deixando no ar um melódico “mas poderia ter sido”...., o que jamais foi. 


Dizem que quando a lenda é mais interessante que os fatos, deve se preservar a lenda. O cinema é fantasia óbvia, onde verdade e mentira compartilham o mesmo script..., sem que se saiba qual é uma ou outra. É uma questão de edição ou de interpretação. Porém, quem se importa com a veracidade do roteiro, se quando a música viciante e a coreografia convidativa te envolvem de tal modo que, em vez de se ocupar com alguma incoerência do melodramático enredo, a sua vontade é a de sair cantando e dançando?


Este é o adorável musical O Rei do Show, que canta maravilhosamente um passado onde o atual politicamente correto não tinha vez. Não importa que o espectador saiba nada do empresário estadunidense Barnum, conhecido como o rei das fraudes, por fazer as suas “aberrações” parecerem mais curiosas do que eram realmente no seu famoso P. T. Barnum Grande Museu, Zoológico e Hipódromo Itinerante (de bizarrices). Pois, ainda que o motivo seja o visionário capitalista e tropece em alguma tristeza, é um filme (sobre artistas de circo e teatro) que busca a exaltação da arte. Portanto, este espetáculo deslumbrante poderia se referir a qualquer empreendedor cultural, inclusive fictício.


Enfim, considerando o elenco fabuloso; o polivalente australiano Hugh Jackman dando mais um show em cena (cantando, dançando, interpretando); a música e a coreografia; a direção de arte, a montagem e os efeitos especiais; a excelente direção de atores e a história breve..., se você gosta de musicais romantizados e levemente dramáticos, vai se emocionar com a magia e a ilusão de O Rei do Show.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Crítica: Jumanji: Bem-Vindo à Selva


Jumanji: Bem-Vindo à Selva
por Joba Tridente*

Em 1995, uma das grandes sensações nas salas de cinemas, que marcou a infância e a juventude de muita gente, foi o filme de aventura e ação Jumanji, dirigido por Joe Johnston, a partir do roteiro alucinante de Jonathan Hensleigh, Greg Taylor e Jim Strain. Baseado no livro infantil homônimo de Chris Van Allsburg, publicado em 1982, ele tanto apavorava os menores (e os maiores) quanto divertia com seus efeitos (muito) especiais (para a época). Vinte e dois anos depois, eis que o misterioso tabuleiro reaparece (atualizado em videogame de cartucho) nas telonas para conduzir os novos e os velhos espectadores a uma deliciosa viagem no tempo e direta para o coração da aventura em Jumanji: Bem-Vindo à Selva, com direção de Jake Kasdan.


Roteirizado por Chris McKenna, Jeff Pinkner, Scott Rosenberg e Erik Sommers, também a partir do livro Jimanji, do escritor e ilustrador norte-americano Chris Van Allsburg (Zathura, O Expresso Polar), o despretensioso Jumanji: Bem-Vindo à Selva, dirigido com desenvoltura por Kasdan, leva o público aonde o filme anterior apenas insinuou. Aquela trama, situada em 1969 e 1995 e estrelada por Robin Williams (Alan Parrish), trazia a ação e os horrores da selva para a cidade, esta, nos dias de hoje, leva os nerds Spencer (Alex Wolff) e Martha (Morgan Turner), a popular das selfies Bethany (Madison Iseman) e o esportista Fridge (Ser'Darius Blain), quatro estudantes americanos típicos do ensino médio, para viverem uma aventura perigosa e com muita adrenalina e humor no coração da selva.


Nesta “plataforma” selvagem e atemporal, onde não faltam bandidos motoqueiros, homens broncos, hipopótamos, rinocerontes, elefantes, tigres, cobras, mosquitos..., os jovens aspirados pelo Jumanji (em nova plataforma vintage) compartilham suas personalidades originais com as dos avatares adultos escolhidos no início do jogo, numa divertida inversão de corpos: o magricelo Spencer é o arqueólogo Dr. Smolder Bravestone (Dwayne Johnson), a recatada Martha é a sensual lutadora Ruby Roundhouse (Karen Gillan), a fogosa patricinha Bethany é o cinquentão cartógrafo Professor Shelly Oberon (Jack Black), o grandalhão Fridge é o miúdo zoologista Moose Finbar (Kevin Hart). Uma mudança física e dupla identidade que vai dar muita confusão...


Bem, como os adolescentes (em corpos adultos) não estão de férias e ou simplesmente exercitando a jornada do herói, se quiserem voltar vivos para casa vão ser obrigados a trabalhar juntos para derrotar o grotesco vilão Van Pelt (Bobby Cannavale) e devolver o olho esmeralda (roubado por ele) à gigantesca escultura do tigre de pedra. E para provar que não é tão “sádico” quanto parece, o místico Jumanji dá três vidas para cada jogador e a possibilidade de contarem com a ajuda do aviador Alex (Nick Jonas), aprisionado por ele há muito tempo. Naquele lugar só o tempo é relativo. Portanto, quem só tem três vidas que se cuide! Corra, lute, use a massa cinzenta..., ou seja deletado para o todo sempre!


