terça-feira, 31 de março de 2015

Crítica: O Ano Mais Violento


Questionando apropriadamente um dito do contraditório Jean-Jacques Rousseau (1712 - 1778): o homem empresário (realmente) nasce bom e o mundo capitalista (selvagem) o corrompe? Ou, assim como na política, o ambicioso político só é bom e honesto até descobrir os atalhos para a bica?

O Ano Mais Violento (A Most Violent Year, 2014), escrito e dirigido por JC Chandor, é um tenso recorte de um mês na vida de Abel Morales (Oscar Isaac), um correto proprietário de uma empresa do ramo de óleo de aquecimento, sediada em Nova York. O ano é 1981 e o inverno é rigoroso. Abel quer ampliar o seu negócio, comprando um desativado terminal de combustível ao lado e à beira do East River. Ele, que sempre honrou seus compromissos, acredita que trinta dias são suficientes para pagar a dívida de um milhão e meio de dólares. Porém, assaltos aos o seus caminhões de combustível e uma investigação do promotor Lawrence (David Oyelowo), que vê indícios de evasão fiscal, corrupção e fraude na sua empresa, podem comprometer os seus planos expansionistas. Pressionado pela data limite e pela lei, Abel (empresário acima de qualquer suspeita) precisa mais que nunca da confiança e cumplicidade da sua mulher Anna (Jessica Chastain) e do serviço do seu advogado Andrew Walsh (Albert Brooks), para conseguir se livrar das acusações, quitar a dívida e garantir a sonhada autonomia.


Como muita gente que vê título não vê filme ou vê filme por causa do título, é bom que se diga logo que O Ano Mais Violento é um filme de gângster, mas sem a brutalidade característica. A violência, excetuando duas ou três breves cenas, é mais psicológica que explícita. No caso, o título (retórico), que faz referência (de rodapé) ao ano em que a violência em NYC atingiu o ápice, parece casual (ou oportuno?), já que a história poderia se passar em qualquer época e estação.

O roteiro é simples, sem ser raso. A história de (mais) um self-made man na América de muitos “era uma vez”, não é nenhuma novidade em Hollywood. Mas Chandor tem os seus preciosos trunfos narrativos. Os dessa fabulosa e envolvente crônica de Nova York estão no desenrolar da história no compasso da neve que cai na periferia da Big Apple; na beleza fria da asséptica casa do novo-rico casal Abel e Anna; na construção de personagens convincentes; e, principalmente na notável fotografia de Bradford Young (Amor Fora da Lei, Selma) com sua paleta de tons melancólicos. Por vezes é a sedutora fotografia de Youg, com seus enquadramentos inusitados, a grande protagonista da trama.


O ritmo e a economia de diálogos talvez incomodem o espectador mais afoito. A mim, ainda que transcorram duas longas horas, o ritmo lento (quase parando) hipnotizou, da primeira à última cena, num querendo sem querer que o filme acabasse. A sensação é indescritível. Também fui arrebatado pela essência dos diálogos. Não que os personagens sejam monossilábicos. Mas cada fala é precisa, na negociação e ou na defesa de território e mercadoria. Por vezes, apenas uma palavra (ofensiva ou de ordem) é suficiente para encerrar um assunto.

Enfim, para não dizer que tudo são lindos cristais de gelo, apesar do rigor, a falta de lenha na lareira provoca (no mínimo) uma “escorregadela na neve”, a do caminhoneiro Julian, de Elyes Gabel, personagem “chave” (que não abre porta alguma) na subtrama e excessivamente melodramático, beirando o clichê, no ato final. Seus gestos tresloucados, com certeza, vão suscitar muito “por que?” e nenhum “porque!”. Mas, sinceramente, esse detalhe diminui em nada a excelência do thriller.

domingo, 29 de março de 2015

Crítica: Vício Inerente


Se você não sabe quem é Paul Thomas Anderson e ou Thomas Pynchon e ficou curioso para assistir o Vicio Inerente (Inherent Vice, EUA, 2014), se prepare para mergulhar num mundo absurdo. Ou nem tanto. Em uma temporada de cinebiograficções (ficções inspiradas em biografias), Vício Inerente é uma bem-vinda lufada (ôps!) nas telas de cinema. Mas, saiba que, assim como o fascinante Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância), de Alejandro González Iñárritu, ou o perturbador (“kafkiano”) O Duplo, de Richard Ayoade, baseado no conto homônimo de Dostoievski, o policial neo-noir Vício Inerente tira qualquer um da zona de conforto do ah!, oh!, nossa!..., para o Ahhh! Ohhh! Nosssaaa!

