sábado, 26 de setembro de 2015

Crítica: Perdido em Marte


Os títulos em português brasileiro para obras (principalmente) cinematográficas é matéria para as mais diversas teorias (da conspiração?) na internet. Eu mesmo já comentei em outras ocasiões sobre esta ignóbil mania (estraga prazeres) que estupidifica o espectador com seu spoiler e ou por ter nada a ver com o assunto..., como é o caso do Perdido em Marte, versão livre de The Martian (O Marciano), do romance escrito por Andy Weir e que inspirou o sci-fi homônimo de Ridley Scott. Pra começo, meio e fim de conversa, o astronauta Mark Watney, de Matt Damon, não está “Perdido em Marte”, se muito, foi “Deixado em Marte”.  O título original não é mero capricho e ou achismo do autor, está muito bem inserido e justificado, com ironia, na história.


Perdido em Marte (The Martian, 2015) gira ao redor do astronauta e botânico norte-americano Mark Watney (Matt Damon) que, durante uma tempestade de areia, ao ser atingido por detritos e perder a consciência, é dado como morto e deixado em Marte, pela tripulação da Nave Hermes. Ao recobrar a consciência, ferido e a milhões de quilômetros de qualquer outro ser humano, mais que se lamentar, ele decide que vai viver pelo maior tempo possível. Usando sem moderação (e modéstia) o seu conhecimento de botânica e de matemática, no consumo balanceado do alimento disponível no Laboratório Hab, ele calcula que terá uma sobrevida de uns dois anos. E mais, certo de que, mesmo que a Agência Espacial descubra que está vivo, não haverá tempo hábil para um resgate, se põe a gravar um diário, registrando em vídeo o seu progresso (Nem sei quem vai ler isto. Acho que alguém vai acabar encontrando. Talvez daqui a cem anos. Que fique registrado: não morri em Sol 6. O restante da tripulação certamente achou que eu tivesse morrido, e não posso culpá-los. Talvez decretem um dia de luto nacional em minha homenagem e minha página na Wikipédia vá dizer: “Mark Watney foi o único ser humano que morreu em Marte.” E, provavelmente, isso estará correto. Porque, sem dúvida, vou morrer aqui. Só que não em Sol 6, como todo mundo está achando., tradução de Marcelo Lino  para a edição brasileira da Arqueiro)..., até que acaba encontrando uma forma de se comunicar com a Terra, causando surpresa e suspense na NASA.

Assim uma fantástica corrida contra o tempo se inicia. Enquanto em Marte, o botânico faz valer a sua formação acadêmica, usando a ciência (real) para resolver questões relacionadas à sua sobrevivência (produção de água e de alimento), na Terra os cientistas da NASA esmiúçam a física para encontrar uma forma de resgatá-lo com vida.


Dirigido com vigor por Ridley Scott, que há muito devia um entretenimento de excelência ao seu público, Perdido em Marte é uma ficção científica literalmente engenhosa (ou seria literalmente científica?), principalmente por conta de seu simpático protagonista Mark Watney (“Se o oxigenador quebrar, vou sufocar. Se o reaproveitador de água quebrar, vou morrer de sede. Se o Hab se romper, vou explodir. Se nada disso acontecer, vou ficar sem alimento e acabar morrendo de fome. Então, é isso mesmo. Estou ferrado.”), num show arrebatador de Matt Damon.

O roteiro de Drew Goddard é cativante, divertido e plausível na sua “decupagem” nerd, meio que uma longa e bem-humorada palestra sobre os percalços (?) da fascinante exploração espacial que nos aguarda num futuro próximo. Fiel à linha da elogiada pesquisa científica que norteou romance homônimo de Weir, passa ao largo da pretensiosa (e inócua) especulação metafísica de Interestelar (2014) de Christopher Nolan, onde Damon fazia o papel (sem pé nem cabeça) de Mann, um astronauta psicopata “à espera de resgate” num planeta gelado e inóspito (ou seja, do gelo inconsistente para a caldeirinha consciente).


A trama, que acaba se dividindo em três núcleos distintos de ação (Marte, NASA, Nave Hermes), não está interessada na ciência especulativa, mas na ciência prática que (sem pieguice e ou lição de moral) pode resolver questões cruciais para o desenvolvimento e sobrevivência da humanidade (na Terra ou no Céu). Mas, fique tranquilo(a), a gente absorve facilmente as razoáveis explicações científicas e fica até tentado a dar sugestões..., ou estudar com mais afinco a matéria.