Com sua história um tanto infantojuvenil, Jumanji: Bem-Vindo à Selva (Welcome to the Jungle, EUA, 2017) pode não causar o mesmo impacto daquela contada em 1995, mas funciona agradavelmente como um bom passatempo..., graças ao ritmo ágil e ao clima de game-pastelão. O roteiro simples não perde tempo explicando o óbvio e nem vacila no propósito de aventura pateta e de pancadaria de cartum. O elenco é afinadíssimo e tem ótima química (inclusive de personagens). As gags e piadas pontuais são engraçadas, principalmente quando os personagens (descobrindo habilidades e discutindo aspectos físicos) riem de si mesmos. Algumas sequências e diálogos (onde se destacam Jack Black e Dwayne Johnson) são impagáveis. Ah, e o fato do vilão parecer caricato e provocar mais riso e nojo que medo faz parte da fantasia.


Enfim, se quiser apenas uma boa diversão, emoldurada com excelentes efeitos especiais, só é preciso que você deixe seu adulto rabugento em casa e embarque no enredo “ingênuo” do indestrutível jogo inteligente (alienígena?) que reaparece quando menos se espera para testar a coragem e a paciência dos jogadores (humanos?). Se quiser algo mais “cabeça”, busque outra sala de cinema. Porque nem mesmo a repetida mensagem edificante de “vencer os próprios medos” é piegas...


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Crítica: Corpo e Alma


CORPO E ALMA
por Joba Tridente*

As histórias românticas mais simples nem sempre são as mais fáceis de se contar e ou de se assistir no cinema, principalmente se intensas e estranhas ao cotidiano. Assim é o belo e insólito drama de amor e dor Corpo e Alma, escrito e dirigido pela cineasta húngara Ildikó Enyedi, ganhador do Urso de Ouro, no 67º Festival Internacional de Cinema de Berlim, onde mereceu também o Prêmio da Federação Internacional de Críticos de Cinema (FIPRESCI) e o Prêmio do Júri Ecumênico. Alexandra Borbély, que interpreta Mária, recebeu o prêmio de melhor atriz europeia no European Film Awards

Assim como algumas produções que conseguem chegar ao sul do Equador, vindas do Leste Europeu, Corpo e Alma (Testről és lélekről, Hungria, 2017) exige uma breve “climatização” do espectador acostumado às histórias mais palatáveis norte-americanas, inglesas, francesas, italianas, espanholas (comuns por aqui)..., seja pela austeridade, ritmo e ou idiossincrasia (cultural) na abordagem de temas de caráter universal. Prato cheio, com direito a sobremesa, para psicólogos e psiquiatras, a narrativa acompanha a curiosa tentativa de relacionamento social e amoroso entre Mária (Alexandra Borbély), a metódica inspetora de qualidade, e Endre (Géza Morcsányi), o diretor financeiro de um matadouro de gado. Ambos solitários e traumatizados.


Mária é rígida, memória privilegiada, segue as normas ao pé da letra..., e apresenta sintomas de Síndrome de Asperger e TOC.  Endre é um sujeito de meia idade, acostumado à rotina laboral, introspectivo, guarda frustrações amorosas..., e tem o braço esquerdo paralisado. Os problemas físico e emocional deles são apenas detalhes em uma fascinante trama de amor doentio que passa longe da pieguice e do novelesco melodramático costumaz. O que motiva o enredo de realismo mágico e vai alinhavando o espectador à narrativa é o magnífico sonho (com um casal de cervos) que têm em comum e só o descobrem a partir de um incidente no matadouro, envolvendo todos os funcionários. A busca pelo porquê do estranho sonho em comum, pontuada por um humor nervoso ou nonsense, vai levá-los por caminhos inusitados da razão.

Brincadeira do destino ou mero fruto do acaso cortando fundo a carne humana para atingir o coração? Com suas ricas metáforas (incômodas e pertinentes ao contexto), relacionando vida e morte, amor e dor, na lida diária em um matadouro (onde nenhum gado que vai morrer – não em função do filme – saúda o seu assassino) e nas noites vazias em um apartamento, Corpo e Alma é uma experiência cinematográfica singular com material suficiente para transformar o olhar do público viciado em “normalidades” ao estilo hollywoodiano. Aqui, cada cabeça uma sentença não é mera força de expressão. Tampouco é a cor e ou a densidade do sangue que nos diferem dos outros animais...