Baseado no livro homônimo de Thomas Pynchon, o policial neo-noir Vício Inerente, dirigido e roteirizado por Paul Thomas Anderson, tem uma pegada de comédia nonsense que arrasta o espectador numa lisérgica viagem ao submundo da intriga policial, digo, da investigação policial, nos psicodélicos anos 1970. Há no ar o prenúncio do fim dos sonhos, da mercantilização da cultura hippie e da nova ordem yuppie. Há no ar desencanto e melancolia e o eco de Woodstock cada vez mais distante. Há na tela uma novela pra lá de maluca!


À margem do establishment, o investigador particular Larry "Doc" Sportello (Joaquin Phoenix), hippie até o talo, recebe a visita da sua bela ex-namorada Shasta (Katerine Waterston), apavorada com um plano funesto arquitetado por Sloan (Serena Scott Thomas), a mulher do seu amante Michael Wolfmann (Eric Roberts). Logo depois Shasta e Wolfmann desaparecem. Tentando descobrir o paradeiro da garota, Doc acaba na mira do paranoico tenente "Bigfoot" Bjornsen (Josh Brolin, roubando cena até do excelente Phoenix), que também é ator de seriado policial..., e de uma escória (doida de pedra ou de pó) que parece ter saído das páginas de alguma HQ retrô. Como se não bastasse, Doc ainda encontra pela frente alguns clientes antigos, reaparecendo do nada, e novos, desaparecendo a todo instante, como o camaleônico Coy Harlingen (Owen Wilson), um ex-comunista a serviço da contrainteligência.

Vício Inerente tem uma trama tão intrincada que nem mesmo os personagens parecem ter um rumo. Vão quicando num lugar e noutro conforme o odor e o sabor do vício que os prende numa grande teia, onde a decisão de qual história e ou alucinação o espectador vai degustar ou aspirar fica por conta da enigmática “aranha” Sortilège (Joanna Newsom), a tecelã das ausências. Ele pode querer dizer muita coisa, tipo visitar o passado estadunidense para compreender o presente americano, e ou simplesmente contar uma divertida e quadrinhesca história de alucinados detetives e seus casos escabrosos. Só isso, nada mais. Não questionei metáforas (se é que há), preferi acompanhar a viagem pastelão para adultos desconectados à procura de uma tomada. Mas, acho que um bocado de gente vai ficar com o plugue na mão.


Vício Inerente é um filme de grandes performances, evidenciadas pelo gráfico enquadramento de história em quadrinho. Mas, sem dúvida, quando Phoenix e Brolin estão em cena, não tem pra ninguém. No entanto, ainda que o emaconhado investigador Doc, de Joaquin Phoenix seja formidável, a personagem de Josh Brolin, na estrutura, é melhor resolvida. O seu depressivo Pé Grande, com corte de cabelo escovinha, é mordaz e violento, mas de uma fragilidade tocante. A sua cena final que o diga. E por falar em cena, numa narrativa tão fragmentada e repleta de bons momentos, é difícil, mas destaco duas sequências espetaculares: a que se passa dentro de um carro, onde Doc (Phoenix), em estado de choque, assiste ao Pé Grande (Brolin) lanchando, não tem preço..., a outra é de humor negro e mostra Coy (Owen) explicando para Doc como conseguiu tocar numa banda sem que os músicos se dessem conta de que ele era um estranho.

Para quem gosta de reminiscência, sim, Vício Inerente lembra Um Perigoso Adeus (The Long Goodbye, 1973), de Robert Altman (1925-2006), baseado na novela homônima de Raymond Chandler (1888-1959), lançada em 1953, não só pelo fato da obra de Altman parecer referência para a obra de Anderson..., mas porque no filme de Altman o roteiro de Leigh Brackett transferiu a ação dos anos 1950 para os alucinados 1970. Então, quando se pinça uma baforada daqui e outra dacolá, naqueles anos loucos... Agora, o quanto Pynchon aspirou de Chandler, pra sua Inherent Vice (2009), você decide!