O grande trunfo de Perdido em Marte, cujo argumento pode até soar banal (a história de um resgate), está na condução da narrativa que começa como drama leve (?) da persona esperançosa (mas conformada) do engraçado astronauta Mark, vai ganhando corpo e emoção e quando menos se espera, envolve o espectador num suspense inquietante que o deixa antenado até a última cena. É impossível não torcer pelo simpático e solitário botânico, com suas ironias e reflexões (diante de um crucifixo de madeira, por exemplo) a milhas e milhas e milhas do Planeta Azul. Ou ficar indiferente às decisões burocráticas e técnicas dos cientistas da NASA a milhas e milhas e milhas do Planeta Vermelho.


Perdido em Marte é um filme sublime. Inspirador! O seu elenco, de ótima safra (Chiwetel Ejiofor, Jeff Daniels, Jessica Chastain, Donald Glover, Sean Bean, Kristin Wiig, Benedict Wong, Sebastian Stan, Kate Mara, Michael Peña), capitaneado pelo irretocável Matt Damon, dá o seu melhor..., até mesmos os menos coadjuvantes se destacam nas performances. Sequências impressionantes, bons diálogos (ou monólogos comoventes!), efeitos especiais de qualidade, montagem caprichada, trilha “disco music” para os nostálgicos, com direito ao bônus da contagiante glam rock Starman, de David Bowie..., fecham o belo pacote. Imperdível!!!

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Crítica: Hotel Transilvânia 2


Bem, uma vez que o Hotel Transilvânia (2012), com seus proprietários, funcionários e convidados não-humanos, já foi devidamente apresentado no filme anterior, é hora de conferir a rotina virada do avesso após a chegada do simpático mochileiro Jonathan, na véspera da festa de 118 anos de Mavis, a filha única do ciumento Drácula. Lembra? Então, o tempo passou e os jovens Mavis e Jonathan se casaram e tiveram o Dennis, um encantador ruivinho de cabelos encaracolados. Enquanto o menino cresce, sob os cuidados amorosos da mãe, o vovô Drácula, temendo pelo fim da sua vampiresca linhagem, já que, às vésperas de completar cinco anos, a adorável criança não dá sinais de um tradicional  par de presas, resolve colocar em prática um plano maluco, envolvendo seus melhores amigos: a Múmia Murray, o Lobisomem Wayne, o Homem Invisível Griffin, o Frankstein Frank e, de carona, o Geleia...


Hotel Transilvânia 2 (Hotel Transilvanya 2, 2015) aposta mais uma vez na espirituosa direção de Genndy Tartakovsky e no roteiro inteligente de Robert Smigel. Ainda que não tenha o mesmo impacto da história original anterior, é uma animação que chega com muito gás, esbanjando gags, humor absurdo, nonsense e pastelão. As paródias da vez são as novas tecnologias e os adocicados (e politicamente corretos) programas infantis na tv, que deixam o vovô Drácula á beira de uma ataque de nervos. E por falar em programas, a melhor (?) sequência se passa num acampamento para vampiros filhotes..., simplesmente impagável. Você vai rir toda vez que (acampar ou) se lembrar da “criançada” cantando em volta da fogueira. Os velhos monstros, com seus poderes minguados também devem provocar boas risadas, principalmente o estafado Lobisomem Wayne.


Na sua crítica brincalhona às novas tecnologias e seus usuários, Hotel Transilvânia 2 pega gancho para alfinetar a urbanização e as relações sociais entre vizinhos e aparentados de ocasião. Há uma dose de humor agridoce, na ocupação de lugares sagrados e ou revisão de antigos costumes, mas esta só será sentida pelos adultos que tiveram a felicidade de crescer no interior. Bem, se o desenvolvimento provoca melancolia, o jeito é tentar se adaptar e mandar a tristeza pousar noutro lugar.


Enfim, é muito mais divertido assistir ao Hotel Transilvânia 2 do que escrever sobre ele sem correr o risco de contar mais do que deve e acabar com as surpresas que o crescimento de Dennis reserva aos pequenos e aos grandes espectadores. Ah, lembrando que, para aumentar a animação da trama, o desenho convida alguns novos personagens, como o esquivo e hilário Vlad, pai “malvadão” de Drácula, e a família certinha de Jonathan. Pra terminar, fique atento (a), há um trocadilho genial com o nome de uma cidade... Acho que é isso, boa diversão!