Corpo e Alma é um filme adulto, de beleza e profundidade ímpares, que nos faz pensar sobre os “limites” do corpo e da mente ao desvelar o atalho do labirinto que nos leva à afeição e ou à rejeição humana. Não é um filme fácil, em seu primeiro ato, onde se rivalizam as belas imagens do bucólico sonho com as dolorosas imagens do matadouro (que pode embrulhar o estômago de vegetarianos e veganos). Mas, passado este, digamos, longo prólogo, o roteiro segue bem mais ameno, ao acompanhar o casal protagonista fazendo das tripas coração para vencer seus medos e conseguir se comunicar... Não é possível ir além destas informações, para não cometer spoiler e tirar o impacto da trama.

Embora o script não dependa (ufa!) de trilha (quase ausente) sonora, há uma sequência antológica (rumo ao epílogo) onde a comovente canção What He Wrote, da cantora e compositora (indie folk) inglesa Laura Marling é inserida com precisão cirúrgica. Entre as ótimas performances do elenco, dando credibilidade ao drama, o que sobressai, sem dúvida, é a atuação exemplar de Alexandra Borbély, Géza Morcsányi e Réka Tenki, na pele da psiquiatra Klára.


Com a excelente direção de Ildikó Enyedi, dando forma ao seu inteligente roteiro, que insinua mas não entrega a próxima cena, mantendo o mistério sobre o futuro amoroso de Mária e Endre até o epílogo desconcertante, Corpo e Alma..., que explora muito bem os longos silêncios e os curtos diálogos, apostando nas imersivas imagens (atraentes ou repulsivas) de Máté Herbai..., é recomendado ao espectador que prefere pensar fora da caixa, a dar com a cabeça na tela do cinema comum...


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Crítica: Em Busca de Fellini


Em Busca de Fellini
por Joba Tridente*

O premiadíssimo diretor italiano Federico Fellini (1920-1993) foi um dos maiores cineastas internacionais e um dos raros a se tornar adjetivo (cinema felliniano: surreal, onírico, grotesco, fantástico) ainda em vida. A norte-americana Nancy Cartwright é uma atriz e premiada dubladora (de Bart Simpson há 29 anos) que, aos 28 anos de idade (1985), viajou para a Itália em busca do mestre Fellini (na intenção de comprar os direitos de La Strada para o teatro) e passou por experiências inusitadas. A europeia Ksenia Solo (nascida na Letônia) é a premiada atriz que interpreta Lucy (“alter ego” de Nancy), a garota ingênua do Ohio que, aos 20 anos de idade, vai à Itália em busca do seu (novo) ídolo Federico Fellini e acaba por encontrar a si mesma.


Em Busca de Fellini (In Search of Fellini, EUA/Itália, 2017), dirigido por Taron Lexton, é um melodrama, com alguma comicidade, inspirado nas memórias de viagem de Nancy Cartwright, que desenvolveu o roteiro em parceria com Peter Kjenaas. A história fantasiosa acompanha a jornada de nascimento e renascimento de Lucy (Ksenia Solo), uma garota ingênua de Ohio (EUA), criada pela mãe superprotetora Claire (Maria Bello) para viver num mundo de Contos de Fadas, livre de qualquer perigo da realidade, incluindo homens. Hãnnn?! Em 1993, aos 20 anos (com a inocência de 13) ela nunca trabalhou ou namorou ou ousou ir além do seu jardim, mesmo tendo uma lambreta. Passa os seus dias cor-de-rosa ao lado da mãe, assistindo a filmes americanos edificantes (em preto em branco) ou desenhando infantilidades. A tia Carrie (Mary Lynn Rajskub) não aprova a “educação sem males” da sobrinha, mas pode fazer nada.


Um dia Lucy decide que é hora de tomar um rumo na vida. Já que gosta de filmes, resolve trabalhar com cinema. Lê o anúncio de uma produtora e, mesmo sem qualquer experiência, vai atrás da vaga, que não era exatamente o que ela esperava. No sufoco do contratempo, assiste ao clássico A Estrada da Vida (La Strada, 1954), de Fellini. Deslumbrada com o magnífico drama dirigido pelo italiano, dispõe-se a ver todos os seus outros filmes, mergulhando num mundo novo e provocador muito além da sua imaginação. Totalmente envolvida pela audaciosa obra de Fellini, ela resolve conhecê-lo..., embarcando sozinha numa extraordinária viagem (algo reflexo da sina de Gelsomina/Giulietta Masina) para a Itália, onde realidade, sonho e pesadelo se confundem em sua “estrada”.

Vale ressaltar que Em Busca de Fellini não se trata de filme-tese sobre as obras de Fellini, ainda que as irmãs conservadoras Claire e Carrie, tentando entender o que Lucy viu naqueles filmes esquisitos (para elas), teçam comentários pouco lisonjeiros ao diretor e à sua filmografia, ou que no seu itinerário italiano a garota ouça considerações enaltecedoras a eles. Assim como nem tudo que está “fora de ordem” na trama é felliniano e ou moralismo americano.