Enfim, considerando que Vício Inerente tem clima, cor e charme de Graphic Novel; que a reconstituição de época é impecável; que seleção musical é deliciosa, ainda que não inclua Meu Bem, Meu Mal (1981), de Caetano Veloso, que sintetiza o real vício de Doc, que é a paixão por Shasta: Você é meu caminho/ Meu vinho, meu vício/ Desde o início estava você/ Meu bálsamo benigno/ Meu signo, meu guru/ Porto seguro onde eu vou ter/ Meu mar e minha mãe/ Meu medo e meu champanhe/ Visão do espaço sideral/ Onde o que eu sou se afoga/ Meu fumo e minha yoga/ Você é minha droga/ Paixão e carnaval/ Meu zen, meu bem, meu mal;  que a certa altura o espectador fica perdido na poltrona da sala e só lhe resta assistir a um tempo (tão celebrado) se esvaindo na tela, certo de que anos como 1960/1970, quando o comunitário tentava domar o individualismo na ingenuidade (?) da paz e amor e o poder da flor, só serão possíveis no cinema..., a minha dica é que veja despretensiosamente, como se lesse um bom livro. O que houver (?) de subliminar, que o cérebro resgate depois!


NOTA: Download (grátis) da trilha sonora alternativa de Inherent Vice..., na verdade trilha sonora do livro..., montada e disponibilizada desde 04 de outubro de 2014, pelo crítico Philip J Reen, no curioso site Noiseless Chatter. Para entender melhor essa história de trilha sonora literária acesse o site e leia a matéria. Ah, a trilha de Reed é ótima e tão mix quanto a do filme de Anderson.

 Acho que é isso!

quarta-feira, 25 de março de 2015

Animação: Até Que a Sbórnia nos Separe


Estreia nesta quinta, 26 de Março de 2015, aqui em Curitiba, mais uma animação brasileira que, com certeza, vai dar muito que falar: Até Que a Sbórnia nos Separe, uma adaptação do megassucesso espetáculo musical Tangos & Tragédias. Ainda não vi, mas sei que vou gostar. Por enquanto, fique com o release abaixo.

Em 1984, o espetáculo Tangos & Tragédias estreou no Rio Grande do Sul contando a história dos músicos Kraunus Sang e Maestro Plestkaya, personagens naturais de um país chamado Sbórnia. Ao longo do espetáculo, eles revelam que fugiram do tal país após a chegada do rock ‘n’ roll e que se refugiaram no Rio Grande do Sul. Mais de um milhão de pessoas embarcaram nesta viagem e assistiram ao espetáculo musical durante suas quase três décadas de exibição. Agora, chegou a vez deste universo de Kraunus e Plestkaya ser reconstruído no cinema pela animação Até Que a Sbórnianos Separe, dirigida por Otto Guerra e Ennio Torresan Jr.


O filme foi lançado no Rio Grande do Sul, para depois seguir para outras praças. Curitiba recebe o filme a partir de 26 de março, com exibições em 3D no Cineplus Jardim das Américas (Shopping Jardim das Américas) e no Cineplex Batel (Shopping Novo Batel).

O longa-metragem é, para Guerra, uma verdadeira viagem de entrega e identificação pessoal. “Desde que vi Tangos & Tragédias, guardei a história como uma carta na manga. Virou uma referência para mim."


O filme, que marca época no Rio Grande do Sul sendo a primeira produção gaúcha a chegar aos cinemas também em cópias 3D, é resultado de um trabalho meticuloso. Durante sua produção, mais de 100 desenhistas de diferentes pontos do país estiveram envolvidos no projeto, dando vida a cerca de 500 mil desenhos que se materializam ao longo dos 90 minutos do filme. Até Que a Sbórnia nos Separe ainda é um marco para a própria Otto Desenhos Animados, produtora do filme que está há 35 anos no mercado: esta é a primeira animação inteiramente digital da Otto, sem uso de papel.