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Crítica: Maze Runner - Prova de Fogo


Então..., como em toda franquia, se depois do um vem o dois e o três e, atualmente, até o quarto filme de uma “trilogia” cinematográfica de sucesso literário, após o Maze Runner - Correr ou Morrer (2014), é chegada a hora de mais um teste de fidelidade e agilidade e pernas pra que te quero com Maze Runner - Prova de Fogo, a segunda adaptação da série infantojuvenil homônima escrita por James Dashner.


Maze Runner - Prova de Fogo (Maze Runner: The Scorch Trials, 2015), fantasia de ficção científica dirigida novamente por Wes Ball, começa com a chegada do helicóptero, que alçou voo no final de Correr ou Morrer, levando os jovens fugitivos da Clareira, a uma grande instalação. Todavia, num lugar onde os jovens deveriam se sentir livres e em segurança, Thomas (Dylan O’Brien) estranha a movimentação dos dirigentes e, acreditando numa emboscada armada pela entidade governamental C.R.U.E.L, ansiosa para encontrar a cura de um vírus fatal, convence os seus amigos a buscar ajuda fora dali. Ora, pensa você, para quem já enfrentou o “ardiloso” Labirinto da Clareira e os Verdugos, fugir pelo “Scorch”, uma região desértica, pós-apocalíptica, onde só se vê dunas de areia e ruínas, deve ser moleza. Bem, era isso que o grupo de adolescentes também imaginava, até dar de cara com os Cranks, uns monstrengos zumbis, e com caçadores de recompensa a serviço da Catástrofe e Ruína Universal - Experimento Letal (C.R.U.E.L). É quando (re)começa a correria (e bota correria nisso) praticamente sem fim..., por enquanto.


Uma coisa é certa, não se pode dizer que falta ação corrida e aventura corrida com pitadas de horror (nada gore) corrido e algum drama corrido ao thriller Maze Runner - Prova de Fogo. Ainda que haja algumas cenas esquisitas, aparentemente há menos furos no roteiro de T.S. Nowlin (o mesmo do filme anterior), que traz novos personagens, mas de importância passageira. Wes Ball está mais atento e mais confiante na direção. O elenco (jovem e adulto) continua dedicado aos seus personagens ambíguos. Os efeitos especiais melhoram e há três sequências muito boas e divertidas (labirinto-shopping, labirinto-ruína, e a melhor delas, por conta do surrealismo, labirinto-esgoto).  O que mais? ... 


Enfim, de labirinto (fechado) em labirinto (aberto), a garotada segue fugindo, querendo respostas que só devem encontrar no terceiro e ou quarto episódio..., creio, já que, como disse na resenha do Maze Runner - Correr ou Morrer, apenas dei “uma passada de olhos (leitura dinâmica) no primeiro (livro) e não pretendia repetir com os outros volumes.” Tomara que as respostas venham mesmo, porque, até agora, nada se sabe do confinamento só para meninos da Clareira; jovens desmemoriados; o vírus em constante mutação; a imunidade; adultos sadios; a verdadeira intenção C.R.U.E.L etc.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Crítica: Tudo por Amor ao Cinema


No momento, o mercado cinematográfico brasileiro está inflacionado por documentários. Dizem que a culpa é da demanda das tvs por assinatura, que anseiam por qualquer coisa que se assemelhe a filme. Na excessiva produção, a categoria tem irrelevância para todos os (maus) gostos. Evidentemente que a maioria (felizmente) jamais chegará às salas e muito menos a festivais. Como em toda exceção há a regra da qualidade, entre os que finalmente venceram o bloqueio da má vontade dos exibidores e conseguiram chegar aos cinemas, está o surpreendente Tudo por Amor ao Cinema (2014), de Aurélio Michiles.