Deixando a inverossimilhança de lado (garota que nunca trabalhou ter economias; garota que nunca viajou, nem mesmo pelo seu país, ter um passaporte à mão; garota que, de um dia pro outro, consegue o telefone de Fellini, agenda visita e embarca às cegas num voo para Roma) é até possível curtir este (bem intencionado) filme referência e reverência ao Il Maestro. O público que nunca (?) assistiu a um Fellini original pode estranhar e ou não compreender os clipes fragmentados de clássicos como A Doce Vida, Noites de Cabíria, Satyricon, A Estrada da Vida, entre outros, que se embaralham (recriados) no enredo juvenil que vai da fantasia romântica (em Verona, de Romeu e Julieta) à luxúria (em Veneza, de Giacomo Casanova) e conciliação (em Roma, de Fellini)..., mas deve se deixar levar pela alucinante onda “carnavalesca” e ter algum de seus sentidos despertados para a obra felliniana.


O argumento de Em Busca de Fellini é bem interessante. Porém, o seu roteiro agridoce é raso..., simplório demais para a pretendida grandiosidade de “se encontrar” Fellini (e sua obra) por meio de uma mulher (aparentemente) adulta, mas com resquício inequívoco de uma garota ingênua. O excesso de alegorias fellinianas teatrais (algumas gratuitas) e clichês melodramáticos e turísticos (da Itália) comprometem um pouco a cadência narrativa, que claudica no terceiro ato. O elenco, incluindo atores que trabalharam com Fellini, é bom..., o que não chega a empolgar é a motivação da imprudente personagem Lucy. Sinceramente, é impossível imaginar que uma pessoa tão tola tenha chegado tão longe. Assim, com um furo de língua aqui e outro de costume acolá, dado o material roteirizado irregular, que merecia uma boa revisão, não se pode exigir muito mais do que a razoável direção de Taron apresenta. Afinal, é a visão norte-americana da cultura italiana em cena.

Embora a temática curiosa pudesse render muito mais que macarrão com molho de tomate..., não ficasse no saudosismo do hot-dog, Em Busca de Fellini vai encontrar seu público entre espectadores fellinianos e ou leigos pouco exigentes, já que a história edificante (no estilo Jornada da Heroína) não é de dar trabalho à massa cinzenta.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Crítica: Lucky


LUCKY
por Joba Tridente*

O cinema está cheio de gente de nome e renome que dá voltas e mais voltas pra contar uma história frouxa que vai de lugar algum para lugar nenhum embalada por trilha sonora horrenda. Assim como de gente que chega de mansinho, encontra um atalho, abre caminho e surpreende com um trabalho primoroso, fazendo de uma pequena crônica de costumes um poemeto visual de encher os olhos, abraçar a alma e alargar o sorriso..., como o quarteto formado por três estreantes: John Carroll Lynch (diretor), Logan Sparks e Drago Sumonja (roteiristas), e um consagrado: Harry Dean Stanton (ator), que dá vida longa a um personagem fascinante: Lucky.

Lucky (Lucky, EUA, 2017) marca três chegadas (diretor e roteiristas) ao mercado cinematográfico e uma partida das telonas, ao registrar a última performance do ator, cantor e músico Harry Dean Stanton, que ganhou notoriedade por seu desempenho como Travis, em Paris, Texas (1984), de Wim Wenders, e que, aos 91 anos de vida e 63 de carreira, nos deixou recentemente (15.09.2017). Na trama, por vezes a história de Lucky se confunde com a do próprio Stanton, que durante a Segunda Guerra Mundial também serviu na Marinha dos EUA, como cozinheiro..., dando um caráter documental à ficção.


O drama, lapidado ao extremo, se passa numa pequena cidade (qualquer), cercada de montanhas, cactos, deserto..., possivelmente no Novo México. A narrativa melancólica e jamais depressiva, que flerta com o realismo fantástico, orbita ao redor da rotina do velho Lucky (Stanton), com seus cigarros, exercícios de yoga, palavras cruzadas, programas de competições culturais na tv, caminhadas até a lanchonete, a mercearia, ao bar..., onde encontra alguns amigos, também velhos e saudosos (encarnados por grandes nomes: David Lynch, Beth Grant, James Darren, Hugo Armstrong, Barry Shabaka Henley, Yvonne Huff, Tom Skerritt, Ed Begley Jr.).

Nesses (re)encontros diários, onde cada um encara a velhice a seu modo, eles trocam repetidas confidências. Lucky “filosofa” sobre a vida, a morte e o “nada” futuro, além de desconcertar os ouvintes com suas teorias sobre o realismo e a verdade. Determinado e solidário, não mede esforços para consolar e ou defender o amigo Howard (David Lynch, adorável), cujo animal de estimação, um cágado de 100 anos, chamado de Presidente Roosevelt, fugiu de casa.