Quem comanda a animação ao lado do gaúcho Otto Guerra é o carioca vencedor do Emmy, Ennio Torresan Jr., que, há quase duas décadas, atua como animador na Dreamworks, sediada nos Estados Unidos. O co-diretor revela que fazer “Sbórnia” foi uma experiência única na sua carreira: “Quando li o roteiro, foi amor à primeira vista. Não conseguia parar de pensar no projeto. Foi algo compulsivo, mas no bom sentido. Tentei não trazer nada de fora, e sim fazer algo inverso, novo. É um filme diferente de tudo que já fiz. O que existe em comum é a paixão por fazer animação”.



Até Que a Sbórnia nos Separe marca ainda o último trabalho do músico Nico Nicolaiwewsky, falecido em fevereiro de 2014. Ao lado de seu colega Hique Gomez, Nicolaiewsky esteve diretamente envolvido na realização do filme, e deu voz ao protagonista Maestro Plestkaya, personagem que interpretava nos palcos. O elenco de dubladores ainda traz nomes como Fernanda Takai, Arlete Salles e André Abujamra (responsável pela trilha instrumental, que conta ainda com músicas do espetáculo).

NOTA: Enquanto não confere a animação num cinema perto de você, que tal dar uma olhadinha no portal do Até Que a Sbornia nos Separe..., assistir ao trailer e saber um pouco mais do trabalho Otto Desenhos Animados?

EXIBIÇÕES e PRÊMIOS: Prêmio RGE/Fundacine - Lei de Incentivo à Cultura RS. Prêmio Adicional de Renda – ANCINE. Melhor Filme Longa-Metragem – Júri Popular e Melhor Direção de Arte Longa-Metragem - Mostra Competitiva Longas-Metragens Brasileiros - no 41º Festival de Cinema de Gramado (2013). Melhor Filme Ficção Longa-Metragem - Júri Popular – na 37ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo (2013). Selecionado para Waterloo Festival for Animated Cinema (WFAC) – (Waterloo - Canadá) (2013). Selecionado para o 35º Festival Internacional del Nuevo Cine Latinoamericano - (Havana - Cuba). Menção do Jurado Jovem no 17º Festival Internacional de Cine de Punta del Este (2014). Selecionado para o HAFF - Holland Animation Film Festival (2014). Selecionado para o Anifilm 05 - (República Checa - 2014) Selecionado para o Annecy 2014 - Out of competition (Annecy - 2014). Selecionado para o Animamundi - RJ e SP (2014). Selecionado para o Ottawa International Animation Festival – Ottawa (2014). Convidado para o VI Animage – Festival Internacional de Animação de Pernambuco (2014). Selecionado para o 12º FICI - Festival Internacional de Cinema Infantil (2014). Selecionado para o VAF - Viborg Animations Festival - Viborg - Dinamarca (2014). Selecionado para o 12º MUMIA – BH 2014 Selecionado para o 9º Anim´est - Bucareste - Romênia (2014). Selecionado para o 4º Be There! Festival - Corfu – Grécia (2014).

quarta-feira, 18 de março de 2015

Crítica: O Duelo


Lançado em 1961, o romance A Completa Verdade Sobre as Discutidas Aventuras do Comandante Vasco Moscoso de Aragão, Capitão-de-Longo-Curso, ou simplesmente Os Velhos Marinheiros, de Jorge Amado (1912-2001) não tardou a ganhar notoriedade e a ter seus direitos de adaptação cinematográfica vendidos à Warner Bros.  Ainda nos anos 1970, o romance teria sido roteirizado por Frank Pierson (1925-2012), mas jamais filmado. Em 2010, praticamente cinquenta anos após o seu lançamento, o diretor Marcos Jorge assumiu o projeto, assinando também o roteiro de Os Velhos Marinheiros, rebatizado de O Duelo.

O DueloUma história onde a verdade é mero detalhe (Brasil, 2015), gira em torno de dois contadores de histórias. Ou melhor, de um contador de histórias, o Capitão Vasco Mosco de Aragão (Joaquim de Almeida), que relata as suas aventuras amorosas e heroicas, vividas em alto mar e em países distantes, para uma encantada plateia de moradores da pequena Periperi, no litoral baiano, para onde ele se mudou recentemente. O outro é o fofoqueiro ciumento Chico Pacheco (José Wilker), falastrão local que, não suportando o sucesso do recém-chegado e duvidando daquelas histórias de marinheiro, resolve investigar para provar que não passam de lorotas.