Tudo por Amor ao Cinema reconstitui a empolgante trajetória do cinéfilo Cosme Alves Netto (1937-1996) com uma tessitura de encher os olhos e a alma dos apaixonados por cinema (nacional e estrangeiro). Michiles continua despojado em sua arte narrativa. Não há arrogância e ou achismos na homenagem que merecidamente presta a Cosme Neto, o inquieto caçador de relíquias que burlou a censura para preservar Cabra Marcado Para Morrer, de Eduardo Coutinho, e para quem todo filme tem a sua importância documental. Não manipula emoções, porque a história real do incansável pesquisador e gestor da Cinemateca do Museu de Arte Moderna, do Rio de Janeiro, já é por si só um tonel de sensações: a conturbada vida em família abastada; o fascínio e a curiosidade nos tempos dos cineclubes (“O que acontece com os filmes após a exibição nos cinemas?”); o Grupo de Estudos Cinematográficos do Amazonas; as dores e os horrores da ditadura militar, com as prisões em 1964 e 1965; a cinemateca ressurgindo das cinzas; as sessões (escondidas) de cinema; a vida amorosa; festivais, saia justa com Fidel Castro; a paixão ilimitada pelo filme Dançando na Chuva (1952)... Não se obriga ao rigor da linearidade e assim, um assunto se enreda a outro até o foco ser aceso mais adiante..., e depois, num ciclo de histórias admiráveis (coisa de filme!) que envolvem o espectador da primeira à última cena.


Hoje, com o cinema cada vez mais acadêmico (cheio de regras clichês) e consequentemente menos intuitivo (criativo!), é prazeroso tomar ciência do trabalho de Cosme Netto (fundamental para a cinematografia brasileira) através da instigante narrativa de Aurélio Michiles, que costura, com precisão cirúrgica, cenas e sequências de filmes clássicos para traduzir, com elegância e charme (artesanal de moviola), fatos e saudades relatados por cineastas, historiadores e críticos de cinema. Um belo trabalho de pesquisa (que contou com a colaboração de Remier Lion Rocha) e apuro técnico, na edição primorosa de Fernando Coimbra, que exige não apenas conhecimento da cinematografia mundial, mas a sensibilidade do instante da fala, do gesto, da ação de uma trama continuando em outra e sem perder o sentido original. No documentário, ressignificar imagens amplia muito as possibilidades de leitura de uma obra acabada e outra em construção e ou ebulição.


Em Tudo por Amor ao Cinema temos um filme verdadeiramente em três dimensões: o olhar apaixonado de Aurélio Michiles sobre o olhar embevecido de Cosme Alves Netto a olhar o maravilhoso cinema de realizadores brasileiros e estrangeiros. Ou seja, ainda que de arquivo, um cinema em pleno movimento a serviço da memória.

18 anos após o seu excelente O Cineasta da Selva (1997), sobre o pioneiro luso-brasileiro Silvino Santos (1886-1970), o diretor e roteirista Michiles continua demonstrando (às novas gerações de cineastas?) que para se fazer cinema de expressão, antes é preciso aprender a amá-lo na essência, principalmente como espectador. 

sábado, 12 de setembro de 2015

Crítica: Obra


Obra, de Gregório Graziosi, é um filme sem gênero. Parece (mas não é) drama, suspense, cult. Se muito, está próximo de um teste de paciência e sem direito a brinde de binoclinho. Ou de uma experiência que faz a gente pensar que, realmente, fazer cinema não é tão simples como prega a máxima Glauberiana: uma câmera na mão e uma ideia na cabeça. Cinema é bem mais que estética fotográfica e beleza do branco e preto. Requer outras sensibilidades, como um bom argumento e um excelente roteiro, por exemplo. Lembrando que um bom argumento não resulta, necessariamente, um bom filme. Ele é apenas o “prólogo” de um roteiro que pode ser destruído e ou melhorado pelo diretor durante a filmagem.

Obra caminha ou se arrasta ao redor da cidade de São Paulo, vazia no cinza concreto das suas construções emblemáticas ou “sem valor” arquitetônico.  Nesta capital esfriada e entristecida encontramos o arquiteto João Carlos (Irandhir Santos) às voltas com três questões doloridas em diferentes intensidades: hérnia de disco hereditária; cemitério clandestino no terreno herdado da família paterna, onde pretende erguer um ambicioso projeto arquitetônico; nascimento do primeiro herdeiro. Monossilábico (tal e qual os outros personagens..., só São Paulo resmunga o tempo todo), pouco ou nada se sabe das suas intenções (se é que há!) em relação às ossadas no seu quintal e ou à gravidez da esposa arqueóloga (Lola Peploe).