Para Lucky..., que envelhece sozinho (não solitário!), atropelado por lembranças infantojuvenis, naquele lugarejo longínquo, onde a modernidade, tão aborrecida quanto alguns programas de televisão, demora pousar..., a vida é feita de aventura e desventura, enquanto se degusta um copo de leite, de café cremoso ou de bloody mary em boa companhia. Provavelmente até o cágado Presidente Roosevelt, em sua escapada lenta pelo deserto, sabe disso ao perder-se na busca de algum sentido para a vida.

Saber contar e dirigir uma história cativante é um privilégio. Sorte de iniciantes ou não, a verdade é que Lucky é um drama belíssimo, cuja singularidade faz lembrar o também contemplativo Paterson (2016), de Jim Jamurch. É notável o jeito de Carroll Lynch trabalhar a experiência mística do ateu Lucky diante da resistência do Éden e da insistência do Inferno, na ambiguidade da que fecha ou abre as Portas da Percepção ou da Conveniência.


A narrativa, sem arestas e sem pressa, emociona com sequências irretocáveis, como a do pungente diálogo entre Lucky e o veterano militar Fred (Tom Skerritt), na troca de experiências sobre os horrores da Segunda Guerra, ou da animada festa de aniversário de dez anos de Juan Wayne (Ulysses Olmedo), filho da comerciante Bibi (Bertila Damas), em que Lucky canta a enternecedora Volver, Volver (de Fernando Maldonado)..., canção que, de certo modo, dialoga com a sombria I See A Darkness, de Bonnie 'Prince' Billy, interpretada por Johnny Cash, numa cena arrepiante (praticamente em preto e branco) no quarto de Lucky... Infelizmente (como é de praxe no Brasil) as duas canções importantes no contexto não estão legendadas.

Enfim, o enredo simples e convincente de Lucky te enreda de tal forma que, quando o filme termina, você fica sentado na poltrona, hipnotizado pelo brilhantismo daquela derradeira cena surreal. Você fica ali, lendo os créditos, esperando algo a mais. Talvez uma cena escondida! E precisa? Não! Aqui o menos é inacreditavelmente muito mais. A medida do filme é exata no entrelaçado da imagem e da palavra. O que fica é um leve sorriso de chegada e ou de partida!

Lucky é recomendado para o público adulto o suficiente para compreender o processo de envelhecimento do ser humano e todas as suas idiossincrasias... Deixe-se surpreender!



*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Crítica: Assassinato no Expresso do Oriente


Assassinato no Expresso do Oriente
por Joba Tridente*

O romance policial Assassinato no Expresso do Oriente, da rainha do suspense Agatha Christie (1890-1976), que traz o meticuloso detetive belga Hercule Poirot numa das suas mais famosas aventuras investigativas, foi lançado em 1934. No ano de 1974, a popular obra da Dama do Império Britânico (1971) e do Crime, ganhou a sua clássica (e definitiva!) versão cinematográfica. O filme Assassinato no Expresso do Oriente, com seu elenco espetacular e estelar, dirigido com elegância pelo mestre Sidney Lumet (1924-2011), a partir do roteiro de Paul Dehn (1912-1976), recebeu seis indicações ao Oscar, que premiou a atriz coadjuvante Ingrid Bergman (1915-1982), e dez no BAFTA, premiando novamente Bergman, o ator coadjuvante John Gielgud (1904-2000) e a trilha de Richard Rodney Bennett (1936-2012). Neste final de novembro de 2017, a obra literária que também ganhou adaptações para a tv e o teatro, chega aos cinemas brasileiros sob a direção de Kenneth Branagh (Henry V, Hamlet, Voltar a Morrer, Thor).


Assassinato no Expresso do Oriente (Murder on the Orient Express, 2017), dirigido e protagonizado por Kenneth Branagh, baseado no roteiro de Michael Green (Lanterna Verde, Logan, Blade Runner 2049), é uma versão atropelada do romance homônimo de Agatha Christie, cujo motivo condutor que envolve o icônico Hercule Poirot (Branagh) teria sido inspirado no dramático rapto e morte do bebê Charles Lindbergh (em 1932), e que, na trama bem urdida pela autora, virou Daisy Armstrong.

O ano é 1934 e (após um prólogo engraçadinho e moralista, típico de Histórias Maravilhosas, onde soluciona um roubo na Igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém, implicando um sacerdote, um rabino e um imã,), Poirot é obrigado a interromper suas férias em Istambul para resolver um caso em Londres. Contando com a providencial ajuda do seu amigo M. Bouc (Tom Bateman), diretor da Compagnie Internationale des Wagons Lits, o investigador consegue um lugar no luxuoso Expresso do Oriente (Istambul-Trieste-Calais), espantosamente lotado para a época do ano. Porém, a viagem é bruscamente interrompida por uma avalanche, o que acaba sendo providencial para o excêntrico Hercule Poirot resolver o misterioso assassinato de um passageiro.


Em meio à nevasca, um morto e doze suspeitos (de classes e nacionalidades diferentes) que não contavam com a presença do célebre investigador a bordo, à espera de socorro, de voz de prisão e de enterro. No jogo de cena, as aparências enganam, mas as identidades não.