Se no livro o enredo de Jorge Amado é promissor, na tela a adaptação de Marcos Jorge deixa a desejar. São as opções de percurso! A cada história de Aragão a malemolência do ritmo claudica aqui e ou acolá, levantando o pó do mofo que logo reassenta. Os causos de Aragão e as revelações de Pacheco até soam curiosos, mas o didatismo é tanto que não tardam a perder o interesse. Nem mesmo os fragmentos “românticos” dão bom engate. Falta safadeza, falta desejo, falta ginga, falta tesão..., sobra carolice! As cenas de sexo e ou de sedução são meramente ilustrativas. A sensação é a de que, por mais que se lance ao mar, o (con)texto na sai da praia dos lugares comuns da obra de Amado e tampouco das limitadas adaptações cinematográficas.

Híbrido de fantasia (?), com uma pitada de drama e sexo, e meia pitada de humor, O Duelo parece feito a toque de caixa. A trama simplória, que se desenrola em três atos (histórias de Aragão; desvelação de Pacheco; prova de Capitão), com diálogos pouco inspirados e velhas metáforas-clichês, subestimam a inteligência do espectador. Excetuado a sequência engraçadinha na embaixada portuguesa, não há espaço nem para um sorriso amarelo. Não fosse a irritante e ensurdecedora trilha sonora, se sobrepondo ao estranho áudio-robótico da voz (seca e áspera) do elenco, principalmente de Almeida e Wilker, seria fácil pegar no sono. Quanto aos efeitos especiais..., acho que os recursos não eram suficientes nem para um bom recorte de máscaras.


Todavia, nem tudo são pérolas de plástico em O Duelo. Há que se destacar a fotografia de José Roberto Eliezer, a arte de Marcos Flaksman e, ainda que remeta ao fascinante O Fundo do Coração (One from the Heart, 1982) de Ford Coppola, as bem resolvidas fusões de cenários e planos. O elenco faz a diferença nas performances de Joaquim de Almeida, Patrícia Pillar e de um José Wilker livre da síndrome de “caras e bocas” de Jack Nicholson, que o caracterizou nos últimos trabalhos.

Acho que é isso. Como a versão (antiquada e marola) de Marcos Jorge não me arrebatou, minha atenção se voltou para os deslizes técnicos. O que não quer dizer que O Duelo não tenha lá seus argumentos ocultos (a mim) para agradar (ou não) aos leitores (ocasionais) de Jorge Amado.


sexta-feira, 13 de março de 2015

MET OPERA: A Dama do Lago

A ópera A Dama do Lago (La Donna Del Lago), de Rossini, baseada no libreto de Walter Scott, com direção de Paul Curran, estará nas telonas da rede UCI Cinemas, neste sábado, 14 de Março de 2015. O espetáculo do Metropolitan Opera House (MET OPERA) será exibido ao vivo e em alta definição, direto de Nova York, a partir das 13h55 (Sul e Sudeste), 12:55 (Nordeste) e 11:55 (Mato Grosso do Sul), nos 16 complexos da UCI e UCI Kinoplex em dez cidades brasileiras. Em Curitiba-PR o público acompanha a transmissão nas salas do UCI Estação e do UCI Palladium.



A Dama do Lago
sinopse publicada no site do The Metropolitan Opera

1.º Ato
Loch Katrine, Stirlingshire, Escócia. Elena, a Dama do Lago, faz sua passeio diário, enquanto pastores cuidam dos seus rebanhos e os homens caçam na floresta. Ela canta seu amor por Malcolm Groeme, mas se depara com King James, que se disfarçou como "Uberto", na esperança de encontrar a beleza lendária Elena. Acreditando que o rei é um caçador que se perdeu no caminho, ela lhe oferece hospitalidade e eles partem para a sua casa, enquanto os homens do Rei procuram o seu líder disfarçado.