Num panorama onde tudo é muito afetado e o clean invernal sugere mais contenção de despesas que refinamento, os “diálogos” mínimos deixam a narrativa ainda mais inacessível. Não há razão alguma para o espectador se envolver ou demonstrar qualquer apreço pelo taciturno pai do arquiteto (Marku Ribas) e ou pelo estourado mestre de obras (Júlio Andrade), cujo destino é tão (absurdo? surreal? misterioso?) idiota que... Ah, deixa pra lá!

Quanto aos crimes embaixo e em cima da terra e o castigo (?), os roteiristas Graziosi, Paolo Gregori e José Menezes não dão a mínima, não estão nem aí pro abacaxi azedo que plantaram na cova dos neurônios implodidos na cabeça do espectador. Daí, como não se ocuparam desses detalhes (bobos? toscos? inúteis?), quem estiver acordado que imagine o que bem ou mal quiser dos mortos (escravos? pedreiros? guerrilheiros?) e do casamento do arquiteto com uma mulher que só fala em inglês. Está bom pra você ou quer que aumente o buraco da fechadura?


Obra (2014), não é filme para o grande público que lota as sessões de comédias globais. Todavia, já que o vazio (em sua pretensiosa profundidade cool) tem lá seus apreciadores, deve arrebanhar alguns cinéfilos predispostos a encontrar o fio da meada hermética que encarcera tudo em planos fechados e cenários decadentes nesta novela vaga. Agora, se os curiosos vão encontrar ao menos o prumo, ai é outra construção. Enfim, como nem todo sólido mancha o ar, o consolo para a maioria é a bela e premiada fotografia em branco e preto de André Brandão.

Dando asas à indignação, digo, à imaginação: Será que a ideia (de um filme em aberto?) é de franquia e as “respostas” para os trocentos questionamentos virão com Obra 2 e Obra 3? Eu é que não vou ficar carregando tijolos daqui pra lá. É muita coisa ao redor pra se ficar guardando qualquer entulho na memória.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Crítica: Que Horas Ela Volta?


Vi o premiado drama Que Hora Ela Volta?, de Anna Muylaert, na sua estreia. Como me pareceu apenas mediano e ou uma versão paulista do também mediano Casa Grande, de Fellipe Barbosa, a princípio, não me entusiasmei em resenhar. Talvez porque o atual engajamento cinematográfico, realmente não me apetece: elite sempre vil (patrão padrão) versus pobre sempre nobre (empregado padrão). Tudo soa caricato, fora de ordem, partidário, quando se começa a pensar no enredo. Ou melhor, tudo soa caricato, fora de ordem, partidário, quando começa pesar o enredo. Não vejo problema alguma no tema “luta de classe”, desde que isento de maniqueísmo. O que não é o caso.


Que Hora Ela Volta?, com roteiro de Muylaert, apresenta uma trama simplória e previsível. Sabe aquela história de que quando não se cuida da palafita a casa cai com a primeira tempestade, até mesmo em copo d’água? Pois é, o drama, com alguma pitada de humor, fala dos percalços das relações domésticas, do fio aparentemente espesso, mas cada vez mais tênue, com seus remendos maquiados que dificultam o equilíbrio quando a confiança entre patrões e empregados (até então “quase da família”) é colocada em xeque. A nordestina Val (Regina Casé) é uma velha empregada de confiança da casa (grande) de uma família paulista abastada (ou da elite). É tão de confiança que praticamente criou o filho Fabinho (Michel Joelsas), do casal disfuncional Bárbara (Karine Teles) e Carlos (Lourenço Mutarelli, risível). A vida de Val segue rotineira e feliz, até que a sua filha Jéssica (Camila Márdila) chega a São Paulo, para prestar o vestibular, e começa a questionar a submissão da mãe e a bondade dos patrões..., fazendo tremer as palafitas.


Ainda que pouco original, o argumento de Que Hora Ela Volta? é até simpático ao tratar das relações humanas, com o foco nas patroas/mães que trabalham fora e nas empregadas/mães que criam filhos alheios. Todavia, a trama perde o encanto, pra pieguice já na metade do segundo ato, quando começa a fazer água e, pra não perder a audiência, é redirecionado (ou manipulado?) para melhor digestão e compreensão do prato da vez: burguesia (má!) versus proletariado (bom!). Não há meio termo. A narrativa linear, com diálogos clichês e algumas sequências ridículas e nada críveis (de declaração de amor e de afeto) e ou distorcidas, deve satisfazer o ego dos cultuadores da nova onda: criteriologia (ou: Assim é se lhe parece!).