Ao contrário de Sidney Lumet, que a partir do excelente roteiro de Paul Dehn (1912-1976), mais fiel ao livro, vai se desvelando cena a cena, juntando e analisando calmamente as peças do intrigante quebra-cabeça hediondo, até completá-lo no desconcertante epílogo, o impaciente Branagh parece não ver a hora de chegar aos “finalmentes”, fazendo do seu Poirot mais um adivinhador vaidoso dos seus “achismos” do que um investigador que usa metodicamente sua massa cinzenta. Apressado, o diretor e ator irlandês praticamente elimina o suspense do enredo e a sua narrativa truncada acaba claudicando para um final morno, não pela conhecida e polêmica conclusão do caso, mas pela discutível (ou risível) cena teatral (de gosto pra lá de duvidoso!) da revelação (Eu te acuso!) ao estilo mesa de Santa Ceia (claro-escuro). Uma metáfora sobre assassinos frios e calculistas, abóbadas e “fim” de túnel (dependendo do ponto de vista) tão estranha quanto ao corte do personagem Doutor Constantine, cuja função de médico (na trama) foi incorporada ao Coronel Arbuthnott (Leslie Odom Jr.), com um denso ajuste de cor de pele..., para desajustar o preconceito racial e confundir o espectador.


O grande elenco coadjuvante de Assassinato no Expresso do Oriente, que conta com Judi Dench, Johnny Depp, Michelle Pfeiffer,  Willem Dafoe, Penélope Cruz, Josh Gad, Lucy Boynton, Tom Bateman, Leslie Odom Jr., Olivia Colman, Derek Jacobi, Manuel Garcia-Rulfo, Sergei Polunin, Daisy Ridley..., é bom, mas não é tão cativante quanto o estelar de Sidney Lumet. Ansioso em contar uma história que prioriza as minúcias, principalmente nos diálogos, Branagh acaba interrompendo as performances (e a voz) de cada ator e ou atriz, fazendo com que suas personagens picotadas soem um tanto superficiais. Nesse quesito, com mais tempo em cena e razoavelmente caracterizado com um belo bigode de quatro pontas, ainda que sem a “cabeça de ovo” de Poirot, quem se sai melhor é o próprio Branagh!


Quando se desliza na neve, tem de estar sujeito aos escorregões e, embora seja um ótimo diretor, desta vez Kenneth Branagh foi ao chão, a sua arte gelou e ficou a desejar. Assim, considerando a conversão da fascinante trama de suspense de Ágatha Christie em trama policialesca chique-ostentação; a bela fotografia (em 65 mm) de Haris Zambarloukos; a cuidadosa direção de arte; os bons efeitos visuais; a trilha musical (argh!) redundante; uma ou outra pitada de humor (quase inglês); a ação totalmente descabida de socos, perseguições, tiros e pontapés..., pela ligeireza da narrativa, Assassinato no Expresso do Oriente deve conquistar apenas uma nova geração de “espectadores” (acostumados aos blockbusters rasteiros) que não têm paciência e nem cérebro para degustar e ou se deixar enredar por uma boa história de suspense. Já para o cinéfilo realmente apaixonado por cinema, não deve passar de um filme que, quadro a quadro, ressalta ainda mais as qualidades da versão de Sidney Lumet. Pode não ser totalmente descartável (para quem não conhece a adaptação de 1974), porém, tampouco é memorável. 

Agora é esperar para ver se o quê nos chegará com a próxima aventura de Hercule Poirot investigando uma Morte no Nilo, se um crocodilo aborrecido ou uma múmia mofada.


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Crítica: Liga da Justiça


LIGA DA JUSTIÇA
por Joba Tridente

Com a telona de cinema formatando cada vez mais as histórias em quadrinhos, parece que finalmente a sombria DC, assim como aconteceu com a sua concorrente Marvel, está encontrando o foco ideal dos seus heroicos e ou vilanescos personagens, cujo enquadramento mais iluminado começou a surpreender com o ótimo traçado da poderosa Mulher Maravilha (2017).

Pode não ser fácil encontrar o tom exato da linguagem quadrinista no cinema (bem menos custoso se testado em gibis)..., mas é possível. Se bem que, assim como na guerra ideológica na rede social FakeBook, quando se trata de filme de super-herói, mesmo o público mais ciente é capaz de travar guerra de comentários e xingamentos (em alguns sites) por conta do estilo taciturno DC (Esquadrão Suicida) e ou do estilo desenvolto Marvel (Guardiões da Galáxia) das histórias projetadas. Eu, hein!!!