King James descobre que o pai de Elena é Duglas d'Angus, seu ex-tutor, que desde então se juntou ao Highland Clan que se opõe ao governo de James. Ele também fica sabendo do noivado de Elena com Rodrigo di Dhu, o chefe da Highland Clan e inimigo do rei, mas seu ciúme é amenizado pela reação morna de Elena para a perspectiva de seu casamento. Malcolm, o pretendente quem Elena ama, chega pouco depois que James vai embora. Escondido, Malcolm ouve Duglas pedir para sua filha se casar com Rodrigo. Quando Duglas a deixa, Malcolm e Elena se encontram e fazem promessas de amor eterno.

Os guerreiros das montanhas se reúnem para saudar o seu líder, Rodrigo, que introduz Elena como sua futura esposa. Malcolm já resolveu se juntar ao clã contra o rei, mas seu vínculo secreto com Elena é percebido por Duglas e Rodrigo quando se encontram. Quando chega a notícia de um ataque pelo exército do Rei e o presságio de uma passagem de meteoros no céu, Rodrigo e seus guerreiros partem para a batalha. A Escócia está em guerra.



2.º Ato
Ainda disfarçado como "Uberto," James procura desesperadamente por Elena, na esperança de protegê-la do derramamento de sangue e mais uma vez declara seu amor, mas ela rejeita seus avanços. Ele, então, dá-lhe um anel, que alega ter ganho do Rei, que garante a sua proteção contra o exército real. Rodrigo, que já ouviu a conversa, convoca seus soldados para matar o estrangeiro, mas Elena intercede. Rodrigo promete duelar com "Uberto".

Enquanto isso, Malcolm, que deixou a batalha na esperança de encontrar Elena, é informado de que ela seguiu seu pai para Stirling Palace, em busca de segurança. Rodrigo é dado como morto e os Higlanders enfrentam a derrota certa. Malcolm declara que vai salvar Elena ou enfrentar sua própria morte. Elena entra no castelo, determinada a salvar a vida de seu pai, Malcolm e Rodrigo. Usando o anel dado a ela por "Uberto", ganha acesso aos aposentos do rei.

Elena fica surpresa ao ver nobres circundantes "Uberto", que logo revela sua verdadeira identidade. Seus sentimentos por ela suavizam sua atitude em relação a seu pai e ele perdoa tanto Duglas e Malcolm. Elena e Malcolm finalmente estão unidos, e todos se alegram como uma nova paz reina na Escócia.

Nota: Para quem quiser saber mais sobre A Dama do Lago e outras óperas famosas, eu sugiro uma visita ao site Resumo da Ópera

Os ingressos para o MET OPERA podem ser adquiridos através do site da UCI (www.ucicnemas.com.br), nos caixas de autoatendimento e nos balcões de atendimento.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Crítica: Para Sempre Alice


No mundo há cerca de 35 milhões de pessoas com o Mal de Alzheimer, a grande maioria é de mulheres. No Brasil o número de pessoas com a doença ultrapassa a um milhão. O assunto desperta interesse pela comoção que causa não apenas a quem é acometido pela doença, mas também aos seus cuidadores, principalmente se familiares, uma vez que o Alzheimer, ainda incurável, vai anulando socialmente o enfermo, a cada dia mais aprisionado em seu mundo de antigas lembranças que, assim como a linguagem e a habilidade física, dissiparão em aproximadamente dez anos.

Para Sempre Alice (Still Alice, 2014), roteirizado e dirigido por Richard Glatzer e Wash Westmoreland, é um drama de ficção baseado no livro homônimo da neurocientista e escritora Lisa Gênova, que expõe a rotina de uma linguista e autora de sucesso, Alice Howland (Julianne Moore), que, aos 50 anos, é precocemente diagnosticada com o Mal de Alzheimer e, feito a Alice de Lewis Carroll, se vê caindo vertiginosamente num buraco escuro sem fim, apegando-se no que lhe resta de memória e de dignidade. A notícia, claro, abala duplamente toda a família, já que Lydia (Kristen Stewart), Anna (Kate Bosworth) e Tom (Hunter Parrish), os três filhos do casal Alice e John Howland (Alec Baldwin), podem ter herdado a doença da mãe.