O título é uma referência (genérica) à pergunta que filhos carentes de mães ausentes fazem às suas babás presentes e que, com o tempo, vai perdendo o sentido na vida (deles) e no filme. Econômico nos recortes cenográficos e nos planos, Que Horas Ela Volta? tem elenco esforçado, com destaque para Regina Casé e Camila Márdila. Com boa receptividade no exterior, o drama, provavelmente, também vai encontrar o seu público por aqui.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Crítica: Shaun, o Carneiro


Diretamente do estúdio britânico Aardman Animation, que produz maravilhas tanto em stop motion: A Fuga das Galinhas (Chicken Run, 2000); Wallace & Gromit: A Batalha dos Vegetais (Wallace & Gromit: The Curse of the Were-Rabbit, 2006); Piratas Pirados (The Pirates! In an Adventure with Scientists, 2012), quanto em CGI: Por Água Abaixo (Flushed Away, 2006); Operação Presente (Arthur Christmas, 2011)..., nos chega mais uma pérola: Shaun, O Carneiro (Shaun the Sheep Movie, 2015).


Com roteiro e direção de Mark Burton e Richard Starzak, a comédia animada traz para a tela grande uma longa aventura, com muita ação e humor inglês, nonsense e gags impagáveis, do carneiro Shaun e seus amigos da fazenda na Cidade Grande! Bom, eles não estão exatamente passando férias na cidade, é só um, digamos, contratempo. Isso se deu porque o espirituoso Shaun, cansado da rotina (acordar, comer, tosar, dormir), resolveu bolar um plano para que ele e os outros carneiros tivessem um bom dia de folga (da rotina), ali mesmo na fazenda. O plano era simples: distrair o cão pastor Bitzer e o Fazendeiro e passar o dia assistindo tv. Porém, um incidente acabou levando o Fazendeiro e o Cão para a desconhecida Cidade Grande. Aí, preocupados com o destino dos dois, Shaun e o rebanho saíram em seu encalço e, na cidade, além de procurar pelos amigos perdidos, vão ter que fugir do abominável Trumper, um sujeito nada amigável que prende todo e qualquer animal que encontrar pelas ruas.... Isso é tudo que precisa saber pra se divertir e se surpreender com essa animação inventiva e na medida para toda a família (mesmo!).


Baseado na hilária série homônima, Shaun, o Carneiro não tem legendas e (felizmente) nem precisa de dublagens insuportáveis, pois, excetuando os sons naturais dos animais, não tem diálogos. Com enredo inteligente, personagens cativantes e expressivos, referências à cultura pop britânica e ao cinema, a história deliciosa e muito bem humorada, flui que é uma maravilha. Quando a gente se dá conta..., acabou! Ah, quanto às referências, não se preocupe, são apenas detalhes e pouco importa se as conhece ou não, vai rir do mesmo jeito. Uma dica: nem pense em contar carneirinhos..., porque não vai conseguir! Ou será que vai? Duvido!


Shaun, o Carneiro foi realizado em stop motion, com “massinha”, técnica que consagrou o Estúdio Aardman e dá charme à série de tv, cujo protagonista, Shaun, ganhou notoriedade ao estrelar o premiado (com Oscar) curta-metragem Wallace & Gromit: Tosa Completa (Wallace & Gromit: A Close Shave, 1995).  Na tela grande, além dos velhos conhecidos carneiros: Shaun, os Gêmeos, Timmy, a Mãe do Timmy, Shirley, Nuts e Hazel; do cão Bitzer, do Fazendeiro e dos Porcos delinquentes, são apresentados dois novos personagens: a adorável cadela de rua Slip e o obcecado guarda (vilão) de animais Trumper. Há, ainda, uma meia dúzia de (animais) coadjuvantes que roubam a cena numa prisão e uma celebridade humana (histérica) muito engraçada! É difícil destacar alguma sequência ou gag, já que a próxima é sempre melhor e (você vai ver) o ciclo cômico parece não ter fim! 


Enfim, se você, feito eu, é apaixonado (a) pela série televisiva Shaun, o Carneiro, então, com certeza, vai amar ver o carismático Shaun e seus parceiros de aventuras e ação nesta comédia criativa e lúdica que, mesmo na Cidade Grande, não perde o seu ar bucólico. Se não souber quem é Shaun e ou nunca viu o seriado que passava (?) na TV Cultura, vai se tornar fã após a sessão.

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