Ainda que cada fã de HQ tenha lá a sua preferência “editorial”, já passou da sessão dele aprender (de uma vez por todas!) que, em cinema, uma história anteriormente quadrinizada (ou não) está sujeita à visão capitalista dos produtores, nem sempre familiarizados com o mundo de fantasia encenado, já que pensam tão somente em cifras e não em multiversos. Mudança de personalidade de herói e de vilão, argumentos tosco e roteiros chochos sempre vão “atender” mais ao mercado do que aos fanáticos. O que não quer dizer que produtores, roteiristas e diretores acertem sempre. Em muitos casos é uma calamidade gráfica.


Liga da Justiça, dirigido por Zack Snyder, que recentemente escorregou com Homem de Aço (2013) e foi ao chão com Batman vs Superman: A Origem da Justiça (2016), tem tudo para recolocar (?) o diretor e a DC nos trilhos do sucesso. A trama de ação e aventura, que teria sido finalizada por Joss Whedon, conta a origem da Liga da Justiça em meio ao ataque do trevoso Lobo da Estepe (voz de Ciarán Hinds), um alienígena que chega a Terra, por um orifício no Céu (com tanto vilão invadindo o planeta através de fendas celestiais, haja camada de ozônio!), à procura de três Caixas Maternas para liberar o seu poder devastador (feito uma Caixa de Pandora), instalar o caos e preparar (?) o caminho para o Darkseid, o tirano de Apokolips. O que o chifrudo Lobo, feliz com a morte de Superman (Henri Cavill), não contava é que o Batman (Ben Affleck) seria capaz de reunir quatro (novos) heróis: Mulher-Maravilha (Gal Gadot), Flash (Ezra Miller), Aquaman (Jason Momoa) e Ciborgue (Ray Fisher) e partir para o contra-ataque. Quanto à participação do Superman na defesa da Terra e na fundação da Liga, você vai ter de assistir pra saber como o Homem de Aço volta à vida e reencontra o seu “rival” Batman (com os seus infalíveis planos “B”).


O roteiro infantojuvenil de Chris Terrio e Joss Whedon tem a simplicidade e a eficiência de uma boa história em quadrinhos, equilibrando habilmente o tempo de aventura, de ação e de humor. As piadas (com algo meio nonsense) e as gags são pontuais e totalmente compatíveis com o enredo leve e principalmente com seus personagens díspares. Embora o Flash seja um bom alívio cômico e roube a maioria das cenas, na velocidade de um raio, o humor sarcástico do Batman não deve ser descartado. O Morcegão tem timing e, feito um Buster Keaton (que faz graça da própria desgraça), está impagável com suas tiradas desconjuntadas. As piadas do herói soturno podem até soar clichê e você achar que ele realmente diria o que diz, mas o que conta é o momento, o contexto em que ele solta as suas inesquecíveis pérolas. Ah, fique atento, tem uma cena íntima (!) do herói noturno fazendo algo que você nunca imaginou ver. O Alfred (Jeremy Irons) pode ser um mordomo de mil e uma funções, mas parece que certas coisas, o milionário Bruce Wayne prefere fazer pessoalmente.


Liga da Justiça tem uma narrativa linear totalmente descompromissada e flui que é uma beleza. A história não cansa e muito menos aborrece o espectador, ainda que o vilão (em CGI) não seja lá grande coisa. O enredo desenvolve razoavelmente o encontro dos heróis em torno de uma causa comum (combate ao Lobo da Estepe e resgate das três Caixas Maternas)..., mas fica a dever sobre o passado “confuso” de Flash, Ciborgue e Aquaman. Há pancadaria e violência (sem sangue), mas a destruição urbana, desta vez, está mais restrita à periferia “desabitada” em um país bem longe dos EUA. O elenco é ótimo e rola aquela química essencial para que o grupo de personagens realmente funcione como grupo, ressaltando a personalidade esdrúxula de cada um. Já no quesito romance, enquanto o Superman e a Lois Lane (Amy Adams) têm direito a seus minutinhos “a sós”, é bom saber que o resto da turma não é assexuada e que pode muito bem rolar futuramente um clima mais quente entre a Mulher-Maravilha e o Batman e ou entre a Mulher-Maravilha e o Flash..., por que não?

Enfim, considerando a abertura bem legal e as duas cenas pós-créditos (prefiro a primeira: Flash vs Superman); a notável direção de Zack Snyder (com a colaboração final de Joss Whedon?); e apesar dos efeitos (games) especiais ficarem a desejar..., Liga da Justiça é realmente um novo farol para a DC. Tomara que continue iluminando as próximas produções com mais humor e menos dramas ou tragédia pessoais!

*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.


Crítica: Liga da Justiça, Ação e Aventura, Super-Heróis, Zack Snyder, Joss Whedon, Henri Cavill, Ben Affleck, Gal Gadot, Ezra Miller, Jason Momoa,  Ray Fisher,  Personagens de HQ,

domingo, 12 de novembro de 2017

Crítica: Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha


Victoria e Abdul - O C0nfidente da Rainha
por Joba Tridente*

Histórias palacianas envolvendo monarcas e súditos, quando em boas mãos e sob olhar perspicaz, sempre rendem bons filmes. As maquinações dos bastidores da famosa realeza britânica, com toda pompa e circunstância..., e algum escândalo conveniente (sempre na boca de cena das intrigas), valem ouro.