Para Sempre Alice tem uma narrativa linear e sóbria. A Alice de Juliane Moore é elegante, de uma leveza desesperadamente contida e tocante. Ainda que a dor (e a vergonha!) pela perda das capacidades cognitivas seja enorme, ela procura manter a sua sanidade (e orgulho!) o maior tempo possível (Estou perdendo meus ‘ontens’. (...) Temo com frequência o amanhã). Tarefa difícil, já que a deterioração é iminente (Não há como negociar com esta doença.) e o equilíbrio a cada dia mais fugidio (Quando deixarei de ser eu mesma? Será que a parte do meu cérebro que responde por minha personalidade é vulnerável a esta doença? Ou será que minha identidade é algo que transcende neurônios, proteínas e moléculas de DNA defeituosas? Estarão minha alma e meu espírito imunes à devastação da doença de Alzheimer? Acredito que sim.). Os trechos entre parênteses são da edição brasileira do livro lançado pela Nova Fronteira.


Assunto recorrente em estúdios de todo o mundo, com o Oscar merecido de Juliane Moore, o Alzheimer novamente ganhou vitrine. O tema, intensificado na década de 2000, quando merecedor de um roteiro bem desenvolvido no drama e ou mesmo no humor, sempre acaba trazendo mais luz à complexidade da matéria. Todavia, dependendo da direção (foco/alvo), o objeto no fio da navalha pode “sangrar” num melodrama e ou cine-autoajuda, provocando mais piedade que reflexão sobre a fragilidade humana. O que não me parece ser o caso de Para Sempre Alice, que emociona não apenas pela contundência do drama que aflige uma personagem tão à vontade com a linguagem e que ironicamente é privada dela..., mas também pela veracidade da trama, melhor percebida por quem já teve alguém próximo afetado pelo Mal e que, pela devastação que provoca, faz o doente preferir o câncer, por ser passível de cura.

Entre comoventes e bem escritas sequências, ainda que a fuga do significado de “Léxico” (..., as palavras estão todas aí, mas não consigo alcançá-las) provoque agonia, a que dá um nó é, sem dúvida, a da palestra de Alice na Conferência Anual de Atendimento à Demência, em que cita os versos iniciais do poema Uma Arte, de Elizabeth Bishop (1911-1979): The art of losing isn't hard to master;/ so many things seem filled with the intent/ to be lost that their loss is no disaster., que (em tradução literal) diz algo: A arte de perder não é difícil de dominar;/ tanta coisa parece feita com a intenção de ser perdida/ que perdê-la não é um desastre. O poema integral One Art e a tradução de Horácio da Costa e Paulo Henriques Britto podem ser lidos lá no (link) Falas ao Acaso.


Para Sempre Alice não tem a pungência de Amor (Amour, 2012) de Michael Haneke e ou a inquietação poética de Longe Dela (Away from Her, 2006), de Sarah Poley, mas se aproxima, com louvor, do admirável e melancólico Iris (Iris, 2001), de Richard Eyre, que retrata o sofrimento da filósofa e escritora Iris Murdoch (1919-1999) que, com a progressão do Alzheimer, também perdeu a capacidade de escrever e de se lembrar das palavras. A dupla direção é excelente. O elenco gravita afinado ao redor da bela e talentosa Juliane Moore. A trilha sonora não chega a incomodar totalmente, mas a fotografia me pareceu meio descuidada, principalmente nos enquadramentos.

Nota: Só para registrar, o diretor Richard Glatzer, ainda na fase de pré-produção de Para Sempre Alice, apresentou sintomas Esclerose Literal Amiotrófica (ELA). A doença progrediu rapidamente, incapacitando-o da fala e do movimento das mãos. Durante as filmagens, Glatzer usou um iPad para se comunicar com elenco e equipe, digitando as mensagens com um dedo do pé direito. Para quem não sabe, ELA é a mesma doença degenerativa que acometeu o cientista Stphen Hawking.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Crítica: Mapas para as Estrelas


O tempo passa e Hollywood continua servindo, às plateias afoitas, aquele prato fundo especial, transbordando histórias curiosas e “impensáveis” da sua diversificada comunidade estelar. Feito escaldante feijoada, não faltam ingredientes inusitados e temperos picantes que jamais desandam a receita que nem sempre cai bem no estômago do espectador distraído pelo odor. Como, por exemplo, o catártico Mapas para as Estrelas (Maps to the Stars, 2014) de David Cronenberg.

