sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Crítica: Contágio



Há um grande número de filmes tematizando algum tipo de vírus terrestre e ou alienígena. No vale-tudo do cinema sempre há alguém querendo contar (mais) uma história com alguma variação de humor e ou de terror. Se o agente infeccioso não está transformando cidadãos (de bem e de mal) em zumbis, está matando indiscriminadamente e criando a maior paranoia em uma e ou em outra situação. Aí, o medo acaba fazendo mais estragos que o próprio vírus, quer seja ele de origem animal, laboratorial, militar, alien e até mesmo digital.

Ficção literária ou cinematográfica (científica ou não) à parte, a verdade é que, na vida real, à simples menção de algum vírus, o pandemônio é geral. Em 2011 a bactéria E.coli (Escherichia coli) causou estragos comerciais na “União” Europeia e até mudou hábitos alimentares, em 2009 quem apavorou foi a Gripe Suína e em 2004/2005 a Influenza Aviária foi a gripe da vez. Ah, por falar em literatura, vale lembrar que o médico e escritor Robin Cook é um autor de best sellers (Contágio, Vírus, Febre, Coma) que explora as mais diversas doenças, num clima que mistura ciência medicinal, ética e um bocado de fantasia, para a felicidade dos seus leitores (não necessariamente hipocondríacos) chegados em histórias hospitalares de suspense. Algumas já foram adaptadas para o cinema e televisão.


Contágio (Contagion, EUA, 2011), de Steven Soderbergh, é um filme que, a despeito do tema central (vírus avassalador), se atém à fragilidade do ser humano. Baseado no roteiro de Scott Z. Burns, o drama de suspense não tem exatamente (e ou apenas) uma história. A trama começa com retorno da executiva Beth Emhoff (Gwyneth Paltrow), para Minneapolis, após viagem de negócios a Hong Kong. Dois dias depois ela e seu filho morrem sem que se saiba a causa mortis. Ao mesmo tempo surgem notícias de outras mortes idênticas em Tóquio, Chicago, Londres, Paris e Hong Kong. A classe médica acredita que o responsável por tantos óbitos é um vírus desconhecido e inicia-se, então, uma corrida para encontrar a cura.

Contágio traz um elenco estelar em uma narrativa repleta de personagens protagonistas (cada um aproveitando muito bem seus “15” minutos): Laurence Fishburne é o Dr. Ellis Cheever, o Vice-Diretor do CDC, responsável pela coordenação das pesquisas sobre o vírus; Kate Winslet, no corpo e alma da Dra. Erin Mears, é uma médica que trabalha junto aos infectados; Marion Cotillard, na pele da Dra. Leonora Orantes, é a pesquisadora da OMS que investiga a origem do vírus; Jude Law é o inquieto jornalista blogueiro Alan Krumwiede que, na busca da (sua) verdade e na publicação de matérias alarmantes, cria muita confusão entre os seus seguidores, o governo e a classe científica; Matt Damon é Mitch Emhoff, marido de Beth, a primeira vítima conhecida. O curioso é que nenhum personagem se destaca mais que o outro. Alguns entram e saem (até desaparecem) da trama sem maiores explicações. Assim, como se fosse coisa natural. 



No mundo cinematográfico o inimigo da hora é a China, com ou sem metáfora. O tema, sem dúvida, é sensacionalista e Soderbergh procura evitar os clichês espetaculosos do gênero. Porém, sempre um ou outro acaba deslizando para dentro do enredo, como a abnegação dos dedicados pesquisadores médicos (no Dia de Ação de Graças, Natal, Ano Novo), ou o bom pai que se sacrifica pela filha e ou ainda a desprotegida mulher amada... Nem por isso o filme fica menos frio ou menos intenso em sua narrativa. Excetuando o gentil Mitch e o falastrão Krumwiede, que dão uma certa humanidade à história, os outros personagens, com suas (até instrutivas) falas científicas (Não converse com ninguém. Não toque em ninguém. Fique longe das pessoas. Não toque o rosto. Lave as Mãos.) não causam qualquer empatia. Parecem estar além do próprio umbigo.

Contágio é uma ficção possível e (sendo americana) com um enaltecedor final provável. Em meio ao caos gerado pela pandemia há uma rápida “intriga” sobre quem ganha (indústria farmacêutica) com a desgraça alheia e ou tem o privilégio (americano) de encontrar e usufruir da vacina salvadora, e o dia a dia do cidadão comum que, pela incerteza da informação que recebe, entra em pânico, motivando uma reação em cadeia. Nada de novo, é verdade, a não ser a linguagem que apresenta vários pontos de vista sobre o mesmo assunto (vírus: origem e consequência). Em sua fragmentação há, também, uma história de amor (e apego) à vida e outra de selvageria, quando, na iminência da morte, o homem comum (ou instruído) justifica o seu egoísmo (e egocentrismo) em gestos que podem comprometer a sobrevivência de todos. A edição soderberghiana lhe dá um ritmo especial e só no final o espectador vai entender a contagem dos dias (na tela) e o que ocasionou o vírus. Não deixa de ser (mais) um filme-alerta que, em seu momento de medicina preventiva, (re)ensina ao público as noções básicas de higiene dentro e fora de casa.

Este, evidentemente, não é um programa indicado aos apreciadores das divertidas obras trash do catastrofista Roland Emmerich, mas pode agradar e até surpreender quem sempre se preocupa com um segundo diagnóstico, digo, opinião sobre vírus.



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