Em 1997 o diretor inglês John Madden trouxe para a telona o interessante e intenso Mrs Brown, focado na explosiva relação de amizade (próxima ou íntima?) entre a Rainha Victoria (Judi Dench) e o seu arrogante serviçal cavalariço escocês John Brown (Billy Connolly). Um relacionamento (de 1864 a 1883) que, segundo os pesquisadores, teria ido muito além do que se vê no drama (melancólico). Agora, vinte anos depois, é a vez do diretor britânico Stephen Frears  contar, com muita elegância e humor, do convívio afetivo (próximo ou íntimo?) da Rainha Victoria (Judi Dench) com seu devotado servo indiano Abdul Karim (Ali Fazal) na encantadora comédia (quase dramática) Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha. Um relacionamento afetuoso (de 1887 a 1901) que, nos últimos anos, também tem dado pano pra manga. Aliás, se alguém que nunca chupou uma manga (a fruta) lhe perguntasse o gosto, o que você diria? A resposta de Abdul para Victoria é inesquecível!


Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha, deliciosamente roteirizado por Lee Hall, é “baseado em eventos reais..., na maior parte” e também no livro Victoria & Abdul: The True Story of the Queen’s Closest Confidant (2010), da jornalista Shrabani Basu. A comédia (quase dramática) tem a “leveza” muito peculiar do indiscreto humor inglês, que se torna impagável na boca de Mohammed (Adeel Akhtar, ótimo), o indiano simplório que é “escolhido” para acompanhar o escrevente Abdul (Fazal) até a Inglaterra, para entregar uma moeda cerimonial, cunhada na Índia (sob domínio britânico), à Rainha Victória (Dench), em homenagem ao seu Jubileu de Ouro.

A viagem era pra ser um vapt-vupt: chegar, entregar a medalha e voltar. Mas, o devotadíssimo Abdul acaba despertando o interesse entusiástico da Rainha Victoria e é convocado para lhe servir, por tempo indeterminado, como seu “Munshi”, um professor para lhe ensinar tudo sobre os costumes da misteriosa Índia (onde ela jamais esteve). A surpreendente amizade e intimidade dos dois, assim como aconteceu com Brown (o servo favorito anterior da Rainha), também escandaliza o palácio, provocando ciúmes e intrigas entre funcionários, políticos e membros da buliçosa família real.


Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha é daquelas tramas que te envolvem já nos primeiros minutos e não te deixam mais escapar das amarras até os créditos finais. A “doce” ironia dos diálogos de ontem dizem muito das relações internacionais de hoje, sejam elas monárquicas, republicanas, democráticas, muçulmanas..., pois, afinal, como diz Mohammed: “Todos querem alguma coisa!” (do outro para se distinguir do outro). Intolerância, racismo, religião, poesia, sabores e linguagem fazem parte de uma pauta que prima pela independência (e liberdade poética) no desenvolvimento do formidável roteiro e excelência de Frears na direção de uma narrativa muito bem-humorada (às vezes ferina!) e com urdidura digna da mais bela lenda oriental.


Considerando a fotografia e direção de arte impecáveis; a atuação exemplar da adorável Judi Dench (magnífica e generosa) e do expressivo Ali Fazal (com naturalidade e brilho no olhar cativantes); as personagens protagonistas muito bem desenvolvidas (deixando maliciosamente para o espectador decidir o que é real e o que é imaginário na fascinante relação entre a solitária rainha inglesa e seu afetuoso serviçal indiano); o elenco de apoio formidável; o enredo empolgante, com tiradas geniais..., Victoria e Abdul - O Confidente da Rainha, de Stephen Frears, é uma delícia de espetáculo.


Toda via das biografias e fofocas britânicas, porém, quem prefere as velhas verdades sem graça às fabulosas lendas divertidas e sem compromisso, há um bom material especulativo na internet sobre o indiano/muçulmano Abdul Karim e sobre o escocês John Brown. Não é muita coisa, já que a família real inglesa tratou de destruir os diários e a correspondência que os dois trocaram com Victoria. Mas, sabe como é, há sempre um tapete a ser levantado pra se varrer a poeira acumulada!


*Joba Tridente: O primeiro filme vi (no cinema) aos 5 anos de idade. Os primeiros vídeo-documentários fiz em 1990. O primeiro curta (Cortejo), em 35mm, realizei em 2008. Voltei a fazer crítica em 2009. Já fui protagonista e coadjuvante de curtas. Mas nada se compara à "traumatizante" e divertida experiência de cientista-figurante (de última hora) no “centro tecnológico” do norte-americano Power Play (Jogo de Poder, 2003), de Joseph Zito, rodado aqui em Curitiba.

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