Em se tratando de Cronenberg, é redundante falar em estranhamento narrativo. Escrito por Bruce Wagner, o drama satírico (ou seria caricatura perversa?) traz uma leitura perturbadora e ousada de velhas questões hollywoodianas do gênero “a vida como ela é (ou imagina-se que seja) em Los Angeles e Beverly Hills”: preço do sucesso; esperança do anônimo; celebridades passadas, presentes e futuras; fantasmas (reais e imaginários); agentes cínicos; inveja do umbigo alheio; vingança (calculada ou improvisada); droga, sexo e imolação etc. Se bem que, quando se fala de show business, o assunto é polêmico em qualquer lugar do mundo e não apenas na “privilegiada” Hollywood.


Na trama, por vezes indigesta, encontramos ao redor da mesa das vaidades, a veterana atriz Havana Segrand (Julianne Moore), disposta a qualquer sacrífico (mesmo!) para voltar aos holofotes com o remake de Stolen Waters, cujo original foi protagonizado por sua mãe Clarice Taggart (Sarah Gadon), que morreu jovem, mas que ainda a assombra, intensificando a sua neurose. Agatha (Mia Wasikowska) é sua dissimulada assistente, uma jovem cicatrizada no corpo e na alma que chega de longe para cumprir à risca um roteiro devastador que vem escrevendo há uma década.  Nessa mesa das ilusões perdidas, os outros espaços são ocupados pelo problemático ator juvenil Benjie Weiss (Evan Bird), que, após a reabilitação, espera reencontrar o sucesso na sua volta à tv, onde já brilhou com a série Bad Babysitter..., e pelos seus pais totalmente disfuncionais: Stafford Weiss (John Cusack), um psicoterapeuta e autor de livros de autoajuda, e Cristina Weiss (Olivia Williams), que administra a carreira do pretensioso garoto. Elenco excelente, incluindo Robert Pattinson, na pele de um motorista de celebridades, Jerome, que também sonha com a fama no cinema e tem a fala mais irônica e oportuna sobre a carreira de ator e roteirista.


A leitura do hipnótico Mapas para as Estrelas varia conforme o interesse do espectador, que pode simplesmente entreter-se com a história de suspense (que também evoca a violência familiar e doméstica) ou mergulhar nas fascinantes metáforas (fogo e água, pais e filhos, fantasmas-vivos e vivos-fantasmas) sugeridas e refletir sobre os percalços da “glamorosa” vida de artista na cidade dos sonhos e pesadelos cinematográficos.

O “mapa” do título vai além de mero instrumento de cicerone, já que serve (muito mais) como veículo de (auto)conhecimento das estrelas e do estrelato. Assim como a citação intermitente do belíssimo poema Liberdade (Liberté), de Paul Élouard, escrito em 1942, que soa como um pedido de socorro que não encontra eco. Leia o poema Liberdade, na íntegra, em tradução de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira no (link) Falas ao Acaso.


O jogo de palavra “(auto)conhecimento” é proposital. Pois, no universo de faz de conta, onde até as biografias são fictícias, assim como a ampulheta sempre retorna a zero-areia, a seu tempo, carrascos e vítimas devoram-se e regurgitam-se (continuamente) na arrogância do “Eu Sou”!. A vida não é filme onde entre o “gravando!” e o “corta!” há um vazio a ser preenchido na ilha de edição. Num enredo em que todos estão continuamente representando um papel (de sedução), um “mapa”, ainda que só faça sentido no segundo ato, vem a calhar. Já no mundo real, o ‘mapa” para se conhecer o melhor ângulo, o melhor diálogo, o melhor figurino..., na iminência de uma tragédia (profissional ou doméstica), o melhor roteiro é o divã do psicanalista.


Enfim, considerando que um cinéfilo, conhecedor da cinematografia de David Cronenberg, sabe o que esperar do esquisito, tenso e amoral Mapas para as Estrelas; que o espectador de primeiro filme, se vencer o blefe do primeiro ato, pode se surpreender e se horrorizar (?!) com os vencedores de um jogo repulsivo; que este é um filme demente, irônico, ardiloso, de humor negro (mas não hilário!), capaz de embrulhar (?) os estômagos mais sensíveis com uma história que fica martelando na sua cabeça por um bom tempo após os créditos finais..., se é fã, arrisque e considere por conta própria.

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